BR-364 garante abastecimento de mercadorias; fornecimento de água pelo Depasa está normal
O Rio Juruá, cuja cota de transbordamento é de 13 metros, chegou nesta quarta-feira, 14, a 3,72 metros, a mais baixa profundidade neste ano, mas ainda assim melhor que no ano passado, quando as águas baixaram a 3,60 metros, em agosto. O recorde histórico de baixa do rio aconteceu em 1996 quando chegou a 2,49m.
A última balsa aportou em Cruzeiro do Sul no início do mês de junho. Trazendo cerca de 1.500 toneladas de mercadorias, a balsa só baixou para Manaus em julho e, segundo o gerente do porto, José Cláudio Marques de Oliveira, por ser muito grande e pesada, quase ficou encalhada próximo a Guajará, município vizinho de Cruzeiro do Sul, no Estado do Amazonas.
No mês de julho, duas balsas tentaram chegar até Cruzeiro do Sul e não conseguiram, tendo que permanecer em Ipixuna (AM), situada cerca de um dia rio abaixo. As mercadorias completaram a subida até Cruzeiro do Sul em batelões menores.
Impossibilitados de trazer mercadorias por balsa, os comerciantes locais abastecem seus armazéns via BR-364. Segundo o presidente da Associação Comercial do Alto Juruá, Marcos Venício Alencar de Souza, se a rodovia ficar aberta até dezembro, os comerciantes vão estocar mercadoria que dá para abastecer a cidade até o mês de março, quando então o rio já está enchendo e proporciona a volta do transporte por balsa. Marcos Venício lembra que a cada ano a região depende menos do transporte por balsa, devido ao fato de a BR-364 ficar aberta por períodos sempre maiores.
Ele calcula que, completada a ligação terrestre definitiva entre Rio Branco e Cruzeiro do Sul, o transporte por balsa diminua bastante, embora não vá parar, pois é uma modalidade menos onerosa. Muitos comerciantes de Cruzeiro do Sul agora estão usando a estratégia de estocar mercadorias em Sena Madureira.
Viajar rio acima está difícil
O transporte de passageiros e cargas subindo o rio está prejudicado. Os recreios que levam passageiros para Porto Walter e Marechal Thaumaturgo estão todos ancorados em Cruzeiro do Sul. Somente barcos menores estão subindo. Os catraieiros estão lucrando. Todos os dias tem clientes fretando canoas para subirem até Porto Walter e até mais acima. O catraieiro José Costa da Silva conta que em sua canoa gasta cerca de 8 horas para subir até Porto Walter e cinco horas na descida. Ele cobra pelo frete R$ 350 e pode levar até sete pessoas.
O ribeirinho Belanísio Nascimento França tem dois batelões – um de cinco toneladas e outro de 13 toneladas -, com os quais trabalha transportando passageiros e cargas entre Cruzeiro do Sul e Porto Walter. Durante os meses de cheia do rio ele trabalha com o barco grande. No período de seca, encosta o barco grande e usa o pequeno, mas ainda assim a dificuldade para subir o rio é grande. "A gente tem muita dificuldade; tem muito pau que às vezes arromba o barco, tem banco de areia no meio do rio e a gente tem que descer para empurrar a embarcação", reclama. Segundo França, durante a cheia do rio ele gasta cerca de 15 horas na subida de Cruzeiro do Sul a Porto Walter, o que no período de seca pode levar até três dias.
O agricultor Deusdete da Silva Maciel mora na foz do Valparaíso e conta que a maior dificuldade com a seca do rio é o escoamento do produto. Ele alugou uma canoa para trazer melancias para Cruzeiro do Sul e gastou no percurso cerca de dez horas. "Vim em barco alugado porque os barcos da prefeitura não estão dando conta de transportar a produção", declarou.
Segundo ele, há muita produção agrícola na região onde mora e a dificuldade está em escoar. Os igarapés estão secos e as pessoas que moram às margens não podem escoar principalmente a produção de farinha. A principal reclamação de Deusdete, porém, está relacionada à falta de um local onde colocar a produção em Cruzeiro do Sul, o que faz com que os produtores tenham que entregar os produtos aos atravessadores.
Abastecimento de água está normal
Gelmires Lima, gerente do Departamento de Pavimentação e Saneamento (Depasa) em Cruzeiro do Sul, garante que a seca dos rios e igarapés da região não prejudica o abastecimento de água. Cerca de metade da água fornecida na cidade é proveniente de poços artesianos e a outra metade é captada do igarapé São Salvador, que, apesar da estiagem, mantém um bom nível de água. "Agora, que já apareceram as primeiras chuvas, estamos tranquilos. O igarapé São Salvador está com um bom nível de água", disse.
O ex-seringueiro e hoje ambientalista Antônio de Paula preside a organização não-governamental Associação dos Amigos das Águas do Juruá (Amaj) e conta que conhece o Rio Juruá desde a década de 1950, quando chegou do Nordeste. Ele lembra que os índios chamavam o rio de "rio grande das águas barrentas" e comenta: "O volume de água era um colosso, mesmo no verão. Aqui havia um rebocador de nome Tejo que comportava 100 toneladas e ia até a foz do Rio Bagé, já dentro do Rio Tejo. Hoje, a gente tem que descer para empurrar a canoa. No último verão, o Tejo quase apartou".
Ele analisa que o povoamento das margens do Juruá tenha contribuído para diminuir o volume de água no rio. "Naquela época a gente podia contar as casas que havia na beira do rio, desde Cruzeiro do Sul até o Rio Tejo. Hoje, ao longo de todo o rio, tem aglomerados de casas". Segundo Antônio de Paula, a mudança de atividade econômica da seringa para a agricultura contribuiu para o desmate das matas ciliares, o que provocou erosão e assoreamento do rio, dificultando a navegação nos períodos de seca.