Representação e mídia: dialogando sobre os enunciados de Bakthin e modernidade líquida em Bauman e Chartier

Estudar os enunciados do teórico alemão Mikhail Bakthtin significa mergulhar em textos complexos, numa linguagem rebuscada que nos leva a uma batalha filosófica para decifrar a construção dos pensamentos de um dos maiores teóricos e pesquisadores da linguagem humana.

A palavra, o discurso, a escrita, o comunicar…

O leitor deve estar pensando: e o que tem a ver um texto cujo título remete aos escritos do polonês Zygmunt Bauman e do francês Roger Chartier com os enunciados de Mikhail Bakthtin?

Respondo: tudo!

Adianto, todavia, que as análises expostas a seguir se atêm ao viés científico da comunicação, aos enunciados da linguagem, emissão e recepção da mensagem. Esta é, portanto, a parte I das reflexões propostas acerca dos estudos que ora faço sobre os textos abordados pelos veículos de comunicação locais.

Roland Barthes nos levar a refletir que a ideia de justeza política contém o perigo do moralismo. Essa premissa é necessária para nos levar a questionar a extensão do nosso raciocínio sobre mídia e modernidade. O que há entre o dito e o não dito dos discursos midiáticos.

O que está contido nos sentidos e silêncios das narrativas que os textos jornalísticos transportam para o imaginário social?

O que se encontra nas formas e práticas digitais dos veículos de comunicação enquanto meios de reprodução do cotidiano das comunidades acreanas, gêneros e raças dos povos que habitam a Amazônia Sul-Ocidental?

No século XV, o alemão Johannes Gutenberg revolucionou a leitura e a escrita com a invenção da imprensa, e desde então a humanidade tem discorrido sua história através de registros impressos em papel. A escrita dominou mundos e povos diversos em todos os continentes. Ao mesmo tempo em que cativou, a escrita libertou vidas através da reflexão.

Eis o cerne da questão acerca das abordagens adiante.

A comunicação existe como reprodução de acontecimentos ditos históricos, fatos ocorridos em tempos e em espaços diversos, de sujeitos que carregam em si ideologias que se entrelaçam no hiato do viver, do saber, do fazer e do falar.

Reproduzir, noticiar, informar são atos de registro da história e da memória que narra, antes da própria informação em si, o dialogismo entre a fonte e o narrador (repórter). São esses os enunciados de uma relação significada pela ideologia e o subjetivismo.

Compreender tal entrelace entre fonte e narrador é refletir sobre as notícias midiáticas como representação de fatos que trazem em si a natureza ideológica. Abordar esse assunto significa buscar em si próprio, como agente social, o sentido do dizer e do comunicar.

Nessa lógica, o termo “comunicação”, que nasceu do latim communicationis, communicare, cujo significado é tornar comum, compartilhar, denota a comunicação como uma troca, um processo contínuo de socialização.

Pensar e compreender a origem do termo “comunicação” reflete, a princípio, a simplicidade de um ato. No entanto, concernir a codificação e decodificação da mensagem, no conceito de Hall (2011), entre emissor e receptor é apenas o início de uma análise de discursos que transpõem os tempos modernos das falas virtuais e das vozes da superfície das teias sociais.

Comunicar, então significa imbricar, ligar, o que coloca sobre os ombros do narrador, ao passo em que tal sujeito torna-se o instrumento das vozes daquele que repassa a informação (fonte), a responsabilidade da ética e da estética verbal.

Em Estética da Criação Verbal, Bakthin (1979), afirma que “a essência da língua, de uma forma ou de outra, resume-se à criatividade espiritual do indivíduo”, e posteriormente discorre acerca da construção do discurso: “…Quando construímos nosso discurso, sempre conservamos na mente o todo do nosso enunciado, tanto em forma de um esquema correspondente a um gênero definido como em forma de uma intenção discursiva individual…”.

Objetivo, aqui, apresentar as narrativas jornalísticas contemporâneas como produtos de significação e ressignificação em um processo contínuo do mundo cultural e ideológico acerca das diferentes modalidades de recepção da mensagem da mídia por públicos diversos, rompendo assim com abordagens tradicionais sobre os estudos da comunicação.

Vamos dialogar?

Silvania Pinheiro é jornalista e mestre em Letras: Linguagem e Identidade pela Universidade Federal do Acre (Ufac)