Atuação do poder público para reduzir casos de violência contra mulheres no Acre inclui ônibus lilás, rede de apoio às vítimas e ações coordenadas nos municípios

Nos últimos anos, o governo do Acre tem concentrado ações e medidas para reduzir os casos de violência contra a mulher em todo o estado. Algumas foram a criação da Secretaria da Mulher (Semulher), o fortalecimento das delegacias especializadas nas duas regionais, Cruzeiro do Sul e Rio Branco, incentivo à rede de apoio às mulheres vítimas e a expansão da Patrulha Maria da Penha. O contexto da violência contra a mulher também é debatido, no intuito de elaborar políticas públicas de prevenção e suporte.

Mesmo com tanto apoio, esse tipo de violência ainda é um desafio para o Estado. Só este ano, foram contabilizados cinco feminicídios. Mas, com medidas efetivas, esse número foi reduzido em 29%, se comparados os dados de 2018 e 2023, que constam no Feminicidômetro, uma ferramenta criada pelo Ministério Público do Acre (MPAC). Para além da redução, o objetivo é zerar essa estatística no estado.

As informações contidas nos infográficos foram extraídas das fontes com auxílio do Observatório de Análises Criminais do Núcleo de Apoio Técnico (NAT), órgão auxiliar do MPAC, dos Procedimentos Policiais Eletrônicos do Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública (Sinesp/PPE) e do Sistema de Automação do Judiciário (SAJ) do MPAC e do Tribunal de Justiça do Acre.

Ações itinerantes são levadas aos municípios pelo Ônibus Lilás . Foto: Franklin Lima/Semulher

O crime de feminicídio é tipificado quando há um assassinato de mulher motivado por violência doméstica, ou por menosprezo ou discriminação à condição feminina. Das cinco mortes registradas este ano, duas foram em Feijó, duas em Rio Branco e uma em Tarauacá.

A delegada Juliana de Angelis disse que, somente na capital, em pouco mais de cinco meses, foram instaurados 665 inquéritos policiais na Delegacia da Mulher (Deam). “São crimes de natureza de violência doméstica e contra a dignidade sexual praticados contra mulheres. Além dos crimes contra a vida, consumados e tentados, que também são de atribuição da Deam”, explica.

Os inquéritos policiais possuem prazo legal de conclusão de 30 dias, podendo ser prorrogado a depender da necessidade da investigação e realização de diligências. “Importante dizer que, após a reestruturação física e de pessoal da Deam em abril de 2023, o tempo de conclusão dos inquéritos foi reduzido, sendo que, um ano após a inauguração da Deam, já tinham sido remetidos cerca de 86% dos inquéritos policiais instaurados”, reforça.

Crimes de ameaça, injúria e lesão corporal são os mais registrados na Deam. “Nesses casos, a vítima registra a ocorrência e é atendida no mesmo momento, salientando que a Deam funciona 24 horas”, complementa.

A gestão de Gladson Cameli não só convocou mais efetivo, mas também cuidou do espaço físico dessa delegacia. No ano passado, foi entregue a reforma e ampliação da Deam de Rio Branco – que se tornou um espaço acolhedor e projetado para mulheres nos mínimos detalhes, principalmente quando essas cidadãs estão vulneráveis, caso das vítimas de violência doméstica.

A delegacia é a porta de entrada da mulher na resolução de um processo doloroso, em que ela precisa romper com o ciclo da violência. Nessa jornada, cada detalhe faz diferença. O espaço físico modernizado e planejado para recepcionar adequadamente a abrigada é essencial para que se sinta fortalecida. Uma das referências nesse projeto é a policial civil Ângela Lima, que desenvolve o projeto Ei, Você Consegue, em que ela, após ouvir uma mulher vítima de violência, oferece-lhe um cacto, simbolizando resistência e resiliência. Essa é uma maneira de acolher e encorajar a vítima.

Patrulha Maria da Penha leva conscientização e capacita agentes públicos. Foto: Bruno Gomes

Expansão da Patrulha Maria da Penha

Outro braço forte da Segurança Pública na garantia da defesa dos direitos das mulheres é a Patrulha Maria da Penha, implantada em setembro de 2019. Comandada pela capitã Priscila Siqueira, a equipe trabalha não apenas de forma ostensiva, mas também com ações educativas e de prevenção.

Um balanço mostra que, somente nos primeiros seis meses deste ano, a patrulha enviou 608 medidas protetivas de urgência ao Poder Judiciário; visitou 3.273 mulheres, resultando em 4.193 fiscalizações. Além disso, foram 66 palestras, alcançando 3.536 pessoas; 37 prisões; 34 ações de panfletagem e mais 84 atendimentos gerais.

“Os principais trabalhos da Patrulha Maria da Penha em Rio Branco e no interior incluem acompanhamento periódico às vítimas que estão sob medidas protetivas, fornecimento de informações sobre direitos e serviços disponíveis para as vítimas, realização de palestras e eventos para conscientização da população sobre a violência de gênero, colaboração com outras entidades governamentais e não governamentais para fortalecer a rede de apoio às vítimas e fiscalização do cumprimento das medidas protetivas de urgência determinadas pela Justiça”, explica a capitã.

Tendo Feijó como uma das cidades que mais registram feminicídio, a Patrulha Maria da Penha tem trabalhado na capacitação e treinamento de agentes locais para assegurar que todos estejam preparados para lidar com casos de violência doméstica de forma eficaz e sensível. Ações itinerantes, fortalecimento de parcerias com organizações locais e outras ações são desenvolvidas na região.

“A concentração de campanhas em Rio Branco e Cruzeiro do Sul se deve, em parte, à maior densidade populacional e à presença de infraestrutura mais robusta nesses municípios. No entanto, reconhecemos a necessidade de ampliar ainda mais a cobertura das campanhas para outras áreas do estado. Estamos trabalhando para desenvolver estratégias que permitam uma distribuição mais equitativa dos recursos e das ações de combate à violência doméstica em todo o Acre”, informa.

Para a redução do número de casos, a orientação é que, a qualquer sinal de violência, familiares e amigos reportem as ocorrências às autoridades competentes, como a polícia e o Ministério Público.

“Também é importante oferecer apoio emocional e prático à vítima, como abrigar temporariamente ou ajudar no acesso a serviços de apoio; orientar a vítima sobre os recursos disponíveis e incentivá-la a buscar proteção legal e estar atenta a sinais de violência, agindo rapidamente em situações de perigo iminente”, orienta a coordenadora da patrulha.

Imagem: divulgação

Secretaria fortalece a mulher

A Semulher foi criada em 16 de fevereiro de 2023, por meio da Lei nº 4.085/2023, com o objetivo de formular políticas de promoção da igualdade de gênero e dos direitos das mulheres, políticas para a eliminação de todas as formas de discriminação contra as mulheres, políticas de assistência e proteção social às mulheres e políticas educativas direcionadas à promoção da equidade e dos direitos da mulher.

Atualmente, a pasta:

– Fortalece os organismos municipais de políticas para as mulheres (OPMs) das prefeituras;

– Realiza um trabalho itinerante por meio dos atendimentos da unidade de acolhimento à mulher Ônibus Lilás e da equipe multidisciplinar nas comunidades rurais, indígenas, ribeirinhas e municípios de pequeno porte;

– Prioriza a profissionalização das mulheres, por meio da realização de cursos de capacitação e da difusão de informações sobre os direitos das mulheres no mercado de trabalho;

– Trabalha ações temáticas de visibilidade das mulheres negras, indígenas e LGBT+ e

– Fortalece as organizações da sociedade civil (OSCs) que trabalham pela garantia dos direitos das mulheres.

Um balanço da secretaria mostra que foram 523 atividades de prevenção no enfrentamento à violência contra as mulheres. Um dos principais projetos desenvolvidos pela secretaria é a unidade de acolhimento à mulher, o Ônibus Lilás, que já chegou a 14 municípios e 32 localidades, incluindo bairros periféricos, aldeias indígenas, projetos de assentamento, vilas, florestas estaduais e eventos do governo e da sociedade civil. Foram 784 mulheres atendidas e as ações chegaram a um público de 27.548 pessoas.

Na profissionalização feminina, a atuação da Semulher certificou, em parceria com o Senac, 415 mulheres em situação de violência em 11 municípios, com 15 cursos profissionalizantes.

Os planos para este ano são a ampliação de diversos serviços para dar segurança à mulher, como destaca a  secretária Márdhia El-Shawwa. O objetivo, segundo ela, é reduzir cada vez mais a violência de gênero no estado.

“O governo do Acre segue trabalhando na garantia dos direitos das meninas e mulheres do estado e, além disso, é fundamental que tenhamos OPMs implementadas em todo o Acre, pois dessa forma nos aproximamos das mulheres e trabalhamos de acordo com a realidade local de cada município. Assim, seguiremos reduzindo os índices de violência e mostraremos às mulheres que elas podem e devem sim denunciar todo e qualquer tipo de violência doméstica sofrido. Vamos, cada vez mais, massificar a divulgação dos canais de denúncias, para elas buscarem ajuda em casos necessários. Estamos fortalecendo cada vez mais as nossas redes de atendimento. Seguimos juntas, por todas elas”, destaca.

Delegada Juliana de Angelis enumera avanços em especializadas para atender mulheres no estado. Foto: José Caminha/Secom

Rede de apoio

Ao retirar a mulher do contexto da violência, é preciso dar-lhe suporte, já que muitas precisam recomeçar. Para isso, o governo do Acre mantém abrigos que acolhem essas mulheres com atendimento profissional e suporte para que possam recalcular sua rota de vida e trabalhar o desprendimento da dependência emocional e financeira que, em alguns casos, são os motivos que mobilizam essas cidadãs a seguir em um ciclo vulnerável.

Ter traçados números e perfis, tanto das vítimas como dos agressores, é crucial para estabelecer medidas efetivas. É isso que o Feminicidômetro do MPAC disponibiliza.

O painel mostra que o estado teve 72 vítimas de feminicídio de 2018 até abril deste ano. A maioria dessas vítimas foi no interior do estado e, em relação a esse crimes, há 54 sentenças, 34 condenações e 29 processos em andamento. O perfil socioeconômico de mulheres mortas revela faixa etária entre 20 a 34 anos, sendo 82%de classe baixa e 72% com filhos, ocasionando 121 órfãos. Os autores, em sua maioria, são companheiros, ex-companheiros, namorados e maridos.

No lançamento da ferramenta, a procuradora de Justiça Patrícia Rêgo mencionou que conhecer as variáveis é importante para o planejamento, implementação e inovação de políticas públicas de empoderamento feminino, para reforçar a proteção dessas mulheres e combater a violência.

“Precisamos alertar, mais uma vez, para a importância desses dados colhidos e analisados. Estamos desde 2018 com uma taxa de feminicídio muito acima da média do Brasil. Durante um tempo tínhamos a maior taxa de feminicídio do país, em 2022 esse número recuou e no ano passado houve um aumento. Precisamos urgentemente melhorar nossa caminhada. Lutamos por igualdade, liberdade e justiça desde o século 19, estamos entrando na terceira década do século 21, praticamente, e as mulheres continuam morrendo por serem mulheres”, frisou a procuradora.

Atualmente, o Estado tem dois abrigos que atendem essas vítimas. Os locais e os nomes não são divulgados, por motivo de segurança.

Emily Dias, coordenadora dos Serviços de Acolhimento para Mulheres da Secretaria de Assistência Social e Direitos Humanos (SEASDH), explica que o acolhimento se dá de forma ininterrupta, 24 horas, e a entrada da mulher na Casa Abrigo somente é efetivada mediante a apresentação do encaminhamento da Rede de Atendimento com relatório psicossocial, excetuadas as delegacias, que devem enviar o boletim de ocorrência e demais procedimentos. “O abrigo também realiza parcerias com a rede de apoio como Caps [Centro de Atenção Psicossocial] e unidades do Centro de Referência de Assistência Social [Cras] após análise técnica e necessidade de cada caso”, explica.

Atualmente cada abrigo acolhe cerca de 15 mulheres e 30 crianças mensalmente, tanto em Rio Branco quanto em Cruzeiro do Sul. Os estabelecimentos são de permanência rotativa, mas há casos em que a mulher passa até um ano institucionalizada.

Ações tentam reduzir casos de violência contra mulher no Acre. Foto: Acervo/Secom

“É de suma importância hoje, no Estado, termos as unidades de acolhimento para mulheres vítimas de violência, pois, em parceria com a rede socioassistencial, podemos proporcionar segurança, acesso a tratamentos clínicos, psicológicos e jurídicos, entre outros. Temos projeto de expandir o quadro de profissionais nos abrigos, com pedagogas para acompanhar os filhos no âmbito do abrigo enquanto estão institucionalizados, fazer melhorias na estrutura dos abrigos, como a instalação de playground para as crianças no abrigo de Rio Branco”, planeja a coordenadora.

Onde denunciar casos de violência contra a mulher?

– Central de Atendimento à Mulher – 180

– Qualquer delegacia

– Centro de Operações Policiais Militares (Copom) – 190

– Centro de Atendimento à Vítima – CAV/MPAC – (68) 99993-4701.

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