Gênese: conheça a evolução do mercado verde

Por José Luiz Gondim dos Santos*

De certo que os problemas ambientais decorrem do modo de vida, produção e consumo desordenado adotados pela sociedade que, agora, esbarra em mercados exigentes de uma nova forma de consumo socioambientalmente correta para evitar a evolução do aquecimento global e os decorrentes riscos à vida humana e do planeta.

O marco inicial das discussões desse cenário originou-se dos encontros do Clube de Roma.  Fundado, em 1968, pelo industrial Aurelio Peccei e o cientista escocês Alexander King, o clube reunia pessoas ilustres para debater um vasto conjunto de assuntos relacionados à política, economia internacional, meio ambiente e desenvolvimento sustentável.

A partir desses debates, uma equipe do MIT, chefiada por Dana Meadows, elaborou o relatório Os Limites do Crescimento, o qual passou a ser conhecido como relatório do Clube de Roma ou Relatório de Meadows. O documento tratava de problemas cruciais para o futuro desenvolvimento da humanidade, tais como: energia, poluição, saneamento, saúde, ambiente, tecnologia e crescimento populacional, devidamente apresentado e disseminado a partir da Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento e Meio Ambiente Humano (CNUDMAH), realizada em 1972, em Estocolmo, com a participação de 113 países.  A iniciativa foi um marco histórico por ser tratar do primeiro grande encontro internacional com representantes de diversas nações para discutir os problemas ambientais.

As vozes de Roma (1968) e de Estocolmo (1972) estabeleceram as preocupações, as variáveis e o mínimo direcionamento para a busca por um modo de vida, produção e consumo mais resilientes aos efeitos nocivos do desenvolvimento ao meio ambiente e à humanidade.

Importante destacarmos que entre 1970 e 1990 foram registrados alguns fatos históricos como crises energéticas (1973 e 1979), desregulação do sistema monetário internacional e desastres ambientais que reforçaram a responsabilidade das potências mundiais em pensar, criar, implementar e executar planos, programas e projetos com princípios, conceitos, diretrizes, instrumentos de execução e monitoramento para um novo modelo de desenvolvimento, assim como impulsionaram a criação de órgãos e novos programas das Nações Unidas para meio ambiente, desenvolvimento e outros.

Em 1983, a Organização das Nações Unidas (ONU) criou a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD), presidida por Gro Harlem Brundtland, com os objetivos de reexaminar as questões críticas relativas ao meio ambiente e reformular propostas realísticas para abordá-las e propor novas formas de cooperação internacional nesse campo, de modo a orientar as políticas e ações no sentido de fazer as mudanças necessárias.

A partir da CMMAD, foi elaborado o relatório de Brundtland, publicado com o título de Nosso Futuro Comum (1987) com a proposta de integrar a questão ambiental no desenvolvimento econômico e sugerindo uma nova forma de progredir.

Cientistas como Ignacy Sachs, na sua ampla visão de ecossocioeconomista, contribuíram na análise de desenvolvimento sustentável considerando as variáveis, dando diretrizes para países e respectivos governos quanto à adoção de medidas: satisfação das necessidades básicas; a solidariedade com as futuras gerações; a participação da população envolvida;  a preservação dos recursos naturais e do meio ambiente em geral; elaboração de um sistema social garantindo emprego, segurança social e respeito a outras culturas e  programas de educação.

Assim foram sendo construídas as bases para esse novo modelo de desenvolvimento ambientalmente sustentável como um conceito apresentado e aceito na Conferência das Nações Unidas para Desenvolvimento e o Meio Ambiente Humano (2ª CNUDMAH), informalmente conhecida como Cúpula da Terra, que resultou no tratado da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (CQNUMC), também conhecida como UNFCCC (do original em inglês United Nations Framework Convention on Climate Change), ou Convenção Quadro das Nações Unidas para as Alterações Climáticas (CQNUAC, em Portugal), realizada no Rio de Janeiro no ano de 1992.

A Conferência Eco-92, Rio-92 ou Cúpula da Terra contou com desdobramentos importantes dos pontos de vista científico, diplomático, político e na área ambiental, além de ceder espaço a debates e contribuições para o modelo de desenvolvimento ambientalmente sustentável como discussões acumuladas da Convenção de Viena para a Proteção da Camada de Ozônio (1985), o Protocolo de Montreal para Proteção da Camada de Ozônio (1987), criação do Painel Intergovernamental sobre a Mudança do Clima (1988), em inglês: Intergovernmental Panel on Climate Change – IPCC, e a apresentação do 1° Relatório de Avaliação do IPCC, elaborado por comitê composto de centenas de cientistas do mundo inteiro, escolhidos pelos governos com a missão de avaliar periodicamente o estado da arte do conhecimento científico sobre as mudanças do clima, cujos relatório servem para decisões políticas e governamentais sobre clima.

Os marcos internacionais mais importantes da gênese e desenvolvimento do mercado verde são o Protocolo de Kyoto (1997, ratificado em 2005) e Acordo de Paris (2015).  Esses dois tratados sedimentam um cenário internacional de criação e desenvolvimento de um mercado qualificado pela possibilidade de adaptação de cadeias produtivas e com potencial de agregação de valor por meio de geração, mensuração e quantificação de ativos ambientais, especialmente do crédito de carbono equivalente, cuja métrica se dá em toneladas (tCO2eq).

O tCO2eq é fruto da não emissão de CO2 na atmosfera por ação realizada pelo homem, especialmente com adaptação de cadeias produtivas e de serviços nos eixos de floresta, transporte, energia, indústria e solo.  A definição de tCO2eq, por ser um ativo financeiro representativo de direito sobre bem intangível e incorpóreo transacionável, considerando uma interpretação integrativa da Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012 (Código Florestal), e o Decreto Federal nº 11.075, de 19 de maio de 2022.   Essa definição não exaure o conceito e pode ter outras variáveis decorrentes do Código Civil e outras regulações que vêm pelo futuro a respeito no mercado financeiro.

A geração de ativos ambientais, especialmente o do tCO2eq, impulsionam o mercado verde, com créditos negociados em mercado em valores que variam entre U$17 a U$28 dólares, segundo dados obtidos pela Opis, a Dow Jones Company e Global Carbon Offsets Report.

Linha do tempo do mercado verde

Como se pode observar pela linha do tempo do mercado verde, considerando as diretrizes da UNFCCC e decisões das COPs, os países e governos evoluem em suas decisões internas de adaptação dos mercados de uma forma mais resiliente ambientalmente e inclusiva socialmente priorizando a agregação de valor a serviços ambientais e produtos ambientalmente sustentáveis.

Exemplos de boas decisões e boas práticas adaptativas vêm da adoção de programas de Redução de Desmatamento e Degradação e Comunidades (REDD+), nos estados do Acre, Mato Grosso, Amapá, Maranhão, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins, que viabilizam e financiam o desenvolvimento sustentável por meio de políticas públicas estruturadas para integração das pautas de desenvolvimentos, conservação ambiental e promoção de bem-estar social que foram sendo criadas e implementadas simultaneamente à regulação internacional acerca do tema.

Apesar dos avanços, o último relatório do IPCC aponta que o sistema climático sofre mudanças cada vez mais acentuadas de aquecimento global, o que exigem metas ambiciosas quanto à redução de emissões. Destaca-se que as emissões, até agora, já tornaram irreversíveis e temos algumas consequências, como: degelo, aumento do nível do mar e mudanças nos oceanos.

A perspectiva de futuro para o mercado verde está vinculada a elevação dos ativos ambientais como commodities e ativo financeiro sui generis dentro de uma janela de oportunidade para financiamento de políticas públicas sustentáveis, pelo período vindouro de 30 anos, que prezem pela redução da utilização de combustíveis fósseis, redução de desmatamento, degradação e adoção de medidas de restauração, exigindo dos países a modificação do modo de produzir e consumir mais sustentável.

Assim, a nova forma de condução de vida, produção, consumo e dos mercados nasce da necessidade imediata de manter a vida humana e a sustentabilidade do planeta e do grande esforço de países e governos na tomada de decisões e criação de instrumentos de geração de ativos ambientais como um novo valor – essencial – para adaptação de sociedade, das empresas e do sistema financeiro, numa visão de corresponsabilidade e associação de lucro ao bem-estar social, com fins a uma efetiva sociedade equitativa e em pleno desenvolvimento.

José Luiz Gondim dos Santos, advogado, gestor de Políticas Públicas, mestre em Ciências e especialista em Economia Contemporânea, com experiência em projetos de políticas públicas e programas de integridade e Environmental, Social and Governance (ESG).