Mês passado perdi o carregador do meu celular. Foi num fim de semana, e só poderia pegar de volta o assessório na segunda-feira. Quer dizer, não quis voltar ao local em que o havia deixado no mesmo dia, procrastinei a ação de propósito. Há muito tinha a vontade de ficar off das redes sociais e internet, e após assistir um vídeo recente do Youtuber Whindersson Nunes, me deu o “gatilho”. O humorista relatou, de forma leve e assertiva, os males que o celular pode causar em nossas vidas e relações. Optei por não renovar a carga do aparelho.
Logo no primeiro dia, notei dois fatores muito importantes: senti que o dia rendia mais e tive sono muito antes do horário em que normalmente durmo. Isso ocorreu naturalmente, tanto que só percebi essas mudanças no dia seguinte. Eu não apenas havia dormido magnificamente bem, como fiz várias atividades que antes “não tinha tempo” para executá-las. O processo foi o mesmo durante todo o fim de semana, fazendo com que eu me sentisse ótimo, mesmo sem ter feito nada de especial ou diferente, fora o fato de não estar mais conectado ao telefone móvel.
Na segunda-feira recuperei o carregador, fiz a carga no celular, liguei o aparelho e… O velho ciclo se repetiu. Centenas – quiçá milhares – de mensagens, notificações e notícias de todos os cantos estavam disponíveis novamente para mim com apenas um toque. À noite, já estava “viciado” de novo, talvez até mais do que antes, por ter ficado três dias fora do ar. Depois de um tempo, pude refletir sobre esse pequeno experimento social que havia acabado de fazer comigo mesmo.
“Não, não é possível viver sem internet”, pensei. E não é mesmo, pelo menos no mundo moderno e capitalista em que vivemos. Desde bancos, trabalho, relação com amigos, comprar passagens aéreas, entretenimento, esportes etc: tudo possui, em algum grau, o laço intransponível da rede mundial de computadores, o www ou seja lá qual o nome que se dê à matriz da internet. Abdicar de tudo isso 24h/7d por semana representa um total isolamento da vida, da produtividade. Mas ficar refém da tecnologia é maléfico para nossa saúde, nos causa ansiedade, afastamento de situações como um saudável jantar em família sem olhar o celular, ou jogar futebol com os amigos – ao invés de dedilhar o aparelho à tarde inteira. Ao mesmo tempo que a internet une pessoas distantes geograficamente, nos afasta de quem está ao nosso lado, perto demais para um contato físico.
Então o correto seria o meio termo, dosando o uso da rede, que tentei aplicar na prática. No trabalho, por exemplo, independente da função de cada um, não podemos ficar off, ao menos no “zap-zap” e e-mail, pela facilidade de contato e funcionalidade. Dessa forma, optei por abolir o “detox” no horário comercial. O foco da mudança seria nos momentos livres (dias de semana à noite e sábado e domingo em período integral).
Não concluí o processo de maneira radical, mas acredito que diminuí em pelo menos 50% o uso do celular, ainda considerando meu consumo semanal do Spotify, que subtrai boa parte da minha internet pré-paga. Apenas nele passo de 1 a 2 horas por dia, mas é justificável, pois o utilizo para fazer atividades reais, como treinar na academia, dirigir e passear com o cachorro, ouvindo meus podcasts e músicas preferidos. Ou seja, o app é um complemento, e não o personagem principal dessas ações, o que faz toda a diferença.
Antes do detox, essa era a minha rotina: horário comercial (8h às 18h) de 10 horas no total, 7 horas de sono em média e 5 horas conectado por dia, totalizando 22 horas, sobrando apenas 2h para realizar necessidades fisiológicas, como tomar banho e escovar os dentes, e outros fins nos dias de semana. Nada de outro mundo, muitos fazem igual ou pior, mas ao constatar isso veio-me na memória aquele meme do cara com o celular com tentáculos grudados na cara, como se o aparelho estivesse sugando suas energias. Assustador.
Meu sono melhorou quando não usei internet pela parte da noite, e sei o motivo. Quando conectados, temos a impressão do mundo estar à nossa disposição, com informações ilimitadas e conexões infinitas com conhecidos e estranhos. O problema é a ansiedade que isso nos causa, sem ao menos percebermos ou admitirmos isso.
Abrimos várias conversas paralelas no “zap”, respondemos um e-mail da firma, pesquisamos passagens aéreas, nos matriculamos num curso acadêmico e entramos no Google para saber o significado de uma palavra ao mesmo tempo, num intervalo de cinco minutos! Perceba o quanto nosso cérebro é bombardeado quando ficamos horas e horas subindo e baixando nosso polegar na tela, analisando o feed ou stories da nossa rede social favorita, como Instagram, Whatsapp, Facebook e Twitter.
Para melhor compreensão, vou analisar cada um desses app’s de forma individual:
Instagram: Grande parte do que é postado é composto de realidades alternativas, onde os usuários expõem quase sempre o melhor de si mesmos, ou mentem de forma descarada sobre quem realmente são. Os pontos negativos de ficar refém deste app é acreditar, de fato, que o apresentado ali corresponde à realidade. Tudo o que queremos e almejamos, nossos sonhos e desejos mais profundos, estão inseridos em forma de fotos e vídeos nessa rede social. Somos bombardeados em segundos com corpos perfeitos, viagens fantásticas, empregos sensacionais e famílias perfeitas a todo instante. São situações que nunca iremos conquistar ou superar, não importa o que fizermos, pois sempre terão milhares ou milhões de pessoas aparentemente muito melhores que a gente. Se não estivermos em boa situação emocional, os efeitos desta exposição visual podem nos trazer, inconscientemente, de uma leve tristeza até, em casos mais graves, a depressão.
Whatsapp: Após as evoluções tecnológicas, é a ferramenta mais completa e de fácil manuseio inventada pelo homem. Com este app conectado à internet, conseguimos fazer ligações, mandar fotos, vídeos, áudios, textos e etc. Com bilhões de downloads no mundo todo, ele é uma ótima ferramenta para comunicação, mas ficar a todo instante vendo as notificações pode nos tornar dependentes e ansiosos. Sempre vai ter alguém ou algum grupo do “zap” abrindo conversa, então o ideal seria silenciar as notificações, artifício que utilizo há vários anos com sucesso – recomendo!
Facebook: Não é mais a rede social do momento, perdeu o apelo e muitos perfis estão desatualizados por falta de interesse de vários usuários. Mas ainda tem seu charme e público. O nível de viciamento é baixo em relação aos concorrentes mais próximos.
Twitter: A rede social do passarinho azul nos deixa informados sobre tudo o que acontece no Brasil e no mundo, mas de maneira fragmentada, em poucos caracteres. Tem informação a rodo, mas sem muito aprofundamento. Ou seja: o usuário fica sabendo um pouco de tudo, e um tudo de nada. Tenho uma teoria pessoal que isso acaba emburrecendo os usuários frequentes, pois o cérebro acaba se acostumando a ler várias informações diferentes por minuto, afastando o usuário de leituras de textos maiores e complexos. No meu caso, quando fico muito tempo conectado ao Twitter, acabo lendo menos livros. Outro fator são as problematizações políticas. Não importa sua opinião, sempre terão várias outras pessoas, donas de verdades absolutas (como você), dispostas a destruir todos seus argumentos, às vezes de forma agressiva ou pessoal, gerando um estresse desnecessário que leva a lugar nenhum.
Detox no Carnaval
Você já parou, como eu, para refletir qual a finalidade de desperdiçar preciosas horas diárias no celular? Perdemos tempo nas plataformas virtuais com assuntos ou temas de pouco valor para nossas vidas. Quase nada disso servirá para algo positivo a pequeno, médio ou longo prazo, servindo mais para nos entreter momentaneamente.
Pensando nisso, proponho o desafio: neste Carnaval, independente de onde você estiver, fique esses dias sem internet. É difícil, mas o detox digital poderá lhe conferir o poder que você tem de dominar a tecnologia – e não ser dominado por ela. Para tornar o detox acessível para um maior número de pessoas, ele fica restrito às redes sociais. Diferente dos app’s de música, relacionamento, notícias, filmes e jogos, que nos estimulam a algo, nas redes sociais ficamos vidrados num verdadeiro “chorume virtual” que vicia por ser prazeroso, nos dando sensações e estímulos rápidos.
Para os que ficarão em casa, longe das viagens nacionais e internacionais, tampouco vão pular nos bloquinhos da vida, será uma experiência ótima, garanto. Perceba o quanto seu dia poderá ser mais produtivo, dando tempo para resolver pendências antigas, como brincar com seu filho, arrumar a estante do escritório, ler um bom livro, namorar, passear no parque… Muitas vezes, o uso da internet nos faz perdermos esses momentos, sem que saibamos de fato disso. Você só saberá quando abandonar esse hábito por um período.
Caso você vá para o Rio, Salvador ou fique pelos bloquinhos espalhados por todo estado, é ainda mais recomendável não levar o celular, por questões de segurança. Não se preocupe, sempre terá alguém para tirar as fotos nos locais da folia, eles lhe mandam os registros depois. Para se comunicar, basta fazer uma ligação convencional pelo celular. Você vai perder parte dos seus créditos, mas será por uma boa causa!
Este artigo é estritamente opinativo, não possuindo qualquer embasamento externo, apenas percepções pessoais, comprovadas na prática. Mandem o resultado do seu Detox Digital para maurotavernardjr@gmail.com, relatando os benefícios e as atividades realizadas no feriado prolongado.
Boa sorte e bom Carnaval! Mauro Tavernard é Jornalista na Secretaria de Estado de Indústria, Ciência e Tecnologia.
https://www.youtube.com/watch?v=1ewDSaZgoJE