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Como é estudar no Ensino integral: A Escola da Escolha na visão dos estudantes

O visitante não precisa nem entrar na Escola Glória Perez para perceber que ela é um espaço com a cara da juventude. Do lado de fora, os muros coloridos exibem grafites que exaltam as artes e elementos da cultura brasileira. Do lado de dentro, para todo o lugar que se olhe, tem jovens, uns lendo, outros ouvindo músicas, grupinhos em rodas de conversas e outros nos clubes de danças e afins. Parece até escola de filme americano, mas é um modelo brasileiro.

A instituição é uma das dez escolas acreanas onde funcionam o ensino em tempo integral, no qual os estudantes passam cerca de nove horas. “Chegamos aqui por volta das sete horas, porque até sete e meia é o horário limite para todo mundo estar dentro da sala”, conta a estudante Gabrielli Sobralino.

No primeiro horário, eles estudam disciplinas obrigatórias que fazem parte da grade curricular de toda a rede estadual, como português, matemática e física. “E dependendo da classe tem dias de Estudo Orientado: que é uma das formas que os professores ensinam a gente a aprender a estudar”, explica Gabrielli.

E nos intervalos, especialmente depois do almoço, tem os clubes, que são grupos criados e geridos pelos próprios alunos em áreas de seus interesses, como música, teatro, literatura e dança. São agremiações que ajudam a despertar o protagonismo juvenil. “A escola integral dá autonomia aos jovens, eles são os criadores de praticamente tudo, comandam praticamente a escola” conta Gabrielli. Na Glória Perez, tem clubes de forró, de vôlei e até um clube gospel.

Projeto de Vida: Trabalhando com sonhos

Passado o horário do almoço, os estudantes voltam para as salas e participam de aulas interdisciplinares como ‘Projeto de Vida’, ‘Estudo Orientado’ e disciplinas eletivas, que são diferenciais do modelo de escola em tempo integral ou Escola Jovem, como é conhecida.

Aliás, o Projeto de Vida é considerado a “espinha dorsal” do modelo da Escola Jovem, porque tem como foco principal trabalhar com os sonhos dos alunos, e por mexer com as emoções se tornou a grande paixão dos estudantes. Nas palavras de Gabrielli “uma coisa inovadora, que ajuda você se descobrir na vida. O que você quer ser, se realmente você quer ser alguma coisa só por dinheiro ou por prazer”.

Ela complementa ainda: “Tem gente que os pais não conversam, não perguntam o que eles querem ser da vida, não falam disso dentro de casa, e aqui vem uma pessoa especializada pra ensinar a gente o quê que é isso, nos ensina a lidar com a sociedade”, explica a estudante.

Para Gabrielli as aulas já estão fazendo a diferença, ela ainda está no primeiro ano do ensino médio, mas já tem aspirações grandiosas para o futuro pós-médio, quer começar pela carreira jurídica e posteriormente entrar para a política até chegar ao posto mais alto, a presidência do Brasil.

Mas antes de tudo isso ela declara: “todas as vezes que a minha professora pergunta o que eu quero ser, eu respondo: só feliz, eu quero ser só feliz, independentemente da área que eu trabalhe! Posso um dia parar pra pensar e concluir que eu não quero ser juíza, eu não quero ser presidente, eu não quero ser nada, posso ser professora ou qualquer outra coisa, mas eu quero ser só feliz”.

“A escola integral dá autonomia aos jovens, eles são os criadores de praticamente tudo, comandam praticamente a escola” conta a estudante Gabrielli Sobralino (Foto – ASCOM SEE)

Para Larissa Dias, professora do “Projeto de Vida”, é para formar cidadãos como Gabrielli que o modelo existe. “O maior diferencial do ensino integral é o projeto de vida. Por isso que ela é a Escola da Escolha, porque nessa escola eles escolhem o que eles querem ser com base no projeto de vida deles, com base nos sonhos deles”.

É o caso da estudante Rebeca Silva, que encontrou nas aulas do Projeto de Vida um direcionamento. “Eu vim me reconhecer mais no Projeto de Vida. Ele me ajudou bastante no decorrer do tempo, pra saber o que eu vou querer ser, pra quê que eu estou aqui, o motivo e tal”, conta.

Indagada sobre como é passar o dia inteiro na escola, Rebeca responde com muita espontaneidade: “Ah, é ótimo! Porque se eu tivesse em casa eu estaria sem fazer nada da vida. E aqui eu passo o dia estudando, fazendo coisas que gosto e, às vezes, quando eu não quero estudar a professora vai lá e fala – [Rebeca tu tem que estudar pra ser alguém na vida!]- ai eu vou lá e estudo”, conta, sorridente.

Por enquanto ela está mais propensa também a seguir a área do Direito e acredita que as disciplinas eletivas também a ajudaram na tomada de decisão. As eletivas são as disciplinas, que como o próprio nome diz, são escolhidas pelo aluno com base no sonho, e na prática funcionam como extensão do Projeto de Vida, no qual além de estudar os conteúdos da Base Nacional Comum Curricular são incrementados assuntos relacionados à carreira que o aluno quer seguir.

“Por exemplo, tem muitos alunos que querem fazer medicina, mas depois das aulas de primeiros socorros eles percebem que não se identificaram, que não é isso o que eles querem fazer, então isso já interfere no projeto de vida deles”, explica a professora, ressaltando que esse é o maior desafio da escola, trabalhar com os sonhos e os anseios dos estudantes sem deixá-los frustrados ou despreparados para a vida.

Para Larissa Dias, professora do Projeto de Vida, é para formar cidadãos como Gabrielli que o modelo existe (Foto: Ascom/SEE)

Os primeiros resultados

Uma preocupação que segundo a professora Larissa, move e norteia os educadores acreanos, que se preocupam com o ensino dos quase 5 mil estudantes que estão formando e entregando para a sociedade.

“Essa é uma questão muito latente pra gente, mas já conseguimos perceber que os estudantes que entraram aqui ano passado, já não são mais os mesmos. São alunos que já sabem trabalhar na coletividade, que se mobilizam através do protagonismo, que é um dos princípios dessa escola, eles já sabem lidar com os conflitos e tomam a frente das situações”, destaca.

E são estes jovens proativos e colaborativos que segundo a educadora, a sociedade pode esperar que saiam do ensino integral no Acre: “Daqui dois, três anos, a sociedade vai receber um aluno que saiba não só português, matemática e geografia, mas um aluno autônomo, que sabe tomar decisões, que sabe o que quer para a vida dele, e acima de tudo, um aluno solidário, porque a sociedade está cheia de profissionais, mas que não tem o espírito de solidariedade”, destaca.