Carlo Petrini, fundador do Slow Food: “alimentar-se é um ato político”

Petrini palestrou nesta quarta-feira, 24, na Filmoteca da Biblioteca Pública em Rio Branco (Foto: Val Fernandes/Secom)

O jornalista Carlo Petrini, fundador do movimento internacional Slow Food, apresentou em sua palestra nesta quarta, 24, na Biblioteca Pública, uma narrativa contextualizando o alimentar-se como um ato político e de que a gastronomia vai além dos sabores.

O encontro foi aberto pela vice-governadora Nazaré Araújo e a primeira-dama Marlúcia Cândida, coordenadora do Programa de Gastronomia de Baixo Carbono desenvolvido pelo governo do Estado.

Marlúcia Cândida falou da honra em receber Petrini. O convite para o jornalista vir ao Acre foi feito pela primeira-dama no Congresso Mesa Tendências, em São Paulo, em outubro de 2017.

“Quero dizer que já somos slow food, quem está na palestra é porque não quer fast food, e sim descobrir o que a floresta tem. Temos aqui um grande amigo do Papa Francisco, do meio ambiente e do Acre. Que a nossa escola de gastronomia seja referência para todos os produtos da floresta, e que o slow food tenha na escola um espaço para a pesquisa e lançamento dos produtos corretos, e a gente possa mostrar ao mundo que vale à pena preservar a floresta e manter muitas cadeias produtivas”, disse.

O encontro foi aberto pela vice-governadora Nazaré Araújo e a primeira-dama Marlúcia Cândida (Foto: Val Fernandes/Secom)

A governadora em exercício Nazareth Araújo destacou que o Acre, por meio de seus programas de desenvolvimento sustentável, está trabalhando de encontro ao movimento do Slow Food, promovendo ações que incentivem a população a se alimentar de forma mais saudável.

Segundo ela, esse trabalho se tornou conhecido e valorizado por Carlos Petrin. “Todas as políticas públicas de governo se casam com a valoração do produto na hora do consumo. Isso faz parte de um programa econômico, ambiental e principalmente de uma visão do indivíduo na busca por uma vida mais integrada e saudável”, disse.

Com público de produtores rurais, pesquisadores, convidados e estudantes, o evento teve a participação de Valentina Bianco, coordenadora de novos projetos do Slow Food Internacional na América do Sul, com foco principal no Brasil e Carlos Demeterco, coordenador do movimento na região Norte.

Movimento Slow Food

Carlo Petrini, iniciou sua fala lembrando a morte de Chico Mendes. “Quando morreu Chico Mendes, na Itália todos os italianos democráticos sofreram. Seu exemplo e paixão são pilares para a humanidade inteira. Para mim estar aqui nesse estado é uma felicidade intensa”.

Sobre o movimento Slow Food, o jornalista contextualizou como um movimento que surgiu a partir de uma tese de que o sistema alimentar global é criminal. “Esse sistema merece uma reflexão profunda e verdadeira, porque o desastre que realiza no mundo pode comprometer o futuro de nossos filhos, do planeta e da humanidade”.

Petrini citou pontos sobre a realidade desse sistema criminal. “Muita gente pensa que essa destruição vem do sistema de transporte, não, ele influi 17%, e o alimentar 34%. Isso significa que é o responsável e, ao mesmo tempo, vítima do desastre ambiental”.

Outro fator citado pelo jornalista foi de que a partir de 1900 a humanidade perdeu 70% da biodiversidade. “Isso aconteceu porque esse sistema alimentar e economia sustentam uma maior produção e não uma diversidade. Quando o Slow Food compreendeu essa realidade foi um momento histórico de que a biodiversidade precisa ser defendida. Estou encantado de estar aqui e ver que existe uma forte preocupação em preservar a floresta”.

Outro aspecto causado por esse sistema alimentar diz respeito à água. “Ela será a principal causa de guerra. 80% de água se consome com a agricultura que desperdiça, que não dá valor a água. É um problema imenso. E falam: tudo bem, produzimos, produzimos, não falta água’. E quando faltar? Será um desastre para a humanidade inteira”.

Um olhar para a pequena produção

Segundo Petrini, o slow food propõe trabalhar com um sistema de pequena produção (Foto: Val Fernandes/Secom)

Para Petrini é necessário compreender que nos últimos 50 anos a humanidade contribuiu com a perda de valor da comida. “A comida hoje tem apenas o preço, existe a diferença entre valor e preço. O valor significa o trabalho dos camponeses, meio ambiente, comunidades, história e identidade e preço é preço. Quando conhecemos um produto não perguntamos o valor, mas o preço. Isso resulta numa humilhação aos camponeses porque a referência é a indústria”, disse.

O jornalista defendeu que produtos artesanais, produzidos em pequena escala, geram menos impacto ambiental e social do que os industrializados. “Escolher o que se come, conhecer a origem dos alimentos e a forma como chegaram à mesa é também uma forma de incentivar pequenos produtores e fomentar a economia e a tradição de uma região”, completou.

Gastronomia com visão holística

Carlo Petrini falou que a comunicação é responsável por produzir o maior paradoxo sobre a comida. “Nas TVs, receitas, caçarolas, chefs três estrelas, tudo fala de comida e a situação no campo é um desastre. Todo mundo pensa esse espetáculo é a verdadeira gastronomia, não é, é uma pornografia alimentar. Precisamos compreender que é uma ciência holística, multidisciplinar. Não se pode reduzir só às caçarolas”.

Propôs a ideia de defender uma economia local com um olhar para as comunidades. “Podemos construir valores com a comunidade. Fortalecer essa economia local é um orgulho com construção de hortas em escolas, é uma verdadeira revolução, mercado direto de camponeses. Olhar local com alma global. Eu sou italiano, mas tenho alma e fraternidade com esse lugar e país maravilhoso. Tenho alma próxima com os camponeses do Acre”.

Ao finalizar, Petrini falou de sua esperança em que a escola de gastronomia seja um espaço com uma visão holística local. “Uma escola que tenha raízes e sua própria identidade, eduque os jovens a respeitar a produção local. E me encanta essa ideia de florestania”, concluiu.

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