Observador do tempo

Tic tac, tic tac…soa o passar do tempo na marcação dos segundos no relógio. Dois anciãos movem as peças, um observa pacientemente a jogada do outro que move o cavalo no tabuleiro de xadrez.

Uma jovem aguarda, inquieta e ansiosa, para a festa de debutante, o tão sonhado momento dos 15 anos. A pressa, entretanto, a faz perder os detalhes e sabores de uma espera, e no futuro pensará que poderia ter sido, naquele momento, mais paciente e vivido mais, aproveitado mais.

Observar o tempo não é se conformar ou permanecer imóvel diante dos fatos, é praticar o princípio da temperança, o domínio de si e o controle dos desejos, ou das peças do tabuleiro, com o olhar atento de um jogador.

Certamente, em algum momento conflituoso de nossa vida, já ouvimos o velho clichê “deixa o tempo passar”, ou, “o tempo cura tudo”. E não é verdade? Epicteto diz que se o problema possui solução não devemos nos preocupar com ele. E se não possui solução, de nada adianta nos preocuparmos, ou seja, aquilo que eu não posso mudar externamente, eu mudo dentro de mim.

Epicteto é um filósofo grego estoico. Para ele, uma vida feliz é o resultado de boas ações, atitudes corretas e virtude. De maneira resumida é o famoso ‘praticar o bem e ser correto’ – com outros e consigo. Os estoicos tinham a ética como a baliza de sua filosofia.

Mas como ser virtuoso e ter o controle dos nossos desejos numa sociedade que explora exatamente essas fragilidades humanas? Simples: observamos o tempo. Tudo passa, e hoje, tudo passa numa velocidade que nem conseguimos acompanhar. E por isso é muito fácil, se atentos às armadilhas, a não sermos dominados pelos instintos.

Se hoje nos acontece algo, ou, se hoje queremos alguma coisa, amanhã esse desejo já não nos dominará mais. E o tempo? Passou por nós e nem nos demos conta do fato. As vontades tornaram-se passageiras e o tempo passou a nos observar, ao invés do contrário. Ou dominamos as peças do tabuleiro, ou seremos obrigados a entregar a rainha, não é assim?

Um ancião sabe muito bem como fazer isso. De olhos atentos a cada movimento, a cada peça, ele estuda os quadros, traça estratégias, e tudo isso, sem pressa. Porém, o outro observador também faz as mesmas coisas, com uma paciência invejável. O jogo pode virar para um dos lados, entretanto, eles sabem que ambos estão sujeitos a perder ou entregar a rainha.

Só que a sabedoria dos anos e o passar do tempo os fez praticar o que Epicteto pregou: o que não posso mudar, eu aceito e sigo normalmente, pois o que faz diferença é a reação diante do ocorrido. Se viro a mesa, perco a razão; se cumprimento o colega de jogo, eu venço, como um sábio que aprendeu mais uma lição.

Taís Nascimento é jornalista da Secretaria de Estado de Saúde 

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