“Escrita é a manutenção do conhecimento do povo”, afirma indígena doutor em linguística, Joaquim Mana

O governador Tião Viana garantiu a publicação dos livros (Foto: Gleilson Miranda/Secom)

Com a proposta de consolidar sua língua materna, o ex-seringueiro e agora doutor em linguística Joaquim Mana Kaxinawa elaborou, junto de parceiros, livros didáticos para seu povo, os Huni Kui. Nesta quarta-feira, 6, ele apresentou a proposta de seis livros ao governador Tião Viana, que prontamente garantiu a publicação e distribuição nas escolas das terras do povo Huni Kui.

“Isso é uma revolução”, disse o governador ao folhear os textos escritos na língua original Huni Kui, o hãtxa kui. Com uma população de cerca de 14 mil pessoas, os Huni Kui ocupam terras ao longo dos rios Tarauacá, Jordão, Breu, Muru, Envira, Humaitá e Purus.

Segundo Joaquim, mais de 100 professores das comunidades já passaram pela formação para realizarem o ensino nas duas línguas, o português e o hãtxa kui. Ele explica que com isso, o seu povo poderá manter sua tradição cultural, que é passada de forma oral desde os tempos imemoriais. “A escrita surge para fixar todo o conhecimento da convivência de um povo”, diz o especialista.

“A língua hãtxa kui tem que ser como qualquer uma outra. Temos que pegar todo nosso conhecimento, colocar na introdução da escrita e em seguida passar para ser ensinada nas escolas em nossas terras”, complementa. Mana diz que começou a perceber a importância da escrita para a cultura de seu povo durante as aulas de história, em sua formação acadêmica, que mostravam fatos muito antigos.

Nos meses de novembro e dezembro de 2016, na Terra Indígena Praia do Carapanã, em Tarauacá, foi realizado uma das etapas do Curso de Hãtxa Kui, organizado por Mana. A iniciativa, realizada em outras aldeias, debateu e planejou a política pedagógica da educação escolar. Além disso, contribuiu para a revisão e criação dos materiais didáticos que serão publicados com apoio do governo do Estado.

Em um dos livros, explica Mana, apresenta textos colhidos entre os professores e anciãos relatando histórias de seus antepassados. “Esse aqui tem uma história que mostra como conseguimos a noite”, diz. “Os antigos começaram a se perguntar: ‘por que não tem noite? tem noite para a alguém’. Então foram atrás e encontraram quatro: uma de 24h, outra de seis meses, uma de 4h e outra de 12h. E então eles escolheram a última opção”, relata Joaquim.

Ele explica que isso é um exemplo de como a histórias poderão agora se manter e estar registrado para futuras gerações e não se percam como muitos outros contos e mitos, relatos que marcam a identidade cultural de seu povo.

Mana conquistou seu doutorado em 2011, na Universidade de Brasília (UnB), se tornando o primeiro indígena a receber o título de doutor em linguística pela instituição. Ele começou a formação no ensino ocidental aos 20 anos, quando deixou o corte da seringa em sua terra natal, no Jordão.

Em breve, por iniciativa de Tião Viana, o professor doutor Mana começará um curso de língua hãtxa kui no Centro de Estudo de Línguas do Acre (CEL). Em seguida, o governador quer reconhecer o hãtxa kui como uma das línguas oficiais do Acre.

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