Há muito se sabe sobre a crise de fome e sede que o planeta vive desde os anos 40, até então o que era um problema de má distribuição de alimentos e água, hoje se tornou um fator bem mais preocupante, a escassez. Segundo o último relatório da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e do Programa Alimentar Mundial (PAM) a escassez de comida e água já é uma realidade em grande parte do mundo, principalmente, em países do continente africano como: Burkina Faso, Nigéria, Sudão do Sul e Iêmen. Este ultimo, de acordo dom esse mesmo relatório, já vive uma realidade de conflitos armados por disputa de água e comida.
A Organização das Nações Unidas (ONU), também alertou sobre países que sofrem um alto risco de viverem situação semelhante, sendo eles: Venezuela, Afeganistão, Síria, Líbano, Sudão, Etiópia, Somália, Moçambique, Serra Leoa, Mali, Camarões, República Centro-Africana, Congo e Zimbábue. Segundo o relatório, esses países já viviam os riscos de segurança alimentar, agravando-se tal situação com o Covid-19.
Se engana quem pensa que tal problema só atinge os países em desenvolvimento do globo. Nos últimos meses de 2020, observamos países como China, Rússia, Itália, Emirados Árabes Unidos e, até mesmo, Israel disputarem uma corrida por compra de todo tipo alimentos e água em diversas partes do mundo, afim de garantir a manutenção mínima da alimentação da sua população, a regulação de seus estoques de grãos, a oferta de proteína animal para consumo interno e ração animal a base de proteína (soja, milho e trigo).
A quantidade de alimentos que países do G7 vem comprando para estoque, a desdolarização que vem ocorrendo pelas potências mundiais e a volta da corrida pela compra de ouro físico por vários países são forte indícios que essa problemática já é uma realidade. Tais mudanças nos mostra que há um preparo das potências mundiais para uma possível guerra pela sobrevivência. Os últimos relatórios das agências governamentais e da ONU prevê que a fome extrema no mundo é algo cada vez mais real e iminente. Segundo o relatório do Fórum Econômico Mundial, estima-se que cerca de 300 milhões de pessoas a mais possam sofrer com a escassez de alimentos e água até 2030.
Com o aumento da população mundial, a quantidade de terras férteis cada vez menor no mundo, a baixa oferta e o monopólio de sementes em algumas áreas, a escassez de água e a proibição do uso de alguns defensivos agrícolas, o Brasil tem-se colocado como maior e melhor país do mundo para fornecer água e alimentos.
Só a China já comprou mais de 24 US$ bilhões (R$ 126 bilhões) em alimentos brasileiros no primeiro semestre de 2020. Entre os mais comprados estão: soja, milho, arroz, proteína animal, suco de laranja congelado e água.
Há mais 20 países que tem alta demanda de alimentos brasileiros, países desenvolvidos como: China, Estados Unidos e Rússia, e também países em desenvolvimento como: Vietnã, Turquia e Venezuela. Todas essas demandas nas exportações, tem movimentado positivamente a nossa economia , mas em contrapartida, temos enfrentado altas nos preço de alguns alimentos, e até a falta em alguns lugares do país.
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O Estado ainda possui um grande número de terras disponíveis, e abundância em água, principalmente em seu subsolo; com grande valor estratégico nacional, principalmente pela sua proximidade com o Peru e a rota do Pacifico. Inaugurada em 2006, através dessa rota, toda produção do Estado pode ser facilmente escoada e exportada para países da Ásia, através do porto de Matarani. Além de um projeto apresentado pelo governo do Estado, em março deste ano, para uma nova ligação do país através do município de Cruzeiro do Sul.
Uma superfície de 164.221,36 Km2, o Estado do Acre hoje tem um grande potencial na produção de alimentos, em especial proteína animal, que é o carro chefe de negociações nacionais e internacionais do Estado. O volume de produção vem em sua maioria da agricultura familiar, voltada para subsistência e consumo interno/local. Mesmo assim, desde 2016 o Acre tem ganhado espaço no cenário de exportações, firmando acordos comerciais com países como: Hong Kong, China, Estados Unidos, Alemanha, França, Bolívia e Peru. Exportando proteína animal, castanha e farinha de mandioca.
Desde 2017 o estado também já apresenta uma significativa entrada no mercado de produção de: café, soja e milho (soja e o milho voltado para o mercado externo), produção de polpa de açaí, produção em larga escala de água mineral engarrafada e fruticultura. Além da expansão na produção de proteína animal, com destaque a piscicultura e
suinocultura. Nos últimos meses de 2020 o Acre tem recebido investidores internacionais, e até diplomatas em visitas oficiais. Buscando conhecer e criar um ambiente de possíveis investimentos no Estado; afim de suprir as necessidades de alimentos e água dos seus mercados e principalmente em seus países. É fácil observar isso, quando se percebe que; as visitas dessas comitivas são feitas sempre em locais onde há produção de água, alimentos ou terras produtivas.
A concentração de esforços de alguns políticos que recebem essas comitivas, está voltada em apresentar apenas os empresários locais ( de preferência os que lhe apoiam) dos ramos alimentícios e produtores rurais. Grande parte dos negócios fechado pós visita dessas comitivas, se resume a: compra, financiamento ou parceria na produção de água e
alimentos. Em especial proteína animal, pescado, farinha, e recentemente soja e café. Lamentavelmente, a concentração de investimentos públicos no agronegócio acreano está voltado para produção de proteína animal e pequenos incentivos a produção de soja, café e milho. É bem verdade que a produção desses alimentos causa um grande impacto positivo na arrecadação pública, e em novos postos de trabalho; porém concentrar grande parte dos investimentos públicos, só nessa área, é no mínimo um risco.
Diferente do governo local, os investidores estrangeiros já perceberam que investir na agricultura familiar acreana e suas pequenas propriedades, garante uma produção de qualidade para vários alimentos. Além disso, o escoamento da produção se torna mais prático e rápido. É uma matemática simples: incentivar a produção de qualquer alimento,
em qualquer pedaço de terra, com a garantia de compra dessa produção a valores reais, através de cooperativas de coleta em pontos estratégicos.
Esse tipo de negócio já foi introduzido no Acre, mas por falta de planejamento estratégico, a coisa não foi a frente. A criação dos Peixes da Amazônia, é o retrato desse descaso. Enquanto o mundo e a ONU anunciava em 2018 que a proteína do peixe tinha um importante papel no cenário do combate a fome, e buscava alternativas para investimentos em projetos nessa área, o Acre tinha toda uma estrutura montada, com alto padrão de tecnologia, mas nada fez. Infelizmente, o piscicultor acreano perdeu uma grande chance de produzir peixe para o mundo, esse é só um dos muitos exemplos que temos, quando se fala em desperdício de oportunidades dentro do Estado.
O Acre hoje, tem um governo com um grande déficit em seu planejamento estratégico, e que ainda não percebeu o tamanho do potencial do estado. Talvez por isso as preocupações dos gestores ainda estejam voltadas para o crescimento do estado e não para o seu desenvolvimento. “A falta de conhecimento no jogo” geopolítico, já tem seus efeitos claros, causando um grande atraso em algumas áreas do estado. Infelizmente, percebe-se que o chefe do executivo tem boa vontade política, mas é muito mal assessorado, no que tange a planejamento e desenvolvimento estratégico; algo que também é notório na grande maioria dos legisladores do Estado, não há projetos para áreas sensíveis, nem objetivos concretos para desenvolvimento de áreas estratégicas.
O Acre ainda caminha a passos curtos, em direção a algum lugar. O mundo tem fome e sede, e o Acre tem água e comida em abundância. Mas infelizmente, ao que parece, é que ao contrario de grandes empresários e as superpotências mundiais, o governo e o próprio acreano, não consegue compreender a importância do Acre, nesse momento.
Com isso, já é possível perceber que as eleições de 2022 no Estado acreano, está começando a ser decidida agora. Qualquer candidato que desejar ser eleito ou reeleito, terá que entender o mínimo de geopolítica e segurança alimentar. O Estado agora tem visibilidade mundial, e provavelmente dentro de muito pouco tempo o acreano “comum” começará a ser beneficiado com toda essa mudança. E certamente, não precisará mais se sujeitar a humilhação política causada pelos que detém a máquina pública nas mãos. Em breve, qualquer um que tenha um pedaço de terra no fundo do quintal, poderá se tornar um empreendedor de sucesso. Logo, o Acre será dos acreanos e não dos políticos.
Marcos Sant’ana é Historiador, Especialista em Relações Internacionais, Inteligência Estratégica e Contra- Inteligência. Possui cursos nas áreas de: Prospecção de Cenários Futuros em Defesa e Segurança, Política e Estratégia e Simulação de Combate.