Tião Viana: O narcotráfico é a maior ameaça para gerações presentes e futuras

Na última segunda-feira, 16, o governador Tião Viana reuniu a imprensa para falar sobre os dois importantes eventos nacionais que discutirão segurança e meio ambiente no Brasil e serão realizados em Rio Branco nos dias 26 e 27, com o objetivo, principalmente, de discutir a questão da segurança pública em caráter nacional, com a necessidade de um amplo combate ao narcotráfico e proteção das fronteiras do país, além das questões específicas da Amazônia Brasileira. “Vocês estão ajudando a divulgar uma das agendas, talvez, mais importantes que o Brasil tem vivido nos últimos 20 anos, que vai ser esse encontro dos poderes da República com os governadores do Brasil e governadores da Amazônia Sulamericana. Estarão também ministros de Estado e Embaixadores e representantes de países discutindo um tema que é de interesse comum pra todos nós da Amazônia”, frisou o governador.

“Nós estamos falando de um assunto que é mais ameaçador para gerações presentes e futuras, que é exatamente o narcotráfico. Não é um assunto qualquer”, lembrou.

Adiante: “Hoje a escala de atenção do Brasil para combate aos crimes está: primeiro a corrupção, depois os crimes ambientais e depois o narcotráfico. Sendo que o assunto mais grave do Brasil e do mundo é o narcotráfico. A corrupção, todo ladrão tem que ser preso, mas ela existe desde que se levava o pau-brasil pra Europa ou a Coroa Portuguesa vinha pegar. Então não se pode deixar de dar prioridade ao mais grave dos problemas. O mundo vive a mais grave crise ecológica da história das civilizações e vive a ameaça do narcotráfico comprometendo as futuras gerações”.

Ainda: “Nós estamos falando de 60 mil mortes por ano, no Brasil. Nós estamos falando de um movimento financeiro sem tributação, que movimenta mais de R$ 2.6 trilhões de dólares e estamos falando de Peru e Bolívia, que ao lado da Colômbia são os maiores produtores de cocaína do mundo, aqui ao lado”.

A seguir os principais trechos da entrevista:

O que de imediato tem que ser feito?

Tião Viana: “O pedido de prioridade nosso: sistema nacional de segurança pública tem que ser constituído como tem o de saúde, como tem o de educação. Nós temos que ter uma força-tarefa nacional de combate ostensivo a droga interna contra os traficantes e a proteção e fechamento de fronteiras, por que tudo ocorre a partir das fronteiras abertas, nós temos a passagem de drogas, de armas e de munições o que é gravíssimo. Ontem, 15, nossa polícia apreendeu mais de 300 balas de fuzil em Cruzeiro do Sul.

Pra você ver o tamanho da fragilidade das fronteiras. Quando você olha uma região como a do Juruá, tem oito rios abertos que saem do Peru com paramilitares andando com mochilas cheias de cocaínas todos os dias. Nós temos imagem de paramilitares peruanos com metralhadora atirando dentro da região do Brasil, no Acre.

O essencial pra nós: sistema nacional de segurança pública; força-tarefa nacional para o fechamento e proteção de fronteiras contra drogas, não contra o trânsito de pessoas; uma ação de um plano nacional emergencial de segurança pública; um fundo nacional de segurança pública e aquilo que a União possa fazer emergencialmente para unir as inteligências das polícias estaduais com as polícias da União para que falemos a mesma linguagem e tenhamos a mesma estratégia. É isso que nós estamos apontando. Isso eu tratei com o presidente da República, com os ministros da área de Segurança dele e também com os governadores do Brasil”.

Governador, falando do Encontro de Governadores, por que o senhor chamou essa discussão para o Estado do Acre e de que maneira específica a criação do Sistema Nacional de Segurança Pública ajudaria a combater o crime do narcotráfico e todos eles que estão nessa situação?

“Porque alguém tinha que fazer, e eu vivia na aflição dividindo com os colegas daqui. Nós estamos trabalhando com uma taxa de homicídio que é crescente no Brasil. Nós estamos falando de mais de 60 mil homicídios por ano e nós precisávamos fazer algo emergencial.

E fui eu que puxei nos meus colegas governadores essa tragédia que nós estamos vivendo para uma intervenção imediata, ou seja, estamos atrasados há anos em um debate sobre a intervenção que nos permita união e uma ação estratégica integrada contra a maior ameaça para o presente e o futuro do Brasil e do mundo, que é o narcotráfico. Nós tínhamos que fazer algo e foi isso que me chamou a envolver meus colegas e trabalhar.

A expressão disso é um Rio de Janeiro com 800 territórios de crime onde o Estado não pode se fazer presente; a expressão disso é a presença de centenas de policiais pedindo demissão com medo de morrer; a expressão disso é que as pessoas saem apavoradas de casa Brasil a fora com medo da violência; a expressão disso está na ameaça de contaminação das instituições na vida político-partidária, na vida militar, na vida policial por infiltrar o narcotráfico”.

O senhor acha que o governo federal vai ficar atento às reivindicações dos governadores, já que é um problema muito sério?

“Houve a demonstração disso porque não só o presidente da República confirmou a vinda, o presidente do Congresso e do Senado, senador Eunício oliveira, o vice-presidente da República em exercício, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, a presidente do Supremo Tribunal Federal, a procuradora-geral da República.

Nós vamos ter a oportunidade de dizer: o problema está aqui, quais as ações prioritárias? Da Presidência da República, uma ação emergencial como eu falei. Do Supremo Tribunal Federal, o debate sobre as leis penais no Brasil. Da procuradoria da República a mesma coisa e do Congresso, que leis emergenciais podem ser votadas a favor de uma resposta imediata a tão grave e ameaçador problema.

É isso que vai nos unir agora. Como eu disse ao presidente da República: Presidente, nós governadores da Amazônia Legal, nove estados, estamos gastando R$ 10 bilhões por ano com segurança pública e a União todinha está gastando no Brasil inteiro R$ 8 bilhões por ano em segurança pública, então isso é uma desproporção, algo muito grave que estamos vivendo e não pode se dar dessa maneira”.

Governador, o Brasil tem mais de 5 mil km de fronteira seca, o que dificulta muito essa fiscalização. O senhor sugeriu a participação das policias Federal e Rodoviária Federal e do exército nessa atuação?

“Com certeza. É atribuição constitucional deles. Você imagina que as fronteiras são atribuições exclusivas das polícias da União e também das forças armadas e nós não temos uma presença como eles, militares, gostariam de ter, não temos uma presença como as polícias técnicas gostariam de ter. Então isso é fundamental.

O Brasil não regulamentou, sequer, o controle de munições. Munições são vendidas de maneira aleatória, sem controle rigoroso e o custo é muito alto porque há perda de vidas. Onde vai a munição, vai estar a arma que foi traficada e onde está a arma vai estar a droga também. Essas coisas andam juntas”.

Então quer dizer que essa política vai ser implementada, governador?

“Eu acredito que não tem como adiar medidas simples. Você imagina, dentro do fundo penitenciário brasileiro tem R$ 12 bilhões parados onde o percentual efetivo é para os estados. Por que esse dinheiro precisa continuar parado? Por que não pode ser colocado para unir as polícias para que elas falem a mesma linguagem, tenham interface, tenham integração. Então não há razão para isso não acontecer”.

Governador, a segurança pública vai ser muito debatida nos dois fóruns, mas a questão do meio ambiente vai ser debatida, principalmente, no Fórum de Governadores. Qual a expectativa?

“No dia 26 nós vamos ter o Fórum de Governadores só da Amazônia, envolvendo nove governadores, onde a agenda envolve questões de natureza socioambiental, vamos discutir o consórcio de governadores como já tem no centro-oeste para que tenhamos uma plataforma de investimentos integrada entre os governadores da Amazônia e vamos discutir políticas de terras para o desenvolvimento regional como resposta à crise econômica nos nossos estados. Então são temas atuais que nós temos discutido a cada 90 dias. E no dia 27 nós vamos ter o grande debate sobre segurança pública no Brasil”.

Como vai se dar o fechamento das fronteiras e ao mesmo tempo a situação da imigração? O Acre já sofreu muito com isso nos últimos anos.

“O fechamento de fronteira não envolve nada de natureza de cooperação, de trânsito de pessoas, de comércio, nada. É apenas fechar para o crime. Tão-somente para o crime”.

Eu me refiro a pessoas que se aproveitam dessa situação.

“Aí é o caminho da inteligência, medidas de fiscalização permanente e um trabalho de controle permanente. É preciso investir. Nós não podemos ter um grande efetivo das forças armadas do Brasil no centro-sul, onde não há problema de fronteira tão pequeno ainda na Amazônia em que pese o esforço que tenha havido por parte das forças armadas que faz um grande trabalho com sua capacidade logística”.

Governador, com relação aos países como Peru e Bolívia, que têm um grande papel na formulação de combate ao crime organizado, ao narcotráfico, como esse Fórum pode ajudar a sensibilizar para que esses países também se tornem colaboradores de políticas de segurança para toda a América Latina, principalmente?

“Eles têm interesse, têm sensibilidade, trabalham com muita seriedade também, isso é bom que fique bem claro. Agora, o que falta é estrutura. Eu tenho debatido, o fundo da Amazônia recebeu R$ 1 bilhão de dólares de governo da Noruega, de outros governos, pra operar nas questões de fronteira e questões ambientais da Amazônia.

Mas a gente não olha a Amazônia Sul-americana, só tem olhado a Amazônia brasileira, aí quase todo o dinheiro é pra monitoramento eletrônico, quando podia ser para desenvolvimento sustentável e toda família que tenha capacidade de ter uma renda, uma economia sustentável, ela vai fazer, possivelmente, uma opção por essa renda do que ser escravo da droga, uma escravidão moderna. Então precisamos dar uma olhada na maneira de atuar na Amazônia.

A polícia do Acre tem avançado muito na cooperação com as polícias da Bolívia, do Peru. A da Bolívia está até mais avançada nessa cooperação do que a polícia peruana e o governo brasileiro percebe essa interface que está ocorrendo. O fato é que nós hoje estamos em uma situação pior do que a Colômbia estava nos anos 80, na época de Pablo Escobar, e ninguém está ligando para isso.

É raro hoje você ter um ambiente escolar que não tenha alguém que tenha algum contato com membros de facção e isso é alarmante, é uma tragédia que está aos olhos porque é como se fosse uma luta muito desigual.

Um pai e uma mãe humildes e trabalhadores de qualquer classe social dizer para um filho: você terá 20, 25 anos de caminhada, de esforço e luta para começar a vencer na vida. Aí o traficante diz: “Eu te dou mil reais por semana pra você ter carro, celular, prazeres da vida se você distribuir drogas. É uma luta desproporcional. Nós não estamos falando mais de falta de vagas nas escolas.

As vagas estão sobrando. Nós estamos falando de uma economia que cresce apesar das dificuldades, no nosso Estado. Nós estamos falando de uma tentação, de uma caminhada para o abismo, traiçoeira e muito perigosa pelo poder do dinheiro que o tráfico de drogas representa. Você imagina, mil traficantes a serviço do crime, distribuindo drogas por semana, todo dia aqui no nosso estado, recebendo mil reais por semana, estamos falando de R$ 4 mil por mês.

Isso não é nada para força do tráfico de drogas que movimenta bilhões. E esses jovens muitas vezes perdem a força para poder enfrentar o caminho duro da vida por um caminho falso e traiçoeiro. É isso que nós ficamos enfrentando no nosso dia a dia”.

A questão do turismo pode ser uma alternativa econômica contra essa força do crime?

“Pode ser muito importante para todos nós que queremos ter lembrança do Acre, da Amazônia, dos estados menores é a hospitalidade, boa vizinhança, é um ambiente de paz em que as famílias se encontrem no seu cotidiano, que possa sentar na calçada ao anoitecer, que os filhos possam brincar com segurança. Ninguém quer a violência, e se não tiver uma política integrada com prioridades na área de segurança, sobretudo, o preço será muito alto.

Nós temos trabalhado com todo esforço pela educação, pela economia, por uma política de inclusão, mas nos falta a força de repressão ao poder incontrolável que o narcotráfico tem na cooptação de pessoas inocentes. Você olha o Juruá, você vê os rios Tejo, Juruá-mirim, Amônia, Môa, Azul, Juruá, todos integrando a passagem do narcotráfico e paramilitares peruanos e bolivianos. Você vai conversar com o líder Ashaninka, ele vai dar um exemplo da força disso”.

Ele disse que em torno do ano de 2007 entrou um grupo de peruanos na Aldeia e disse “Nós temos mão de obra e queremos fazer uma pista de pouso aqui, nós temos dois voos por semana, parando aqui pra abastecer e sair. Nós damos para cada voo U$ 50 mil”. E eles recusaram pela dignidade, mas quantos aí conseguem se manter em uma recusa para esse tipo de atração da força do crime?

Não iam plantar, não iam produzir, mas iam ser base de passagem, de parada de um avião de narcotraficante vido do Peru. É isso que nós estamos enfrentando. É uma força do dinheiro que não é despertada, e que não chama atenção”.

Governador, dos temas que serão debatidos no Fórum de Governadores da Amazônia quais os principais resultados que o Acre tem a apresentar e a compartilhar?

“Nós conseguimos a redução de quase 60% do desmatamento, nos últimos anos, dando credibilidade mundial ao Acre. Isso vai ser confirmado na conferência do clima, na Alemanha, agora. O estado subnacional está na linha de frente dando o melhor exemplo e isso é confirmado em qualquer encontro mundial sobre meio ambiente. Agora, nós precisamos ter essa política ampliada para outros estados. Felizmente temos uma parceria boa com Rondônia, uma parceria boa com Mato Grosso, temos uma cooperação internacional que atua a favor dessas parcerias.

Essa questão ambiental nós estamos dando um passo. Precisamos correr contra o tempo e o Brasil não pode desperdiçar e quando me refiro a não deixarmos de lado o combate ao narcotráfico e não podemos deixar de lado as políticas ambientais, é por isso: a maior tragédia civilizatória da humanidade é a tragédia ambiental, então não podemos deixar de lado. Não podemos deixar de lado a tragédia do narcotráfico que está ameaçando o Brasil do futuro e a corrupção tem que prender o ladrão.

Não pode botar, por exemplo, 115 policiais cercando um prédio em Brasília para prender um ladrão de dinheiro público e um helicóptero sobrevoando uma hora. Esses 115 policiais poderiam estar nas fronteiras e o ladrão, bastava um delegado ligar para dizer que ele está preso e que comparecesse agora. Ele vai porque ladrão não quer escândalo e a justiça estaria sendo feita. Então o país precisa ser pensado de um jeito diferente.

Prende o ladrão, mas vamos priorizar os gravíssimos problemas que estão comprometendo o Brasil inteiro. A corrupção é um câncer, tem que ser combatida veementemente, de maneira implacável, mas a tragédia ambiental e a tragédia do narcotráfico estão destruindo civilizações e isso não pode acontecer”.

Governador, não seria a hora de pensar em outra maneira, como, por exemplo, regulamentar a droga?

“Uma pergunta importante. O Brasil era o 101º consumidor de drogas há 23 anos. Hoje é o 2º consumidor de drogas do mundo. Só fica atrás dos Estados Unidos. Quando você olha os americanos, eles investiram U$ 1 trilhão dentro da Colômbia no combate ao narcotráfico que levava droga para os Estado Unidos.

O Brasil está gastando R$ 8 bilhões por ano em segurança pública no Brasil todo. Você veja a tragédia que está instalada. O debate sobre a regulamentação ou não, a descriminalização ou não, eu sigo muito o professor Josafá Marinho, um dos maiores legisladores do Brasil, que diz: As leis devem ser consequência de uma decisão madura da sociedade e não estar em desproporção com a maturidade da sociedade.

Então a última palavra tem que ser da sociedade, mas nós temos que olhar para o lado e para cima. Você olha o exemplo da Holanda que fechou 19 presídios nos últimos anos, que teve boas leis, que teve a descriminalização e está abrindo escolas no lugar dos presídios.

Você olha o exemplo da Islândia, inovador também, envolvendo as ferramentas culturais contra o problema da droga. Então é um conjunto de caminhos que podem nos levar a novas alternativas, mas a palavra final tem que ser da sociedade, tem que ser um debate direto e maduro, onde ninguém seja dono da verdade, onde façamos o melhor.

Eu, por exemplo, posso dizer que sou a favor de prisão perpétua para o narcotraficante, no mínimo 30 anos em regime fechado, sem visita íntima, sem qualquer benefício, mostrando que a lei tem que ser implacável contra os narcotraficantes, mas sou a favor do debate livre, aberto, maduro e não preconceituoso sobre esse tema”.

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