Governo do Estado, por meio da Emater/Acre, começa série de cursos voltados para produtores e cooperativas terem a oportunidade de melhorar qualidade da industrialização e vender mais
No salão da Cozinha Comunitária do Bairro Novo Horizonte, em Rio Branco, uma equipe aguerrida de profissionais da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado do Acre (Emater/Acre) prepara uma série de informações no datashow. O curso a ser ministrado tem como tema as boas práticas de fruticultura, e é direcionado a pequenos produtores rurais residentes nos sete polos de assentamento do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).
Ao longo de todo o dia de terça-feira, 21, quando se iniciou a capacitação, a greve dos motoristas e cobradores do transporte coletivo prejudicou uma presença massiva, mas não estragou a disposição dos técnicos e dos colonos que, de algum modo, conseguiram chegar para a etapa teórica, ministrada pelo engenheiro agrônomo Ildefonso Generoso.
Extensionista da Emater há décadas, Generoso acompanha e assessora as famílias que moram no interior dos polos do Incra no Acre. Neste curso, ele terá o apoio de muitos colegas de trabalho, entre eles, Raimundo Advíncola, chefe do escritório da Emater na regional de Rio Branco.
Num cenário ainda de pandemia de Covid-19, em meio a um período severo de verão, com açudes e reservatórios quase secos e sofrendo a redução de repasses do governo federal ao programa da Agricultura Familiar, ninguém se admiraria se o desânimo batesse à porta.
“Isso não. Muito pelo contrário”, dispara Advíncola. “Vivos estamos e precisamos tocar a nossa missão, que é a de contribuir com essas pessoas que querem produzir com qualidade, e que para isso só precisam que tenhamos um olhar diferenciado para elas, independentemente das dificuldades”, completa o profissional, com o semblante de quem é apaixonado pelo que faz.
A cultura do cultivo de maracujá, da acerola, da graviola e do açaí e as técnicas de manuseio, limpeza, embalagem, transporte e vendas das polpas foram o foco principal do curso, que no dia seguinte, quarta-feira, 22, foi retomado na prática, na propriedade da agricultora Elza Rodrigues da Silva, no km 1 do Ramal Beija Flor, localizada a 19 quilômetros de Rio Branco, pela estrada de Porto Acre (município a 80 quilômetros da capital acreana).
“Escolhemos essas frutas porque elas são as preferidas do consumidor. Nas lanchonetes, nos pequenos comércios, mercadinhos e grandes redes de supermercados são elas que dominam. E hoje o mercado consome tudo o que for produzido, desde que o produto seja de qualidade, que a polpa seja beneficiada com zelo para garantir a segurança sanitária. Daí essa força-tarefa para capacitá-los”, ressalta Ildefonso Generoso.
Um levantamento de cinco anos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística mostra que, à época, o Acre produzia ao menos uma tonelada de maracujá, com as vendas chegando a mais de R$ 2,5 milhões, obtidas na colheita em 193 hectares.
Já os números do açaí são mais recentes, de 2019. Os pés de cultivo – que são plantados pelo homem – rendeu no referido ano um faturamento de mais de R$ 1,1 milhão em 110 hectares de colheita. Se comparada à produção do açaí nativo – aquele que faz parte espontaneamente do ambiente –, a colheita foi de mais de 4,7 toneladas, com ganhos da produção ultrapassando os R$ 5,2 milhões.
Profissionais extensionistas e agricultores tentam superar entraves
Mas se há mercado para polpas de frutas regionais com consumidores a rodo, o que falta para deslanchar de vez o potencial econômico contido nas terras dos polos agroflorestais do Acre? A resposta pode ter uma série de variáveis que vão desde a necessidade de incentivar produtores ao plantio e a se organizarem em cooperativas e associações, até o assessoramento de agências e instituições estaduais e federais que ofereçam um norte para os produtores conduzirem seus empreendimentos.
“As dificuldades são grandes, mas não são impossíveis de serem vencidas”, salienta Maria Madalena Braga, uma das extensionistas da Emater/Acre.
“A sociedade está muito exigente hoje; ao ir à feira ou ao mercado, as pessoas escolhem o produto de qualidade. Mas isso acontece porque, infelizmente, muitos produtores deixaram de afinar sua produção, abrindo mão da qualidade e até deixando de trabalhar com cooperativas”, destaca Maria.
A produtora Elza Silva emprestou a sua miniusina de beneficiamento para o curso da Emater. Ela concorda que os trâmites para montar uma cooperativa de industrialização são uma verdadeira maratona burocrática, mas que também ainda falta mentalidade empreendedora entre famílias de produtores de polpas.
Ela e o marido construíram, praticamente sozinhos, uma beneficiadora de frutas, sem antes terem tentado unir outros produtores em torno do mesmo objetivo: uma cooperativa que pudesse favorecer todos os vizinhos.
“Tive a ajuda da Emater e mesmo assim ainda falta muito, mas hoje já estou trabalhando, adquirindo as frutas com caroço a R$ 3 o quilo dos produtores da nossa comunidade, e repassando a R$ 10 para o mercado, com a polpa já embalada”, conta Elza. Ela afirma que o alvará sanitário já está na mão, esperando apenas o processo de rotulação e de código de barras, prestes a sair.
Vera Gurgel, também especialista em extensão rural da Emater, afirma que o produtor rural é a grande razão do trabalho dos técnicos. “Praticamente todo alimento que chega à mesa das pessoas tem como caminho a pequena produção. Mas ela só é pequena por causa da propriedade. Hoje, nosso foco é a agricultura familiar, pois é o produtor rural que tem a matéria-prima. E um cupuaçu que cai e fica lá, sem ser colhido, gera prejuízo. Daí, a necessidade de valorizar cada fase desses cursos”, salienta.
Se o produto é bom, o consumidor retorna
Ofélia Dias Lima, 45 anos, há 12 mora no Polo Dom Joaquim, km 18 da AC-90, a estrada Transacreana, onde mantém um plantio de banana, cupuaçu, graviola e legumes.
Ela entende que é de grande importância manipular os alimentos adequadamente, para que o consumidor volte a requisitar o produto. “Uma polpa de qualidade, totalmente pura e bem beneficiada, permite que as pessoas retornem. E isso só é possível com o conhecimento”, pontua.
Ofélia espera que, para o ano que vem, o governo faça uma intervenção maior na região, com a compra da produção da agricultura familiar a ser repassada para instituições como o Lar Vicentino, Apae e Educandário Santa Margarida.
“Outro fato importante é que precisamos de mecanização, de aradar a terra com o auxílio do maquinário do Estado”, diz.