REDD+, que bicho é esse? – Artigo de Vássia Silveira

Em 2015, durante a 21ª Conferência das Partes (COP 21), realizada em Paris, na França, o Acre saiu na frente de estados subnacionais do mundo todo ao receber da Climate, Community and Biodiversity Alliance (CCBA), a certificação pela correta aplicação de salvaguardas socioambientais no programa ISA Carbono, iniciativa de REDD+ (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal com Benefícios Socioambientais, em português) que começou a ser colocada em prática pelo estado a partir de 2011.

A notícia é animadora, mas continua sendo festejada mais por organizações governamentais e não governamentais que se dedicam às questões ambientais, do que pelo cidadão comum – a quem nós, jornalistas, ainda não fomos capazes de dizer com clareza o que representa, no cenário global, esta conquista.

Uma das razões para o imbróglio é antiga e chegou a ser apontada, em Rio Branco, pelo jornalista gaúcho Roberto Belmonte, durante um curso para comunicadores promovido pelo WWF-Brasil, no final dos anos 1990: É preciso encontrar uma maneira de traduzir, de maneira clara e simples, questões complexas das pautas ambientais.

Naquela época, o Brasil e o mundo começavam a discutir de maneira mais incisiva a importância de um modelo de desenvolvimento econômico baseado na sustentabilidade, assim como os riscos que atividades humanas representavam para o equilíbrio do clima no planeta.

Passadas quase duas décadas da vinda do jornalista gaúcho ao Acre, os desafios que os temas ambientais impõem ao exercício da profissão se alargaram, obrigando-nos a traduzir – “de maneira clara e simples”, como sugeria Belmonte – siglas importadas de outro idioma, como REDD e REDD+, ambas sinônimos de estratégias pensadas para enfrentar o grave problema das mudanças climáticas e que garantem incentivos financeiros a países e estados subnacionais que as implantam.

Em se tratando de REDD+ e suas salvaguardas (outra expressão que merece ser bem traduzida), afirmar que o Acre ganhou reconhecimento internacional graças à correta condução de salvaguardas socioambientais em um programa desta natureza, pode dizer muito a um ambientalista, técnico ou gestor da área. Mas pouco para quem não domina o assunto.

E aqui entra o “x” da questão: como podemos traduzir essa informação de maneira que qualquer leitor, nas cidades ou nas florestas, compreenda a dimensão e os resultados alcançados, até agora, pelas escolhas que o governo do Acre vem adotando em sua matriz econômica?

Responder a esta pergunta significa lembrar, primeiro, do desafio global para a redução da emissão de gases causadores do efeito estufa, entre eles o CO2 (dióxido de carbono), como forma de diminuir os impactos das mudanças climáticas – como as cheias ou secas. E, segundo, dizer que o Acre tem hoje um conjunto sólido de políticas que incentiva atividades econômicas sem a necessidade de derrubar as florestas (elas são fundamentais para o equilíbrio do clima), e vê o modo de vida de seus moradores como sendo estratégico para o futuro não apenas do estado, mas da humanidade.

O fato de reconhecer como bens estratégicos a floresta e a relação de respeito que indígenas, seringueiros, ribeirinhos e pequenos produtores têm com ela, ajuda a explicar a implantação do programa de REDD+ acreano, o ISA Carbono. Iniciativa que faz com que o estado e comunidades tradicionais da região estejam aptos a receber compensação financeira de outros países – como a Alemanha, que entre 2011 e 2016, pagou ao Acre aproximadamente R$ 100 milhões pela redução de 6,572 milhões de toneladas de CO2 (gás carbônico).

Engana-se, porém, quem pensa que para receber uma soma desta natureza, o governo pode lançar mão, em seus resultados, da usual expressão “coisa pra inglês ver”. Porque a compensação financeira de REED+ só é liberada após rigorosas pesquisas e visitas técnicas que comprovem os dados informados.

E aqui entra a importância do reconhecimento internacional no que diz respeito às salvaguardas socioambientais: o Acre ganhou a certificação porque provou que o ISA Carbono, primeiro programa do SISA, é horizontal, e fruto de uma política que reúne um arcabouço de leis  comprometidas com o desenvolvimento sustentável. Ele foi e continua sendo discutido com diferentes grupos da sociedade e há, na estrutura de governo, instituições responsáveis por monitorar e avaliar cada passo dado pelo programa – para garantir, por exemplo, que suas ações não coloquem em risco os recursos naturais, a biodiversidade e os interesses das comunidades envolvidas.

Até agora, a boa condução do programa trouxe resultados concretos – em forma de investimentos e apoio para atividades que geram renda sem destruir a floresta – para 10 associações indígenas, 12 associações extrativistas e 32 organizações e cooperativas da produção familiar. Beneficiando, segundo dados do Instituto de Mudanças Climáticas e Regulação de Serviços Ambientais (IMC), mais de 19 mil pessoas até o final de 2016.

Em um cenário onde as grandes potências buscam alternativas para frear as emissões de gases do efeito estufa, crescer economicamente tendo a floresta e a herança extrativista de seus moradores como aliados – salvaguardando-os – faz diferença.  E pode mesmo servir de modelo, ecoando uma urgência que foi apontada pela coordenadora da Organização dos Professores Indígenas do Acre (Opiac), Francisca Arara, durante a Conferência das Partes (COP23), que começou no último dia 6, em Bonn, na Alemanha: é preciso “que o homem reflita o seu jeito de pensar, de usar a terra, a floresta, de forma desorganizada. Porque isso está trazendo problemas seríssimos para o clima”.

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