Políticas afirmativas voltadas para indígenas são intensificadas com criação de secretaria e fortalecem tradições no estado

Com o objetivo de fortalecer políticas públicas destinadas a promover e proteger os direitos dos povos indígenas, o governador do Acre, Gladson Cameli, criou a Secretaria Extraordinária de Povos Indígenas (Sepi) em julho do ano passado. Em menos de um ano, a gestão, neste 19 de abril, comemora avanços na pauta e faz um balanço das ações dos últimos meses.

O primeiro passo foi estruturar e organizar a casa para que os recursos pudessem ser devidamente aplicados. Ao todo, segundo a titular da pasta, foram aplicados mais de R$ 4,5 milhões. Como a secretaria teve que ser criada do zero, demandou muitos processos burocráticos, mas o resultado dessas ações nesse curto espaço de tempo inclui melhor diálogo com os povos indígenas, aproximação do poder público à comunidade e, principalmente, o fortalecimento da cultura.

Governo tem fortalecido ações para os povos indígenas por meio da Sepi. Foto: Marcos Vicentti/Secom

Dados do Censo Demográfico de 2022, último levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram que o número de indígenas teve o maior aumento em 12 anos, passando de 17.578 para 31.694 – 80,3% a mais do que no recenseamento anterior. Ou seja, dos 830.018 habitantes do estado, 3,82% são indígenas.

Foi pensando nesse aumento que o governador criou a pasta, que também tem como atribuição garantir os direitos dos povos indígenas, promovendo a justiça e a equidade, além de atuar em coordenação com órgãos e entidades governamentais e não governamentais para garantir a implementação das políticas e programas destinados aos povos indígenas.

Atualmente o estado tem 18 povos distribuídos em 36 terras indígenas, que registram 246 aldeias. “Depois da criação da Sepi, aplicamos mais de R$ 2,1 milhões com pagamento de bolsas, implementação dos planos de gestão e apoiamos 10 associações indígenas com emenda parlamentar. Primeiramente estruturamos a Sepi. O primeiro momento foi criar o CNPJ e todo aquele passo a passo, que é um mundo de coisas. A gente veio executar, de fato, o recurso no final de novembro”, destaca a secretária Francisca Arara.

Com o edital de lançamento da fase três, finalizou a fase dois do REM. “Esse edital é especificamente para atender associações indígenas do recurso do REM e nossa equipe está toda planejada para ir para campo em sete viagens para acompanhar de perto, elaborar os projetos, e fazer relatórios, até para entendermos se essas associações estão em dia”, diz.

Francisca Arara foi a primeira mulher indígena a ser nomeada no Estado. Foto: Marcos Vicentti/Secom

Governança

Para que o Estado consiga acessar esses recursos, precisa cumprir algumas obrigações, uma delas reduzir o desmatamento. O maior impacto das ações voltadas para a preservação pôde ser visto entre 2022 e 2023, quando houve redução de 74% nos alertas de desmatamento entre 2022 e 2023.

“Temos uma lei que regula todos os projetos e programas para que esses recursos, muitas vezes internacionais, cheguem até nós. Então, é importante essa governança porque tem a consulta, o diálogo, a participação dos povos indígenas, a análise se o projeto vai violar ou não os direitos indígenas, o risco. Por isso, é muito importante a Sepi acompanhar essa discussão de captação de recursos com todos os órgãos”, destaca.

Fortalecimento de políticas públicas para os povos indígenas evidencia compromisso do Estado. Foto: Marcos Vicentti/Secom

Emergência

O Acre sofreu, entre fevereiro e março, o que foi considerado o maior desastre ambiental devido às proporções da cheia dos rios. Só para o atendimento dos povos indígenas, que perderam 100% de suas produções, foram destinados ainda R$ 2 milhões. Ao todo, 11 mil indígenas foram atingidos, segundo a Sepi.

“Atendemos para mais de 169 aldeias, duas mil famílias, 11 mil pessoas atingidas, levando cestas básicas, kits de limpeza e higiene e ainda 850 redes. Agimos rápido e ainda estamos nesse trabalho de pós-cheia, porque temos que reconstruir roçados, sensibilizar as aldeias, conscientizar os parentes para não morar mais na beira do rio, e estamos com tudo isso preparado para entregar para o estado, porque, inclusive, isso é pauta internacional, ter dados de toda a destruição e erosão que essa cheia causou”, relata a gestora, Francisca.

Festivais como resgate e fortalecimento

Neste ano, pela primeira vez, o governo do Acre, por meio da Secretaria de Estado de Turismo e Empreendedorismo (Sete), incluiu na programação do estado 23 festivais indígenas, um ato não só de respeito aos povos originários, mas de fortalecimento cultural em que cada etnia pode expor sua cultura e movimentar economicamente a região que ocupa.

“Quem vai ao festival acaba movimentando a economia do local ao ter a vivência. Temos a venda do artesanato, as pinturas, a compra da alimentação e, no final, você deixa esse recurso na própria terra indígena”, pontua.

Outro ponto importante desses eventos tem sido a presença do governador. Ao marcar presença no Festival do Povo Shawãdawa, em janeiro deste ano, Gladson Cameli foi o primeiro governador do Estado a visitar a terra indígena que fica na Aldeia Foz do Nilo, em Porto Walter.

Na ocasião, ele reforçou seu compromisso com os povos originários. “Estou emocionado. Aqui tem uma energia, e me proponho a vivenciar essa experiência para que eles [indígenas] saibam que são o termômetro do mundo. Eu não vou decepcionar os povos da floresta, os povos indígenas, e vamos fazer tudo aquilo que pudermos para que a gente possa cuidar das pessoas. Nós somos iguais”, disse na ocasião.

Para Francisca, o envolvimento do governador em todos esses eventos em que ele faz questão de marcar presença reflete o engajamento da gestão pública com a pauta.

“É bom ver o compromisso do governador. Ele é muito presente nesses eventos culturais, assim como outros secretários. Além disso, são os indígenas falando para ele diretamente sobre as demandas daquela terra. Este ano ele já visitou umas sete terras indígenas e isso é muito bem visto por quem está de fora”, disse.

Acre tem 23 festivais indígenas listados no calendário oficial. Foto: Marcos Santos/Secom.

Planejamento

Francisca destaca que está nas tratativas para que o governo do Estado e a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) assinem um termo de cooperação para facilitar o acesso em todas as aldeias.

“A gente não quer que o trabalho continue sendo feito em varejo, a gente quer estruturar institucionalmente as coisas e esse termo de cooperação tem que ser feito com o governador e a Funai. Uma das coisas que a gente está batalhando é para trazer a presidente da Funai [Joenia Wapichana] ao estado e fazer esse termo de cooperação para entrarmos nas terras indígenas”, pontua.

Também há projeções para fomentar a cultura entre os povos. Um recurso específico já foi garantido para que os indígenas possam trabalhar em projetos que divulguem sua cultura.

“Conseguimos R$ 500 mil do Fundo Municipal de Cultura e R$ 1 milhão da Lei Paulo Gustavo, e agora estamos tratando também de conseguir recursos da Aldir Blanc. Temos esse olhar de pai para filho, que não faz distinção e que tem trabalhado as questões comuns em todas as terras, porque também temos a especificidade de cada povo”, esclarece.

Na educação, o foco será na formação de professores e reforma das escolas. Também deve ser criada a Comissão Escolar Indígena, que vai reunir representantes de todos os povos para debater e garantir avanços na área.

Foco deste ano é educação indígena, diz Sepi. Foto: Marcos Vicentti/Secom

Reconhecimento

A presença do Estado passa às lideranças indígenas a segurança de um governo preocupado e atento às pautas específicas. Mapu Huni Kuin, liderança espiritual, destacou a importância.

“Todos nós vivemos da política e quando a gente tem um governo que nos representa é importante ele estar junto, porque ele representa nossa liderança. No nosso povo temos muito isso: liderança da casa é o que move a comunidade. Ver o governador empenhado junto com a gente para que tudo isso aconteça, é fundamental e nos dá força para que a gente possa realizar nossos eventos, o que vai trazer economia para o estado, município e vai fortalecer a rede de economia”, disse.

Foi no Festival Huwã Karu Yuxibu que ocorreu a abertura da Liga Indígena (Indigenous League), uma iniciativa da startup Nave Global, com apoio do governo do Estado. O Acre foi o pioneiro no projeto, que deve ser levado a outros estados. O governador esteve na abertura da liga.

“É fundamental o governador estar presente, porque nos dá a oportunidade de realizar esses eventos com a estrutura que ele está nos proporcionando com as secretarias que estão presentes dando o seu melhor pra nós, porque precisamos do governador ao nosso lado, para que a gente possa fazer cada vez mais pela nossa cultura e atender à necessidade do evento”, destacou Mapu Huni Kuin.

O cacique da Aldeia Foz do Nilo, Raimundo Vale, também falou do momento histórico que foi receber o primeiro governador na terra do Povo Arara.

“A importância é revitalizar todos os nossos conhecimentos tradicionais que perdemos, mas nossa juventude precisa ter esse conhecimento. Estamos com quatro festivais, mas este é o primeiro oficializado com toda a governança do Estado, apoio do governador, prefeito e deputados federais. Então, esse é mais histórico para a gente, com mais pessoas, com o povo Shawãdawa reunido”, disse.

Governador faz questão de estar presente em festivais indígenas. Foto: José Caminha/Secom

Em março também, mais uma vez, o governador participou de um momento histórico na Terra Indígena Puyanawa, em Mâncio Lima. Ele participou do casamento entre os jovens Raine Wenki Piyãko e Rosane Txukukatxi, filhos de importantes lideranças dos povos Ashaninka e Puyanawa.

“Os festivais culturais nas nossas aldeias têm gerado um forte turismo etnoecológico para o nosso estado. Isso abre oportunidades não só para os indígenas, mas também para toda uma rede de prestação de serviços com alimentação, transporte e hospedagem. A união entre Puyanawa e Ashaninka amplia as perspectivas de ações também na agricultura e na geração de renda nos municípios de Mâncio Lima e Marechal Thaumaturgo,” disse o governante na ocasião.

Outro ponto importante para os Puyanawa foi a inclusão da etnia indígena nas certidões de nascimento, realizando um sonho. Isso só foi possível por meio de uma ação integrada entre o Tribunal de Justiça do Acre (TJAC), a Defensoria Pública do Acre (DPE/AC) e o governo do Estado, por meio da Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos (SEASDH).

“Hoje, na nossa história, para o nosso povo, é um dia que vai ficar marcado para sempre. Hoje celebramos uma conquista, a realização de um sonho de a gente poder colocar o nosso nome étnico em nossos documentos. Acredito que hoje o nosso povo passa a incorporar melhor uma verdadeira cidadania”, disse Joel Puyanawa, cacique do povo indígena.

Gladson Cameli também tem investido para que a internet chegue até as aldeias. Para ele, investir na digitalização das escolas indígenas, é proporcionar que o acesso seja igualitário para todos os alunos da rede pública e também fortalece a divulgação da cultura tradicional em todo o estado.  

“O nosso compromisso com a educação é que todos os alunos da rede pública do Estado tenham acesso às mesmas ferramentas para o desenvolvimento escolar. Então, em um mundo digital, é preciso apostar nessas tecnologias a favor da educação. Desde o ano passado, criei a Secretaria Extraordinária dos Povos Indígenas justamente para avançarmos ainda mais nessas áreas, sendo uma pasta que acompanha de perto todas as questões relacionadas aos povos indígenas, mantendo o diálogo para cada vez mais alcançarmos essas comunidades, independente de logística e distância.”

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