Projeto com o grupo étnico kulina começou em 2008, como primeira iniciativa da unidade envolvendo populações indígenas
Os resultados parciais das pesquisas realizadas pelo projeto "Etnobiologia e Etnoecologia entre os Povos da Floresta, Acre: os Kulina (Madija) do Alto Rio Envira", executado pela Embrapa Acre, foram destaque durante o VIII Simpósio Brasileiro de Etnobiologia e Etnoecologia, em Recife, no período de 8 a 12 de novembro. O trabalho "Calendário agrícola e distribuição espacial de roçados indígenas", apresentado em forma de pôster e resumo, pela estagiária Paula Rosane Negreiros, acadêmica do curso de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Acre, conquistou o primeiro lugar na categoria "graduação".
Orientado pelo pesquisador da Embrapa Acre, Moacir Haverroth, líder do projeto, o trabalho premiado traça um retrato da agricultura em 10 aldeias kulina . Em linhas gerais, apresenta o número de roçados existentes nesses espaços, tamanho das áreas destinadas aos plantios, localização em relação às aldeias e espécies cultivadas.
O projeto com o grupo étnico kulina começou em 2008, como primeira iniciativa da Unidade envolvendo populações indígenas. Com o objetivo de sistematizar conhecimentos etnobotânicos de comunidades que habitam a região central do Acre e identificar a importância cultural e econômica de plantas medicinais com uso terapêutico, para estas populações, as pesquisas contemplam 11 aldeias integrantes de três Terras indígenas (Kulina do Rio Envira, Jaminawa-Envira e Kulina do Igarapé do Pau).
As expedições lideradas por Haverroth acontecem sempre no período das chuvas, para possibilitar o acesso às comunidades mais distantes, e duram até 40 dias. Paula Negreiros participou da segunda expedição, entre novembro e dezembro de 2009, ajudando no trabalho de coleta de amostras de plantas, mapeamento dos roçados e anotações de dados do material coletado, em português e na língua kulina.
A estudante agraciada com troféu, certificado de classificação e kits de livros na área de etnobotânica, diz que a premiação foi uma surpresa, apesar de se tratar de trabalho inédito no Acre. "Concorremos com trabalhos de diversos países e nesse contexto de tantas pesquisas, obter destaque é gratificante tanto do ponto de vista profissional como pessoal. Com certeza, esse resultado pode inspirar outras oportunidades e abrir novos caminhos no campo científico", afirma.
Conforme explica Haverroth, a pesquisa se divide em três etapas, iniciando com o levantamento etnobotânico, que identificou as espécies terapêuticas existentes nas aldeias. "A segunda fase contempla a agrobiodiversidade dos roçados kulina, destacando as plantas cultivadas pelos indígenas. Por último, identifica os cultivos em volta das casas e inclui ações de potencialização dessa atividade, com inserção de novas espécies adaptadas à realidade de clima e solo das aldeias", explica.
Com previsão de encerramento para janeiro de 2011, o projeto já catalogou mais de 200 tipos de plantas nativas e cultivadas nas aldeias, em sua maioria medicinal. De acordo com o trabalho apresentado no Simpósio, a composição dos roçados inclui 30 espécies agrícolas.
Reconhecimento público
Realizado pela Sociedade Brasileira de Etnobiologia e Etnoecologia (SBEE – www.etnobiologia.org.br) o Simpósio agregou outros dois eventos: o II Congresso Latinoamericano de Etnobiologia (II CLE) e o III Encontro Pernambucano de Etnobiologia e Etnoecologia (III EPEE). Profissionais de diversos países participaram do debate sobre como facilitar a articulação entre os conhecimentos das populações e promover o uso dos recursos naturais na América latina, entre outras questões relacionadas ao tema.
Haverroth também contribuiu com o evento participando das mesas redondas "Os desafios da pesquisa etnobotânica entre povos indígenas” e "Agricultura indígena e princípios agroflorestais". De acordo com o pesquisador, apesar da relevância para o País, o tema ainda é pouco investigado. "Há uma grande demanda por pesquisas e um volume enorme de conhecimentos a serem desvendados no campo da etinobiologia, especialmente com enfoque antropológico", afirma.
Na sua opinião, a premiação representa o reconhecimento público da importância do trabalho como levantamento científico. "Ao mesmo tempo é um indicativo da riqueza da agrobiodiversidade de áreas indígenas e da importância do tema, podendo contribuir para incentivar futuros investimentos em novos projetos nessa linha de atuação", enfatiza.