O protetor do Juruá

Aos 81 anos de idade, o maior desejo de Antonio de Paula "é que o meio ambiente seja respeitado"

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A contribuição de Antonio de Paula ajudou a consolidar a Reserva Extrativista do Alto Juruá (Foto: Secom)

"Seu Antônio" não conta conversa fiada quando o assunto é a preservação do modo de vida dos seringueiros, da floresta e dos rios. Antônio Francisco de Paula conta que conheceu o Juruá quando barcos com mais de 100 toneladas de borracha navegavam tranquilamente e não existia essa história de atravessar o rio a pé na época de baixa. "Hoje fazem até campo de futebol no leito", comenta, entristecido

O assoreamento é resultado da atividade humana, que não respeita as margens do rio. Coisas como essa não dão descanso ao pequeno homem de sorriso franco. Em 2006 ele fundou, junto com amigos, uma Ong pela defesa dos rios e igarapés do Juruá.

Aos 81 anos de idade, seu maior desejo "é que o meio ambiente seja respeitado". E classifica os seringueiros todos de ambientalistas. Esses são os ensinamentos que pretende deixar para os 13 filhos e mais de 30 netos. Além da trajetória marcante de luta pela mata e por sua população, seus amigos.

Ele veio para o Acre de navio até Manaus e depois pegou uma "gaiola" chamada Jurupari. A viagem terminou de canoa no seringal Alagoas, no Rio Tarauacá. "É como nascer de novo", de tão difícil que foi chegar.

Tudo era novidade para o recém-chegado cearense que não sabia nem remar, não tinha costume de caminhar na mata e aprendeu na marra a viver nas florestas do Acre. A prova de fogo durou quase dois anos, necessários para curar a primeira malária do imigrante.

Hoje, já transformado pelo tempo em "acreano do pé-rachado", é conhecido e respeitado por praticamente todos os produtores, ribeirinhos e extrativistas. E revela qual é seu maior patrimônio. "Ter amizade com todos é o meu maior tesouro."

"Ter amizade com todos é o meu maior tesouro." 

Batalha pela saúde – Ele trabalhou para o Conselho Nacional dos Seringueiros como ajudante dos cantineiros na contabilidade dos seus pequenos comércios. E aproveitou as barrancas dos rios para continuar exercendo a segunda função, atendendo até 30 pessoas por dia. Fez o curso de agente de saúde em 1982 e não parou mais.

A dedicação e perseverança renderam frutos nas áreas de saúde e ambiental. A ajuda do pequeno e resistente caboclo ajudou a consolidar a Reserva Extrativista do Alto Juruá. E o esforço pela saúde nunca foi deixado de lado. Durante os anos conseguiu importantes parcerias para projetos desenvolvidos na comunidade.

Entre os parceiros estão a Fundação Saúde Sem Limites, de Londres, e a Fundação MacCarthy, sediada em Chicago (EUA), que financiou por anos o projeto Vida e Saúde da Associação de Seringueiros do Juruá.

Ativismo sempre – Colocou os pés pela primeira vez em um sindicato em 1978 pra resolver uma pendenga com os patrões do seringal. Daí em diante não tomou gosto pela luta ao lado dos companheiros de cabrita, a ferramenta de cortar seringa.

Tantos anos de luta pela defesa do modo de vida dos seringueiros e conservação da floresta incluíram várias viagens. As com destino a Brasília já passam do controle das contas. "Seu Antônio" estava lá em março de 1997, na linha de frente da Marcha dos Seringueiros, com a ministra Marina Silva.

Esteve em audiência com o então presidente Fernando Henrique Cardoso, junto com companheiros acreanos, quando conseguiram subsídio para a borracha através do programa Amazônia Solidária. Esse fato promoveu a manutenção de muitos seringueiros na mata e a melhoria de vida deles por meio de um preço mais justo para a borracha.

Esteve também em Nova York, em setembro de 1996, na torre 1 dos prédios que seriam destruídos cinco anos depois. A ocasião era a 7˚ Semana da Amazônia. E em abril de 2001 foi convidado para participar do Programa do Jô, a quem classificou de "brincalhão e gentil, mas muito perguntador".

E não pára por aí. Aos 79 anos, junto com mais 38 companheiros, Antônio funda a Ong Amigos das Águas do Juruá, com objetivo óbvio, mas não simples, de salvar os igarapés e rios da região. A Ong já está planejando o reflorestamento das matas ciliares do igarapé Canela Fina e segue fiscalizando os rios e conscientizando a população. Como ele diz, "a batalha continua".

 

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