“O inferno são os outros” da pandemia

Os meses de isolamento e distanciamento social evidenciaram uma das maiores fragilidades humanas: o convívio com o outro.

A clássica frase “O inferno são os outros”, de  Jean-Paul Sartre, dá conta de que, para sermos quem somos, devemos nos reconhecer, nos enxergar, e por necessidade básica, conviver com o próximo.

Ora, logo quem tanto reclamava dos lugares cheios de gente, do soar das vozes, aqueles ditos antissociais, nesse momento, em que o ir e vir não é livremente possível, sentem falta do contato, pois somos seres sociais. 

Precisamos olhar nos olhos, tocar, abraçar, conversar e testemunhar os lábios se moverem, para não nos sentirmos sós, ou para não abafar as vozes do inconsciente.

Em uma cena da obra de Sartre, Estelle, uma das personagens, em um lapso de necessidade banal, quer olhar-se em um espelho. Porém, não sendo possível, vê-se pelos olhos de Inês – a colega foi o espelho, de aprovação.

Precisamos do outro para enfrentar os nossos próprios medos. E quando isso não é possível, em quê nos agarraremos? O que fazer quando nossas fraquezas são postas contra a parede? No que confiar? Precisamos confiar em algo para não sucumbir?

O novo coronavírus, entre tantas outras questões, obriga-nos a ter um olhar diferente sobre a vida, sobre a nossa maneira de viver e de ser, principalmente em relação aos outros, enxergando seu papel fundamental em nossa vida.

Em tempos de pandemia, o egoísmo mata e o uso irracional das ferramentas tecnológicas também. Mais do que nunca, o outro se faz necessário para a nossa sobrevivência. Não que precisemos estar em contato constante, mas o cuidado também se faz a distância. É quando separamos a necessidade social do sentimento.

Eu não sei no que a maioria acredita, ou, que credo ou religião professa, se tem… Mas, desde os tempos antigos em que deuses eram cultuados, o ser humano tem a necessidade de agarrar-se a algo, a confiar em uma força oculta maior, para não sucumbir à escuridão dos monólogos interiores. Sabe aquela luz no fim do túnel? Então, é ela que devemos observar.

É necessário, ainda, acreditar em si e aceitar o processo da vida, o viver e morrer, pois, como diziam os antigos, “ninguém vai ficar para semente”, por isso, desapegar da matéria e viver o sentimento em plenitude alivia a carga psíquica e torna as vozes do inconsciente nossas amigas.

Taís Nascimento é jornalista da Secretaria de Estado de Saúde.

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