“O CD não pode ser a finalidade, não pode morrer aí. O músico precisa circular. A gente fala sobre chegar em outros estados, mas o nosso próprio Estado não conhece a sua produção”. Essa é uma reflexão de Jussara Almeida, coordenadora de educação integral da Escola Barão dos Solimões, que foi externada durante o Juntos Amazônia, realizado de 5 a 8 de junho, em Porto Velho.
A ação foi organizada pelo Fora do Eixo (FdE) com a presença de artistas, produtores, coletivos e pontos de cultura do Acre, Amazônia, Roraima, Rondônia e Venezuela. A programação gerou shows musicais e intervenções de teatro, debates, seminários e mesas redondas sobre diversos assuntos, como a economia solidária, integração entre Brasil e Venezuela, a nova cara da cultura brasileira e alternativas para a autogestão de carreira.
Para entender melhor, o FdE é uma rede de comunicação entre os coletivos por onde circulam as bandas que, em apenas em seis anos, passou de quatro para mais de 120 filiados. As reuniões e trocas de conhecimento acontecem, geralmente, por meio das ferramentas disponíveis na internet. O Juntos Amazônia foi o encontro presencial, uma forma de juntar esses gestores para propor atividades conjuntas que promovam, em especial, a produção da região norte.
A fórmula não é nova, o artista continua tentando promover o trabalho que faz. A diferença é em relação ao pensamento. A mudança de pensamento de que o mercado das gravadores é algo quase que utópico, difícil. Sem procurar crescer e vender o próprio peixe, o mais provável é morrer na praia. Ou se trabalha e encara uma maneira de buscar a sua forma de autogestão ou é esperar outro mercado se estabelecer para que as coisas mudem.
Os coletivos de cultura entenderam isso e atuam com um modus operandi de guerrilha, fazendo a circulação das bandas e auxiliando também na construção de políticas públicas. É preciso ocupar espaços no governo, como nas câmaras temáticas e nos conselhos de cultura. “É a cara da nova cultura brasileira que procura se fazer ouvir, ter voz, e ter cada vez mais visibilidade no país por meio de políticas que realmente contemplem a comunidade e os artistas”, comenta Karla Martins, gestora do Coletivo Catraia (AC).
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Outra alternativa seria a implantação de microrrotas para escoar a produção e estimular os músicos. “Esse encontro serve pra selar de vez o intercâmbio entre as cidades do norte”, disse Caio Mota, representante da Casa Fora do Eixo do Amazonas. A rota já é utilizada por algumas bandas e possibilita a realização de mini turnês entre os Estados do Acre, Rondônia, Roraima, Amazonas, Pará e Amapá.
Mas alguns ainda conseguem chegar mais longe, como a banda Caldo de Piaba que passou por Alagoas, Bahia, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte, em 2010, com a turnê “Caldo da Peste, Piaba no Nordeste”. Eles bancaram as passagens e os coletivos de cultura da cidade de destino entraram com a organização do evento, hospedagem, alimentação e o translado. “A rede é uma tecnologia social que possibilita chegar mais longe e ter contato com mais pessoas”, disse o músico e produtor cultural Rafael Bode, do Coletivo Caos (RO).
Coletivos e Pontos de Cultura – a utilização da troca de serviços dos coletivos com a iniciativa privada despertou a atenção dos representantes dos pontos de cultura do Acre. Em Cuiabá (MT), o Espaço Cubo estabeleceu esse tipo de relação com diversas empresas. Eles conseguiam os recursos que precisavam para a realização de projetos e eventos e, em contrapartida, também ofereciam algum tipo de serviço, a chamada economia solidária. O resultado foi a criação do Cubo Card, uma moeda social.
Para Derivaldo Albuquerque, um dos coordenadores dos Pontos de Cultura do Acre pela Fundação Elias Mansour (FEM), a próxima tarefa será aplicar, no Estado, as experiências aprendidas e até mesmo trabalhar em parceria com os coletivos de cultura. “Agora a nossa ideia é visitar todos os pontos, fazer um diagnóstico situacional e traçar um comparativo. É preciso entender melhor a funcionalidade de cada um e ver como podemos trabalhar com a ideia de trocas para fortalecer a prática de cada projeto”, explicou.
Projetos como o do professor Sérgio Aragão, responsável pelo Ponto de Cultura da Associação de Moradores do Bairro Bento Marques, em Tarauacá, que envolve a comunidade nas mais diversas manifestações da arte. “Esse intercâmbio colabora para novas ações num processo em rede que pode se tornar infinito. O importante é acrescentar, fazer com que as pessoas se sintam incluídas e ter a possibilidade de criar um ambiente melhor para todos”, comenta.
Integração – o venezuelano River Maduro, representante do Coletivo Terapaima Vive, participou do Juntos Amazônia para promover um diálogo entre os dois países. Ele apresentou o seu trabalho, teve acesso a lógica dos coletivos brasileiros e sinalizou interesse de se tornar um colaborador da rede. “É uma luta coletiva e não individual. Juntos somos mais fortes”.
E é com essa mesma força que o FdE deve chegar nesta quarta-feira, 13, para a abertura da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20. De que forma será essa participação? “Intensa, acompanhando discussões, realizando coberturas colaborativas e fortalecendo nossas conexões. Serão, aproximadamente, 200 agentes Fora do Eixo de todo o país presentes no evento”, conclui Karla Martins.