No Brasil, os povos indígenas souberam, apesar das perseguições e do genocídio a que foram expostos, herdar e passar adiante tradições artísticas, religiosas e culturais que ajudaram a definir a identidade de nosso povo. Esta identidade influenciou, em grande parte, o entendimento que temos de nossa realidade, uma vez que os processos culturais operam de modo a se apropriar de experiências acumuladas por gerações incontáveis, havendo uma história de lutas pela determinação de suas metas e valores, que acabam influenciando as normas, a educação e a própria organização social.
Em apenas 500 anos de história brasileira, 40 mil anos de evolução deram origem a mais de 990 povos, dos quais restaram menos de 220, sendo que dos 6 milhões de índios que habitavam o Brasil na época da colonização, existe hoje somente 350 mil.
No caso do Acre, houve integração notória de hábitos de populações indígenas e de origem nordestina, mesmo com a ocorrência de conflitos e a expropriação de suas terras. Dos índios herdamos alimentos, instrumentos musicais, práticas religiosas (o uso ritual da Ayahuaska), vocábulos e expressões, além de técnicas e o emprego de extratos vegetais e animais (como a vacina Kampô), passíveis de se tornarem alvo de pesquisas para as indústrias farmacêutica e cosmética, com possibilidade de futuramente gerar divisas para o estado. A influência cultural indígena acreana – material e imaterial – também é notada no restante do país e no mundo, favorecendo novas modalidades de turismo e geração de empregos.
A lei que garante o direito dos índios deve funcionar como um mecanismo que vai além da proteção da pessoa humana e da demarcação de terras, devendo ser encarada como um dos principais mecanismos pelo qual manteremos nossa identidade nacional singular.
A terra, no que diz respeito aos índios, vai além do seu aspecto meramente patrimonial. Ela se apresenta como condição de existência, a vida desses povos, sendo o território uma condição inconfundível com a sociedade que os envolve. Assim, a questão da terra se transforma no ponto central dos direitos constitucionais dos índios, pois, para eles, ela tem valor de sobrevivência física e cultural.
Não se ampararão seus direitos se não se lhes assegurar a posse permanente e a riqueza das terras por eles tradicionalmente ocupadas. Pois, a disputa dessas terras e de sua riqueza, como lembra a antropóloga Manuela Carneiro da Cunha, constitui o núcleo da questão indígena no Brasil de hoje.
Os povos Indígenas do Acre e o Etnozonemaneto
No Estado do Acre vivem 15 povos indígenas, constituindo uma população de 18,3 mil pessoas falantes dos troncos linguísticos Pano, Arawak e Arawa, contando com pouco mais de 210 aldeias, envolvendo 2% da população acreana e 6% da população florestal. Outros três povos, considerados “isolados”, tem população estimada em 600 indígenas pela Fundação Nacional do Índio (Funai). Há ainda considerável população indígena urbanizada, em sua maior parte residindo em Rio Branco, mas também em outras sedes municipais.
Parte do patrimônio da União Federal, com usufruto exclusivo destinado aos índios, as 36 terras indígenas, somadas às unidades de conservação federais e estaduais, somam pouco mais de 7,8 milhões de hectares, ou aproximadamente 46% da extensão total do Acre, conformando, em sua maior parte, um mosaico de áreas protegidas distribuídas ao longo da fronteira com Peru e suas adjacências.
Foto 04: O etnozoneamento das terras indígenas passou a constituir a principal diretriz das políticas públicas direcionadas a estes povos.
Como resultado dos estudos das duas fases do Zoneamento Ecológico Econômico do Estado, e dos primeiros diálogos mantidos com as associações indígenas, o etnozoneamento das terras indígenas passou a constituir a principal diretriz das políticas públicas direcionadas a estes povos. É instrumento de diagnóstico e visualização cartográfica dos usos dos recursos naturais servindo, inclusive, para elaboração dos Planos de Gestão das terras indígenas (PGTIs).
A partir de 2001, o governo estadual concentrou suas ações em terras indígenas sob influência do asfaltamento das BRs 364 e 317. Acordadas em diálogos e negociações entre lideranças, organizações indígenas e órgãos dos governos estadual e federal, durante a revisão dos componentes indígenas dos EIA-RIMAs (estudos de impacto ambiental) dessas rodovias, várias ações emergenciais, e depois programas, a título de mitigação e compensação, começaram a ser implementados, como parte do “Programa Integrado de Desenvolvimento Sustentável do Estado do Acre”, financiado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
A política de gestão territorial, com base no etnozoneamento e nos planos de gestão das terras indígenas, ganhou renovado arranjo institucional a partir de 2010, no âmbito do ProAcre (Programa de Inclusão Social e Desenvolvimento Econômico Sustentável do Acre). Desde então, no Governo Tião Viana, sob a coordenação da Sema, foram feitos o etnozoneamento e a construção dos planos de gestão de outras seis terras indígenas, somando um total de 26 TIs com processos concluídos. Ações estão em curso em outras quatro terras, por meio de parceria firmada pela Sema com a Comissão Pró-Índio do Acre.
{xtypo_rounded2}Os Planos de Gestão em Terras Indígenas
Os PGTIs visam o planejamento e definição de estratégias coletivas para a gestão territorial, vigilância dos seus limites e a construção de projetos produtivos, por meio de parcerias com as associações indígenas. Da priorização das ações dos planos de gestão com as associações indígenas, resultou a assinatura de 18 convênios para custear essas ações, com investimentos que somam R$ 3,9 milhões, oriundos do ProAcre. Outros três convênios, que somam R$ 310 mil, permitirão a execução dos planos de gestão de outras cinco terras indígenas ainda em 2013.{/xtypo_rounded2}
Os Agentes Agroflorestais Indígenas
No esforço de oferecer uma assistência técnica diferenciada, investimentos têm sido feitos na remuneração dos serviços de um conjunto de 72 agentes agroflorestais indígenas, hoje com recursos do Proacre. Os agroflorestais são uma categoria surgida em 1996, como resultado de processos de capacitação oferecidos pela CPI-Acre, e desde 2002 estão organizados na AMAAIAC (Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais do Acre).
Reconhecendo a importância dos seus serviços e as históricas demandas dos agentes, em fevereiro, o governador Tião Viana assinou decreto que constituiu uma comissão interinstitucional com o objetivo de definir mecanismos para a valorização dessa categoria profissional, a continuidade de sua formação técnica e a remuneração dos seus serviços.
Ainda como parte das ações de gestão territorial, a Semadeu início, em 2012, às ações do Projeto “Proteção Florestal em Terras Indígenas”. Por meio de parcerias com as associações indígenas e da sociedade civil e com a Funai, o projeto tem por objetivo promover oficinas de vigilância e fiscalização das terras indígenas, e da legislação pertinente, junto com a distribuição de equipamentos (barcos motorizados, gps, câmaras e rádios móveis) para o fortalecimento das ações de vigilância dos limites das terras feitas por agentes agroflorestais e as lideranças.
Prevê ainda, em parceria com a Funai, apoio á aviventação dos limites de quatro terras indígenas demarcadas há quase duas décadas, que hoje sofrem pressões de invasores. O projeto conta com investimentos de R$ 2,1 milhões, oriundos do Fundo Amazônia, via BNDES, e trará benefícios para 17 terras indígenas.
Perspectivas
É perspectiva do governo Tião Viana, até 2014, a conclusão das ações de etnozoneamento e de implementação dos planos de gestão de todas as terras indígenas no Acre, além de dar início à atualização dos planos, com novos investimentos. Para isto, estão assegurados, nos próximos seis anos, recursos de R$ 9,6 milhões, parte do Proser (Programa de Saneamento Ambiental e Inclusão Socioeconômica do Acre), também do Banco Mundial.
O caráter inovador da política de gestão territorial delineado no Acre serviu de inspiração para as discussões que nos últimos três anos resultaram na criação da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI), fruto de amplo diálogo realizado entre a Funai e o MMA com organizações indígenas das várias regiões brasileiras. As ações que integram a política acreana de gestão também constituíram, junto com o Plano Plurianual da Funai (2008-2011), nos alicerces do Termo de Cooperação assinado em 2008 pelo órgão federal e o governo do Estado, hoje em fase de atualização.