“O Pacto Federativo é injusto. Os pequenos precisam se defender, por isso os Estados fazem guerra fiscal.” A fala do governador de Mato Grosso do Sul, André Puccinelli, foi compartilhada pelos governadores de Mato Grosso, Silval Barbosa, e do Acre, Tião Viana. Eles debateram a crise federativa na manhã de sábado, 1, no II Congresso Internacional de Direito Constitucional, realizado em Cuiabá.
Na mesa-redonda “Federação, distribuição das competências constitucionais e limites orçamentários: qual pacto federativo?”, os três governadores falaram sobre a distribuição do bolo tributário, juntamente com o senador Pedro Taques e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes.
A principal reclamação dos governos estaduais é a distribuição do bolo tributário pela União. Segundo eles, os repasses para Estados e municípios diminuem gradativamente, o que tem causado dificuldades de gestão e o aumento consistente das dívidas.
“Os Estados estão cada vez mais enfraquecidos. A retração do Produto Interno Bruto (PIB) é muito preocupante. O desafio do século XXI é o experimentalismo, ou seja, é preciso que haja cooperação entre municípios, Estados e União, mas se isso não é possível nem no orçamento imagina na prática”, relatou o governador Tião Viana.
O governador de Mato Grosso, Silval Barbosa, corroborou com a posição. “Existe uma grande dificuldade entre os Estados quando se fala em Pacto Federativo. A economia está aquecida e o Estado, sem capacidade de acompanhar em desenvolvimento e infraestrutura”, disse.
O senador Pedro Taques traçou um retrospecto e afirmou que o tema é recorrente na história do Direito Constitucional. Segundo ele, quatro itens merecem atenção quando se discute o Pacto Federativo atual: renegociação de dívidas por parte dos Estados, guerra fiscal, distribuição dos royalties de petróleo e Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). “Essa discussão não pode ser feita de forma fatiada, deve ser debatida como um todo. Se não for feito dessa forma, não resolveremos. A questão não é apenas numérica”, frisou.
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, disse que o assunto é delicado, pois causa impasses e incompreensões entre os Estados, e afirmou que o tema já faz parte da agenda do STF. “O equilíbrio federativo entrou na pauta nacional em 2011, quando pela primeira vez se discutiu com ênfase e sinceridade a chamada crise federativa”, disse.
Distribuição do bolo tributário
A principal questão debatida pelos membros da mesa-redonda é a interferência da União na distribuição do bolo tributário. Segundo eles, a União aumenta a arrecadação de impostos não compartilhados com Estados e municípios e cria políticas tributárias diferenciadas para impostos compartilhados, como Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e Imposto de Renda (IR), que acabam por prejudicar o “caixa” destes.
Um exemplo é a recente redução do IPI, que não reflete na arrecadação do governo federal, mas no estadual. “A União quer concentrar poder, e os Estados voltam a ter déficits mensais”, afirmou Puccinelli.
O repasse do ICMS arrecadado com vendas pela internet também entrou na pauta. As gestões estaduais vêm há muito tempo tentando distribuir de forma igualitária o montante para o Estado de venda e o Estado que recebe o produto. Mas há a concentração do ICMS apenas para a localidade que vende, os “pequenos” têm perdido poder.
Outros assuntos como ressarcimento da Lei Kandir, Fundo de Participação dos Estados (FPE) e a Emenda Constitucional 29 também entraram em debate. O senador Pedro Taques lembrou que é preciso pensar na qualidade dos gastos públicos com os royalties de petróleo. “Não podemos gastar um recurso que é finito com o presente, é preciso pensar nas gerações futuras.” Para o senador, a guerra fiscal não vai resolver problemas estruturais, só pontuais.
Tião Viana reforçou que a falta de definição do Congresso Nacional sobre o Pacto Federativo impossibilita a contrapartida dos Estados. “A guerra fiscal não é regulada, não definida em termos de competências. Nós, do Executivo, pagamos o preço devido à falta de repostas. Não vemos como sair disso sem diálogo”, afirmou.
Puccinelli pediu que a “mamãe” da federação [União] olhe mais para os “filhos”. “Alguns Estados estão gordos, os outros estão desnutridos, minguando.” Silval Barbosa finalizou com um apelo para que a matéria seja tratada como prioridade nos meses que restam para fechar 2012. “Estamos sendo penalizados”, finalizou.