Equipes da Secretaria de Desenvolvimento Social (Seds) e da Fundação Nacional Índio (Funai) estão realizando, por toda esta semana, um trabalho de capacitação para lideranças indígenas e técnicos de secretarias municipais de Assistência Social na Aldeia Barão, Terra Indígena Puyanawa, em Mâncio Lima.
Segundo o secretário de Desenvolvimento Social, Antônio Torres, o objetivo é capacitar as lideranças indígenas e gestores ante os programas do Ministério do Desenvolvimento Social que são executados através da Seds e de secretarias municipais. Também fazem parte da capacitação temas como segurança alimentar e especialmente os direitos da mulher, o que atraiu muitas mulheres indígenas ao encontro.
Participam da capacitação representantes de aldeias indígenas dos povos Puyanawa, Ashaninka, Huni Kuin, Katuquina, Arara e Nukini, de Cruzeiro do Sul, Mâncio Lima, Rodrigues Alves, Jordão, Tarauacá, Marechal Thaumaturgo e Santa Rosa do Purus. Os municípios citados, com exceção de Cruzeiro do Sul, enviaram representantes das secretarias municipais.
“É importante esse trabalho de orientação, porque os programas de governo tendem a se adaptar às realidades, principalmente com a realidade das comunidades indígenas. Algumas aldeias ficam próximas dos centros urbanos e, para elas, é mais fácil ter acesso aos serviços, mas para as comunidades mais distantes esse acesso é mais limitado”, disse Torres.
Bolsa Família: impactos sobre a organização nas aldeias
Joel Puyanawa é líder em sua aldeia, além de vereador por Mâncio Lima. Ele ficou satisfeito com a promoção do encontro: “Gosto de ver a comunidade sendo esclarecida sobre seus direitos, pois me fortalece como liderança. Uma coisa é eu falar e outra é ter uma oficina que esclarece como funcionam os programas”, disse. No entanto, faz uma ressalva: “Como liderança, a gente apoia os programas como o Bolsa Família, desde que seja entendido no sentido de uma complementação à nossa agricultura, à nossa sobrevivência, e não para substituir nosso trabalho e nossa cultura”.
Conta Joel que sua aldeia tem uma população de 568 habitantes e a principal atividade econômica é a fabricação de farinha. Também há atividades com outras culturas agrícolas, como feijão, arroz e frutas, mas só para consumo interno.
O coordenador regional da Funai, Luis Valdenir Silva de Souza, um índio Nukini, acha importantes as discussões sobre os programas sociais, tendo em vista que os programas muitas vezes são padronizados e não condizem com a realidade dos povos indígenas, que têm outro sistema de organização. “Há necessidade desse diálogo, de entendimento e da necessidade de flexibilidade nos programas, além da preparação das pessoas que estão nos municípios para lidar com os povos indígenas.”
Para ele, a Funai, como instância do governo à qual compete a promoção dos direitos indígenas, interessa fortalecer esse espaço de discussões e torná-lo mais frequente.
Sobre o Bolsa-Família, ele analisa que pode significar um benefício, mas também pode trazer prejuízo, por isso importa refletir sobre a viabilidade dele em relação a alguns povos indígenas. “Para uns, que têm fácil acesso, é viável, mas para os de difícil acesso eles podem estar se precipitando e até se endividando.” Não vale a pena sair de uma aldeia distante para receber o Bolsa Família, pois, além de a despesa com a viagem às vezes ser superior ao valor do benefício. fica ainda o prejuízo do abandono da atividade normal da aldeia e do trabalho agrícola, segundo explicou o coordenador da Funai.
Direitos das mulheres
As mulheres indígenas, maioria dos participantes do curso, cada vez mais se conscientizam de seus direitos como cidadãs brasileiras e dentro de suas aldeias no relacionamento com seus maridos. Maria Liberdade da Silva Kaxinauá (Ranê) é coordenadora da Organização de Mulheres da Aldeia do Igarapé do Caucho, em Tarauacá. Ela se disse muito feliz de ter vindo pela primeira vez à aldeia Puyanawa e tomar conhecimento dos direitos das mulheres.
“Fico grata por levar as informações para minha comunidade sobre os direitos das mulheres em relação à violência. Na minha aldeia também existe esse tipo de violência, mas tem muitas mulheres que são capazes de discutir seus direitos”, disse.
Maria Liberdade conta que sua aldeia, localizada às margens do Rio Muru, tem cerca de 500 habitantes. “Estou feliz em levar essas informações para meu município e minha terra indígena. Mas também posso firmar parceria com aldeias mais isoladas, como a Aldeia Humaitá, que não enviou representantes e passar essas informações.”
Alexandrina Pianko é índia da etnia Ashaninka. Para ela, os direitos das mulheres são iguais, não importa se é índia ou não. Sobre os programas sociais do governo federal, ela considera que é bom o fato de os índios estarem incluídos neles, mas é preciso avaliar a maneira como eles chegam às aldeias, em que podem ser úteis para as famílias e estudar a melhor maneira de conduzir esses programas dentro das comunidades indígenas.
Sobre a violência contra a mulher, ela reflete que a violência existe também dentro das aldeias, embora em graus diferentes, dependendo da cultura ou mesmo da aldeia. “Os povos indígenas têm seu próprio modo de vida, cada um com seus costumes. No povo Ashaninka não há essa violência de matar, de maltratar.”