Iniciado em 2008, como turma especial, o Curso de Formação de Docentes Indígenas, na Universidade Federal do Acre (Ufac-Floresta), em Cruzeiro do Sul, está realizando a banca que analisa os trabalhos de conclusão de curso (TCC) dos 52 formandos. A banca é formada pelo professor-doutor Leonardo Lessin, professor-mestre Marcos de Almeida Matos e professora doutora Andréa Martini, vice-coordenadora do curso, e já analisou quatro TCCs. Hoje ainda será apresentado um trabalho. Ocorre então um recesso, e em meados de fevereiro continua a apresentação dos demais.
Com a conclusão do curso, os índios receberão a licenciatura em Docência para Indígenas. Todos optaram por uma de três áreas: Ciências Sociais e Humanidades, Ciências da Natureza ou Artes e Linguagem. Os participantes têm formação pedagógica completa e, a partir do quarto semestre, escolhem uma área de atuação de acordo com o interesse de pesquisa ou como professores. A maior parte deles já trabalha nas aldeias.
Os índios formandos são de 12 etnias: ashaninka, kaxinawá (huni kuin), jaminawa, yawanawá, manchineri, marubo, nukini, nawa, puyanawa, shawandawa e katuquina e shanenawa.
Tuikuru e o povo yawanawá
A índia Edna Luiza Alves Yawanawa mora na aldeia Mutum, situada na Terra Indígena Yawanawá do Rio Gregório e apresentou TCC abordando a vida de seu avô, Raimundo Luís Tuikuru Yawanawa, líder indígena, falecido em dezembro de 2010. Segundo Edna, seu TCC presta homenagem ao grande líder indígena: “Vai fazer, agora em dezembro, dois anos que ele morreu. Para mim é uma forma de apresentar para as pessoas quem ele era, o que ele fez, que legado deixou para nosso povo Yawanawa e também para o povo indígena do Acre. Exemplo de liderança, ele lutou para conquistar a demarcação da terra e foi quem teve os primeiros contatos com os patrões”.
Tuikuru deixou uma história longa para ser contada; para Edna seu TCC é só um início da pesquisa que ela pretende, na condição de neta mais velha, realizar. O objetivo é junto com os filhos de Tuikuru escrever um livro. “Ele preferia ser chamado de professor e não de pajé. Ele tinha muita sabedoria, não só na parte espiritual, mas tinha um conhecimento amplo das coisas, de tudo um pouco”.
A pesquisa levou quatro anos para ser feita. Edna fez ampla pesquisa entre índios mais velhos e ainda estudos sobre a geografia e aspectos ambientais e culturais da terra Yawanawá, bem como seus costumes. Ela tem 34 anos, é casada e tem quatro filhas. A mais nova, Nêtê, tem apenas seis meses e muitas vezes esteve junto com a mãe em sala de aula. “Mas nunca incomodou ninguém, ficava sempre quietinha”, garante sua mãe.
Biblioteca viva
Os yawanawá, ou, traduzindo, “povo da queixada”, desde tempos imemoriais ocupam as cabeceiras do Rio Gregório, afluente do rio Juruá, atualmente pertencente ao município de Tarauacá. Eles falam uma das línguas pertencentes ao tronco linguístico pano. A população atual é de 830 habitantes, espalhados por oito aldeias: Nova Esperança, Mutum, Escondido, Tibúrcio, Yawarani, Sete Estrelas, Matrinchã e Amparo. Atualmente, o Festival Yawá é o acontecimento mais importante desse povo indígena durante o ano. Em outubro, foi realizada a décima primeira edição do festival que atrai turistas do Brasil e do mundo, além de ser um momento de confraternização entre índios de várias etnias.
Tuikuru nasceu em 22 de maio de 1929, no Seringal Kaxinawá, no local em que hoje se situa a Aldeia Sagrada. Ali seu corpo foi enterrado e também o de seu pai, o patriarca Yawanawá Antônio Luís. Nos últimos 25 anos, Tuikuru estabeleceu moradia fixa na aldeia Mutum, onde abriu e zelou um grande roçado de plantas medicinais e dedicou-se à produção de artesanato como chapéus, bordunas, lanças, arco e flecha. Ele faleceu em Tarauacá, aos 86 anos de idade.
Segundo Edna, “foi-se uma biblioteca viva da floresta. Agora é registrar e manter sua memória”.