Determinação para sobreviver e abnegação para ensinar tornam professora do Estado exemplo para alunos de escola rural

Esta é a história da professora Amanda Maria Rufino da Silva. O relato de uma vida dedicada à educação, quase interrompida por um tropeço no destino da humanidade, que ceifou mais de 700 mil vidas brasileiras. Amanda é também mãe de Maria Isa, nascida no momento mais sombrio da história recente. Como a mãe, ela também é uma sobrevivente da pandemia de covid-19.

Professora Amanda Maria em ensaio fotográfico antes de contrair a covid-19: lição de fé e coragem para sobreviver e continuar lecionando em escola rural de Rio Branco. Foto: acervo pessoal

Em coma induzido, mãe intubada e filha no ventre foram encapsuladas no mundo do nada. Do inconsciente. Do vazio. À mercê das decisões médicas duvidosas diante de uma enfermidade até então desconhecida da ciência.

Amanda, Maria Isa e o marido Ismari, na celebração de um ano da filha. Foto: acervo pessoal

Impossível aos olhos humanos ambas vingarem. Aos olhos humanos. Não aos de Deus. Prevaleceram os últimos: as pupilas sagradas. Olhos soberanos, amorosos e oniscientes lançaram misericórdia sobre Amanda Maria e Maria Isa. “Resposta das milhares de preces que subiam, todos os dias, em direção ao Altíssimo”, acredita a professora.

Uma vida devotada ao ensino: Amanda posa para foto com parte dos seus alunos na Escola Rural Wilson Pinheiro. Foto: Mardilson Gomes/SEE

Às vésperas de o Brasil celebrar mais um Dia dos Professores na próxima terça-feira, 15, o exemplo de determinação para sobreviver e de abnegação para ensinar torna Amanda especial junto aos demais mestres, servidores técnico-administrativos e, principalmente, entre os estudantes da Escola de Ensino Fundamental Wilson Pinheiro, localizada no polo de assentamento de mesmo nome, na região da Estrada Transacreana, em Rio Branco.

Mérito de todos os servidores e estudantes, a instituição recebeu melhor nota do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) entre as escolas rurais de todo o estado: 5,6 nos anos iniciais, que vão do 5º ao 9º ano, e 6,0 nos finais, do 1º ao 3º ano do ensino médio. O Ideb mede a qualidade do ensino nas escolas públicas no país.

Estudantes da Escola Wilson Pinheiro, na Estrada Transacreana, participam de aula com a professora Amanda Maria. Foto: Mardilson Gomes/SEE

Professora de Biologia, ao fim de 2024 Amanda completará uma década na profissão. “Ensinar todos os dias é um exercício de doação e de desprendimento. É quando tento ofertar o meu melhor. Sabe, ser professor não é só transmitir conhecimentos científicos. É também compartilhar algo que está além do programado didaticamente. Algo que está na vida de cada aluno e na nossa também, que é o amor. É enxergar o potencial humano de cada criança e adolescente e guiá-lo a uma jornada plena de conquistas em todas as áreas da sua vida”, reflete.

Amanda em classse: “Ser professor não é só transmitir conhecimentos científicos, é enxergar o potencial humano de cada criança e adolescente”. Foto: Mardilson Gomes/SEE

E, se a vida é feita de compartilhamentos, Amanda diz que seu “coração exala altos níveis de gratidão” quando vê, por exemplo, a jovem Gabriela Brígido da Silva, de apenas 22 anos, há dois tendo concluído a faculdade de matemática, lecionando na mesma escola em que um dia sentou no banco escolar.

Professora de matemática Gabriela Brígido da Silva pertence à nova geração de educadores da Escola Wilson Pinheiro, onde já foi aluna. Foto: Mardilson Gomes/SEE

A professora Gabriela é, por assim dizer, uma garota-prodígio. Nasceu na comunidade local, estudou por toda a vida em escolas rurais e, ao terminar seus estudos universitários, voltou às origens. “Hoje possuo duas graduações e tenho muito orgulho de contribuir com o que adquiri na jornada da licenciatura em matemática com meus alunos, que também são do ensino rural como eu fui um dia”, diz, fitando os olhos de Amanda, sua colega de profissão.

Professora Amanda Maria com criança no cantinho da leitura; educadora é exemplo de determinação para viver. Foto: acervo pessoal

Sete dias desacordada em um leito de UTI e o nome inspirador: Maria

“Na UTI do Pronto-Socorro, passei quatro dias em coma. Foram sete dias totalmente desacordada, sendo os três primeiros no Hospital Santa Juliana. Quando retomei a consciência, meu primeiro gesto foi pedir que retirassem aquele tubo da minha garganta. Pedi um papel e uma caneta, mas não conseguia escrever. As letras eram ilegíveis e não me recordo do que tentava dizer”, relata.

Amanda e Maria Isa em ensaio fotográfico: milagre da vida após coma de sete dias em UTI. Foto: acervo pessoal

E continua: “Por muito tempo, fiquei na máscara de oxigênio. Então, percorri as mãos sobre a barriga, para sentir minha filha. Foi quando, num momento desses, veio um nome na minha mente: Maria. A Maria mãe de Deus, a Maria que carregou no seu ventre o Salvador. Então lhe disse: ‘Você será Maria, por minha doação à Maria, mãe de Jesus. Maria Isa será o seu nome. O curioso é que, sem saber, meu esposo e minha sogra já tinham consagrado o nome de nossa filha a Maria. Recebi a notícia por uma ligação no celular da enfermeira, que me deixou falar com a família. Como Deus sabe de todas as coisas”.

Menina Maria Isa continua crescendo saudavelmente, aos cuidados da mãe e do pai. Foto: acervo pessoal

No leito do Pronto-Socorro, já em restabelecimento, os médicos expressavam espanto com sua recuperação rápida. Eles entendiam que foi muito acelerada e se surpreendiam com sua força de vontade para sobreviver.

Uma enfermeira a reconheceu: “Você é a Amanda Maria; eu te conheço do Facebook”. Amanda relata a importância do acolhimento naquela fase: “Amei o quanto ela foi gentil comigo. Quando recebi alta do Pronto-Socorro e voltei para o Santa Juliana foi que eu tive a noção do tamanho da bondade das pessoas comigo. Do tamanho da corrente de orações que fizeram por mim e por minha filha”.

Mãe e filha: campeãs em um cenário avassalador para a humanidade, hoje vivem em paz e harmonia. Foto: acervo pessoal

“A força que eu tive por todos esses momentos de aflição veio de Deus, por meio das orações em meu favor. Foram pastores, padres, missionários, profetas e muitas pessoas humildes. Muitos que eu nem conhecia pessoalmente. Até hoje também tenho muita gratidão aos profissionais de saúde: médicos, enfermeiros, fisioterapeutas e técnicos que todos os dias colocavam em risco suas próprias vidas para salvar aquelas pessoas”.

Compartilhe:

WhatsApp
Facebook
Twitter