Conheça a crônica da estudante cruzeirense finalista da Olimpíada de Língua Portuguesa

A estudante Aline Andrade, da escola de ensino médio Craveiro Costa, de Cruzeiro do Sul, foi classificada para disputar a final da Olimpíada de Língua Portuguesa – Escrevendo o Futuro, na categoria “Crônica”, que será realizada em Brasília, nos dias 9 e 10 de dezembro. Selecionada para representar o Estado, Aline viajou para Natal (RN), onde ocorreu a semifinal. Entre 125 participantes de outros Estados, ela se classificou entre os 38 finalistas.

A professora Mirna Suelby Martins, que orientou a estudante, conta que, durante as oficinas de preparação, Aline se revelou uma aluna brilhante. “É uma verdadeira cronista, embora, de início, tenha dito que não trabalhava com o gênero.”

Conheça o texto de sua crônica, que retrata um momento singular em Cruzeiro do Sul, quando, no mês de agosto, ocorre o Novenário de Nossa Senhora da Glória e, no Rio Juruá, que banha a cidade, é tempo de piracema. Sua divulgação foi autorizada pela comissão do concurso. 

{xtypo_rounded2}No casulo de agosto: onde a metamorfose acontece

Aline Andrade, do 1º ano de ensino médio da Escola Craveiro Costa

O mês de agosto irradia a cidade cujo nome arranha o céu estrelado. Cruzeiro do Sul, pequena no céu, grande em nossos corações! Nessa época, tudo muda em nossa constelação. Não só  por conta das lindas tardes de calor e sol escaldante que se destacam, literalmente, sem sombra de dúvidas. Os garotos em férias tomam as ruas como pardais ao ar livre, suas pipas dançam, rebolam, rodopiam, tremem e estremecem em meio aos passarinhos no azul infinito.

Contemplando o pôr do sol sobre as águas turvas e barrentas do Juruá, vejo um barquinho no cais e lembro-me dos pescadores que estão se preparando para elas. Tarrafas, facas, isopor, protetor solar, repelente, alicates, chumbada, caniço e outras coisas fazem parte do arsenal de pesca indispensável para quem espera muitíssimos peixes vindo rio acima e tira deles seu ganha-pão. Depois de muito lutar com aqueles que vêm contra a corrente, chegam ao porto cansados, mas mesmo assim parecem felizes. E com um largo sorriso no rosto apresentam seus barcos cheios de vidas aquáticas para que os que já esperam o tão escamado prêmio em terra firme possam comprá-los por uma pechincha, e quem sabe até revendê-los por aí.

Enquanto isso, os barcos no cais espiam a movimentação de camelôs e feirantes que nesse período se torna constante. As ruas do centro da cidade se transformam em um verdadeiro campo de batalha por fregueses. Os vendedores nas barracas tentam chamar a atenção com caixas de som tocando, ao máximo, terríveis agradáveis bregas. Calçados, roupas, relógios, canecas e outras bugigangas atrelam-se sobre lonas em meio à calçada, e dela ecoam gritos dos feirantes que mais parecem ter um microfone no lugar da popular campainha. “Hoje é torra-torra total de estoque! Leva três, paga duas. Mulher bonita não paga, mas também não leva!” Gritam desesperados por clientes sob a efervescência de um sol tipicamente equatorial.   E surgem poetas ao acaso. “Vamos lá, vamos comprar, tem calçado pra ele pra ela, pro pé dele e pro pé dela, pro moço e pra donzela, pro príncipe e pra cinderela!” É impossível ignorar a agitação que embala nossa cidade durante a maior manifestação de fé do nosso estado, o Novenário em honra a Nossa Senhora da Glória!

À noite, a cidade parece se metamorfosear, é tudo mais tranquilo, lento, calmo, paciente. O barulho de buzinas, caixas de som, feirantes e clientes é substituído pelo leve sopro da brisa.  Na verdade, todos ali são uma “metamorfose ambulante”. Os loucos por clientes durante o dia, à noite parecem não se importar com tais apetrechos capitalistas. Os que gritavam, falam aos sussurros, como se sempre fossem assim, respeitosos quanto ao ouvido alheio. E os bregas são substituídos por músicas de fé e esperança.

Mas é ao fim dos nove dias que tudo realmente se transforma. Adoro ver isso. Costumo comparar à piracema, onde todos se misturam, ricos, pobres, pretos, brancos, baixos, altos, gordos, magros, feios ou bonitos. Em procissão, em meio à multidão, todos se juntam por um único ideal, mas que diferente dos peixes, não vão contra a corrente, mas sim seguindo-a. Cada “metamorfose ambulante” parece ver à sua frente uma razão, algo a seguir, a acreditar, sonham com um futuro digno e gratificante, algo que não a faça ter “aquela velha opinião formada sobre tudo.” {/xtypo_rounded2}

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