As mudanças que revolucionaram o setor marceneiro acreano

Em abril de 2011, quando o governador Tião Viana decidiu que era hora de regularizar e impulsionar o setor marceneiro do Acre, as atitudes tomadas não só foram únicas, mas capazes de realizar uma grande mudança em todos os setores da economia madeireira. Com atitudes simples, mas firmes, como a legalização dos marceneiros e a lei que permite o governo do Estado comprar todo seu mobiliário da indústria local, uma mudança começou e beneficia não só os marceneiros e madeireiros, mas exigiu a modernização deste mercado.

Antes de 2011, apenas 10% dos marceneiros acreanos estavam regularizados (Foto: Angela Peres/Secom)

Antes de 2011, apenas 10% dos marceneiros acreanos estavam regularizados (Foto: Angela Peres/Secom)

Ao todo existem 350 marceneiros em todo o Acre. Antes da medida apenas 10% desse total eram regularizados. Com o Programa de Fortalecimento do Setor Moveleiro, o primeiro desafio foi justamente esse, regularizar todos. “O maior problema era o licenciamento ambiental. Além de toda a burocracia e custos altos, os marceneiros tinham de ir até um dos escritórios do Instituto de Meio Ambiente do Acre, o Imac, em Cruzeiro do Sul ou Rio Branco, para fazer a regularização”, conta Eder da Silva, diretor do Polo Moveleiro do Acre.

{xtypo_quote_right}Dos 350 marceneiros em todo o Acre, 90% estão regularizados{/xtypo_quote_right}Para mudar esse quadro foi necessário que o governo disponibilizar-se a ir até os marceneiros para iniciar a regularização do setor. E com um grande incentivo, custo zero para a retirada do licenciamento ambiental. Hoje, 90% das marcenarias em todo o Acre estão regularizadas. Em mais seis meses, esse número será de 100%, aponta o governo do Estado.

E foi a partir desse momento que os marceneiros acreanos tiveram o aval para finalmente comprar a madeira regularizada.

Compras governamentais

Com o novo programa de compras governamentais, todo mobiliário do estado é comprado da indústria local, como carteiras de aula (Foto: Angela Peres/Secom)

Com o novo programa de compras governamentais, todo mobiliário do estado é comprado da indústria local, como carteiras de aula (Foto: Angela Peres/Secom)

Se estar regularizado não parecia muito atrativo e vantajoso o suficiente para os marceneiros, o governo foi além e deu um motivo para que todos quisessem estar em dia com suas obrigações, o novo programa de compras governamentais. Através da lei 2.441 o Estado passou a comprar todo o mobiliário de seus espaços apenas do mercado local, ou seja, feito por acreanos, sem a concorrência de outros estados.

“O governo é o maior comprador de móveis do estado. Só no ano passado foram R$ 5 milhões investidos em móveis novos, dinheiro que circulou todo dentro do estado”, revela Eder Fidelis. No novo esquema, o governo especifica o tipo de móvel e o preço, então as empresas que se consideram aptas a produzi-los se cadastram e o montante é distribuído. Por exemplo: se 100 carteiras escolares são pedidas e 10 empresas se cadastram, cada empresa será responsável pela produção de 10 carteiras. Além disso, se o pedido é para as escolas de Cruzeiro do Sul, serão valorizados os marceneiros de Cruzeiro do Sul e entorno.

Hoje existem 14 CNPJS credenciados para concorrer no programa de compras, mas entre eles estão diversas cooperativas, que abrangem uma grande quantidade de moveleiros em mais de 12 cidades do estado. Só a Central das Cooperativas, um único CNPJ no caso, abrange 11 cooperativas de marceneiros.

Eder Fidelis explica que todos os cadastrados tiram vantagem do programa e a demanda é dividida igualmente entre os marceneiros (Foto: Angela Peres/Secom)

Eder Fidelis explica que todos os cadastrados tiram vantagem do programa e a demanda é dividida igualmente entre os marceneiros (Foto: Angela Peres/Secom)

Reestruturação do setor

Quando começou na área da marcenaria, José Augusto Figueiredo era apenas um empregado. “Pra trabalhar eu alugava espaço na marcenaria dos outros. E quando a gente pegava serviço demais o dono da marcenaria já nos via como concorrência”, relata José. O trabalho era pouco, os gatos eram muitos e José não tirava mais que R$ 800 por mês.

Com sua renda saltando de R$ 800 para R$ 5.000, José comemora uma nova picape o financiamento da casa (Foto: Angela Peres/Secom)

Com sua renda saltando de R$ 800 para R$ 5.000, José comemora uma nova picape o financiamento da casa (Foto: Angela Peres/Secom)

“A gente comprava a madeira ilegal e ainda tinha que transportar. Escondia a madeira na mata, jogava dentro de ramal, quando transportava a madeira mandava uma moto na frente pra avisar se tivesse fiscalização”. Quando decidiu pela montagem da própria marcenaria, começou devagar. Comprava uma máquina, quando terminava de pagar comprava outra, e quando conseguiu a terceira foi que começou sozinho.

A abertura da própria marcenaria coincidiu com o início do programa do governo para o setor. “Com o licenciamento as portas se abrem pra você, mas há alguns anos atrás realmente era impossível”. Hoje José está mais que sorridente. Com a abertura da sua pequena empresa foi preciso contratar cinco pessoas, a marcenaria está a todo vapor. São R$ 30 mil movimentados mensalmente, lucro de R$ 6 mil, estima.

{xtypo_quote}A gente comprava a madeira ilegal e ainda tinha que transportar. Escondia a madeira na mata, jogava dentro de ramal, quando transportava a madeira mandava uma moto na frente pra avisar se tivesse fiscalização{/xtypo_quote}

Do lado de fora a marcenaria ainda não tem uma fachada, mas José distribui com orgulho o cartão de visitas personalizado e exibe a nova picape, comprada recentemente, além de ter conseguido crédito junto ao banco para financiar sua nova casa. “E pode chegar qualquer fiscalizador aqui que eu tranquilo”, afirma José, entusiasmado.

Madeira do Acre para os acreanos

Mesmo depois da regularização das marcenarias ainda havia ações que precisavam ser tomadas pelo governo do Estado. Como fazer com que os moveleiros passassem a comprar apenas madeira certificada, proveniente de manejo florestal, ao invés da madeira ilegal que é mais barata? Por meio de um termo de cooperação assinado entre o Sindicato dos Madeireiros e o Imac, os moveleiros passaram a ter a madeira manejada por um preço muito mais barato, através de subsídios do governo.

Na madeireira de Midiã a madeira que antes era enviada para fora do estado agora abastece o mercado local (Foto: Angela Peres/Secom)

Na madeireira de Midiã a madeira que antes era enviada para fora do estado agora abastece o mercado local (Foto: Angela Peres/Secom)

São 10 espécies de madeira que custam aproximadamente R$ 450 o metro cúbico. Sem o acordo, eles poderiam pagar mais do que o dobro desse valor, enquanto a ilegal custa entre R$ 600 a R$ 1.000 o metro cúbico. Quem explica os profundos impactos dessa mudança na vida dos madeireiros é Midiã Lysakowski. Dona de uma madeireira em Rio Branco, ela ainda se impressiona com as vantagens conquistadas pelo setor com a ajuda do governo. “Antes desse acordo, tudo que comercializávamos aqui iria para o mercado nacional ou exportação. Hoje eu posso dizer que mais de 70% da nossa produção fica no Acre”.

{xtypo_quote_right}Com o subisídio do governo, 10 espécies de madeira manejada são negociadas a R$ 450, antes era o dobro. A ilegal custa de R$ 600 a R$ 1.000{/xtypo_quote_right}A venda para outros estados ou países tem um fator primordial para gerar menos lucro: a logística. Como os maiores compradores da empresa de Midiã eram de São Paulo e as exportações feitas para a Europa precisam passar pelo Porto de Paranaguá, os preços são altos e o tempo para a entrega é longo. “Com a lei, começamos a abastecer o mercado interno em larga escala. Um único marceneiro comprou 100m³. Mas existe desde o pequeno marceneiro, que compra 5m³, até o grande que leva 80m³, e até faz licitação”.

“Esse plano foi a melhor coisa que aconteceu tanto pra eles [marceneiros] quanto pra gente [madeireiros]”, reforça Midiã, que ainda lembra o quanto o processo para manejar e certificar madeira é rigoroso e complicado. Só em sua empresa, Midiã tem 50 funcionários, a de seu marido, mais dedicada a exportação, possui 100. Ambos estão no mercado há 20 anos.

{xtypo_quote}Esse governo faz referência à floresta e ao meio ambiente. É um estado que tem fiscalização intensa e rigorosa. Por isso não se veem mais escândalos relacionados à madeira. É fazer tudo certo que não haverá mais problemas.{/xtypo_quote}

Qualificação e avanços

Omar e sua habilidade de transformar madeira em objetos de arte (Foto: Angela Peres/Secom)

Omar e sua habilidade de transformar madeira em objetos de arte (Foto: Angela Peres/Secom)

Omar Suarez é prova de que não importa a profissão, mas a renovação é essencial. Aos 64 anos, com 35 anos dedicados à movelaria, ainda procura aprender noções de como transformar a madeira em verdadeiros objetos de arte, agregar valor e conquistar o mercado. Omar participou recentemente do curso de Design de Móveis do Instituto Dom Moacyr, organizado pela primeira dama do estado em parceria com a Escola Politécnica de Milão na Itália.

Com sete módulos, desde pesquisa, história e desenho técnico, o curso de Design de Móveis encerrou suas aulas recentemente. Durante a capacitação foram produzidas 10 linhas de móveis e pequenas peças que entrarão em exposição no segundo semestre deste ano, além da formação de um catálogo. “O design é algo que você leva anos para chegar lá e precisa sempre se aperfeiçoar. Durante esse curso eu peguei as coisas mais rápido com meus anos de experiência. Tivemos até um professor da Itália que nos passou um conhecimento muito amplo. Foi excelente”.

A qualificação profissional é essencial para entender as novas necessidades de mercado e atender sua demanda (Foto: Angela Peres/Secom)

A qualificação profissional é essencial para entender as novas necessidades de mercado e atender sua demanda (Foto: Angela Peres/Secom)

A área de marcenaria ainda é carente de profissionais. O curso de design de móveis não é o único, o IDM também oferece cursos de marcenaria básica e pintura, profissionais necessários para um mercado em alta expansão.

Além disso, o Estado pretende ir além do licenciamento ambiental para os marceneiros, mas organizá-los melhor. “Queremos levar todos os marceneiros das cidades do interior para dentro dos polos até o final do ano e assim coloca-los em local adequado para dar continuidade e expansão do seu trabalho”, reforça Eder Fidelis.

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