Agência da ONU conhece gestão da Natex e cultura da borracha

A Natex tem uma capacidade de produzir 100 milhões de preservativos por ano (Foto: Sérgio Vale/Secom)
Natex tem uma capacidade de produzir 100 milhões de preservativos por ano (Foto: Sérgio Vale/Secom)

Carregando princípios de responsabilidade social e ambiental, o Fundo de População (UNFPA), uma agência da Organização das Nações Unidas (ONU), esteve no Acre colhendo bons exemplos e analisando possíveis parcerias. Na última terça-feira, 8, uma comitiva da UNFPA conheceu de perto a experiência inovadora da empresa de preservativos Natex gerida pela Fundação de Tecnologia do Acre (Funtac), em Xapuri.

O empreendimento trabalha há oito anos exclusivamente na confecção de preservativos para o Ministério da Saúde. O grande diferencial é a matéria-prima, feita a partir de látex nativo, agregando proteção do meio ambiente e rentabilidade para a população que vive na floresta.

A Natex busca agora novas alternativas de mercado e ampliação. O interesse é compartilhado também com a agência da ONU, que conheceu in loco todo o processo. A UNFPA analisa possíveis parcerias com a fábrica e o estado, que, segundo seu diretor no Brasil, Jaime Nadal, trabalha em total sintonia com os princípios do fundo.

A equipe da ONU conheceu de perto a cadeia produtiva da borracha (Foto: Sérgio Vale/Secom)
Equipe da ONU conheceu de perto a cadeia produtiva da borracha (Foto: Sérgio Vale/Secom)

Em um dia de pleno sol, a equipe percorreu toda a cadeia produtiva, desde a extração do látex, na floresta nativa, até a manufatura da matéria-prima – histórica para o Acre – em preservativos utilizados na saúde pública brasileira.

Em reunião com a direção da Natex, o Fundo analisou as possibilidades de parcerias e avanços para a empresa e o modo em que o Estado consegue conciliar evolução econômica e proteção à natureza e culturas tradicionais.

floresta_plantada_02_ok“O produto da Natex é único, é um diamante. Tem um valor intangível, difícil quantificar materialmente. São cerca 700 famílias que vivem de vender a borracha e mantém a floresta preservada. É uma experiência que tem que ser mantida e, se possível, crescer”, afirma Nadal.

Entre as possibilidades de avanço, o diretor acredita existir um mercado de consumo responsável e sustentável para esse tipo de produto. “Em alguns países teria uma boa acolhida”, afirma.

Sobre o novo momento da indústria, Dirlei Bersch, diretora executiva da Natex, explica que um comitê do governo do Estado busca alternativas de negócios, mas sempre com o olhar socioambiental em conjunto.

“Estamos trabalhando em alternativas que compreendam mais modernidade, efetividade e a concretização da sustentação do empreendimento”, assegura a diretora.

A cultura da borracha e os próximos passos

Ao final de algumas horas de conversas, as equipes da Natex e UNFPA determinaram os próximos passos de discussão da parceria.

Três eixos serão analisados de forma mais aprofundada: realizar a pré-qualificação da empresa para participar de editais internacionais de fornecimento para a ONU, adquirir insumos para a produção dos preservativos e trocar relações com grupos privados e governamentais que busquem produtos com responsabilidade.

"Existe um ditado que diz: 'não se constrói nada se não houver luta'. Hoje, finalmente, estamos em um momento de desfrutar", afirma Raimundão (centro da foto) (Foto: Sérgio Vale/Secom)
“Existe um ditado segundo o qual ‘não se constrói nada se não houver luta’. Hoje, finalmente, estamos em um momento de desfrutar”, afirma Raimundão (centro da foto) (Foto: Sérgio Vale/Secom)

“Essa é uma atividade que unifica os desenvolvimentos econômico, social e ambiental, o que acreditamos ser uma tríade que agrega muito valor a essa fábrica em Xapuri. O Fundo de População da ONU, que é o principal fornecedor, em escala global, para o setor público de insumos de saúde reprodutiva, tinha o interesse de saber mais como essas três dimensões foram incorporadas na produção dos preservativos”, reitera Jaime.

As conversas também seguiram-se até o Seringal Rio Branco, dentro da Reserva Chico Mendes. Os representantes ouviram de Raimundo Mendes, o Raimundão, líder e seringueiro que lutou ao lado de Chico Mendes, parte da história dos tempos conflituosos até a presença positiva do Estado atualmente.

Apontando para a “cabrita”, equipamento de corte da árvore seringueira, Raimundão ilustra: “Esta aqui é a caneta do seringueiro”.

Na varanda de sua casa, em meio à floresta, ele conta a história que ajudou a escrever os conceitos das atuais políticas públicas acreanas, sempre voltadas para o desenvolvimento social e defesa do meio ambiente: “Junto com Wilson Pinheiro e Chico Mendes, companheiros que foram vítimas da violência do latifúndio, nascemos em uma época de muita ausência do poder público. No tempo dos nossos pais eram o patrão, o ‘coronel de barranco’, que exigia da gente borracha, borracha, borracha e ainda comprar as mercadorias dele”.

Mesmo aos 72 anos de idade, Raimundão continua cortando e colhendo o látex, sendo uns dos mais de 700 seringueiros que fornecem para a Natex anualmente. “Existe um ditado que diz: ‘não se constrói nada se não houver luta’. Hoje, finalmente, estamos em um momento de desfrutar. É triste que esses companheiros, Chico e Wilson, não estão mais conosco para ver essa nova realidade que vivemos”, relata o seringueiro.

Vale lembrar que, atualmente, a borracha está sendo vendida na forma líquida (látex) para a Natex ao preço de R$ 7,80 o quilo, sendo que R$ 4,20 vem de subsídio do Estado, por meio do programa de subvenção (custeio de parte do produto). Atualmente, o governo tem uma parceria com a Cooperacre (Cooperativa Central de Comercialização Extrativista) que faz a organização de cerca de 2.000 famílias da floresta e de seus produtos. Os recursos são do Fundo Amazônia, Programa de Desenvolvimento Sustentável do Estado do Acre (PDSA), Programa de Inclusão Social e Desenvolvimento Econômico Sustentável do Acre (Proacre) e do banco alemão KfW.

Mensagem do Acre

O Fundo de População da ONU trabalha em três áreas: que cada gravidez seja desejada, que cada parto seja seguro e cada jovem possa atingir sua potencialidade. Jaime afirma que está vendo o Acre seguir esses princípios. “Aqui existe uma orientação das políticas públicas muito voltadas a esse desenvolvimento social, a essa sustentabilidade e ao trabalho com a juventude”, declara.

Ele afirma também que observou muitos jovens trabalhando e podendo desenvolver seus projetos de vida, mesmo que a economia do estado tenha em sua base a agricultura familiar: “Aqui tem possibilidades reais de crescimento com equidade e sustentabilidade ambiental. Isso é uma mensagem muito forte, levamos isso conosco como uma lição que ainda temos que trabalhar e ver como agregarmos valor a esta parceria”.

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