Recentemente, um meme da atriz Ilana Kaplan ganhou destaque nas redes sociais. Em seu próprio Instagram, ela interpreta uma personagem fictícia intitulada Keila Mellman que dá dicas de etiqueta no mundo virtual, sobre o que “é de bom tom” e o que “não é de bom tom” para postar na Internet. A sátira, que parece boba, acaba nos fazendo refletir sobre nossa forma de usar as redes sociais e, principalmente, se a maneira a que estou me comportando está ofendendo o direito de existir de outras pessoas.
Uma coisa que, como diz os internautas, “envelheceu como leite”, foram as piadas de cunho preconceituoso. O que antes chacoalhava os auditórios brasileiros com o soar estrondoso das risadas das pessoas em torno de personagens caricatos e ofensas às minorias, hoje a sociedade entra em outra condição: a de reflexão sobre aquilo que estamos ouvindo. Alguns podem até dizer que “tudo hoje em dia virou mimimi”, mas a questão é que ninguém gosta de ter seu terreno invadido e de ter suas fraquezas expostas, nem mesmo (pasmem) os próprios humoristas que costumam se escalar nesta vertente datada da comédia.
Até onde vale fazer humor com a dor alheia? As piadas ofensivas vão fazer alguém de boa índole rir em pleno 2021? Enfatizo: alguém de boa índole? O ato de rir é um sentimento tão sincero que não soa muito justo atrelá-lo aos preconceitos e estigmas que as minorias lutam tanto para pôr um fim. O que se conhece hoje por blackface (resumidamente, é o ato de se pintar de preto e de fazer comportamentos caricatos e associados à pessoa negra, como de embriaguez e preguiça) antigamente era o cerne dos shows de comédia. Todo mundo ria ao ver um negro estereotipado se dando mal, por exemplo.
No entanto, o andar da carruagem regido pelo Sistema Solar nos faz pensar o seguinte: será que aquilo que me faz rir, faz outros chorarem? Recentemente, um rapaz teve sua orientação sexual exposta por um grupo de humoristas que, de forma pejorativa, formularam comportamentos que acreditavam ser típicos de gays e associaram a ele. Como se costuma acontecer em um país que mais mata LGBTs, a vítima foi expulsa de casa justamente por ter sido “empurrado para fora do armário”. No final das contas: valeu a pena a piada? O “humor” que fez quatro pessoas rirem descabidamente na gravação do material para a internet, fez quantos ficarem ofendidos ao se imaginarem naquela situação?
Muitos costumam dizer que a graça acaba quando ofende alguém. Na verdade, a graça nem começa quando o assunto é ofensa. Não é preciso ferir uma pessoa em específico para saber que as palavras têm poder e que podem levar a vida de alguém à ruína. O humorista Paulo Gustavo, que nos deixou tão precocemente, dava aula de como fazer nossa barriga doer de rir sem ofender ninguém. É este legado que deveria ser seguido, pois é de bom tom. Esta é a única dor que queremos sentir, e não a do choro de pessoas que foram expostas e atingidas covardemente em prol de um humor que não é de bom tom.
Renato Menezes é estudante de Jornalismo da Universidade Federal do Acre (Ufac) e estagiário de comunicação na Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp)