É dito que, para conhecer a vida, um homem precisa abrir mão de sua poltrona. De modo bem semelhante, para conhecer o maior espetáculo de diversidade biológica e genética – a vida em si mesma -, é preciso ir à floresta. Esta biodiversidade é tão grande que escapa à análise: se tomarmos como exemplo apenas as espécies vegetais presentes nas florestas tropicais, estima-se que menos de 2% delas foram suficientemente estudadas. E ainda que as florestas ocupem menos de 6% da superfície do planeta (aproximadamente 625 milhões de hectares) por elas transitam nada menos que a metade de todas as espécies conhecidas.
Com a intenção de traduzir um pouco mais sobre esta realidade, a assessoria de comunicação da Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Acre seguiu de “voadeira” até o Parque Estadual Chandless, Unidade de Conservação de Proteção Integral gerida pelo Estado, com uma área de 695.303 hectares, distribuída entre os municípios de Manuel Urbano, Sena Madureira e Santa Rosa do Purus. Foram aproximadamente oito horas ininterruptas nas lanchas, acompanhada por gestores e uma equipe de assistência médica do Exército Brasileiro, até a chegada à sede da Unidade, no interior do parque.
O Parque Estadual Chandless é uma grande área de florestas preservadas que possui restrições em relação ao seu uso. Apenas algumas atividades são permitidas: pesquisa, turismo e educação ambiental. Isso garante que a unidade não sofra nenhuma forma de ação que comprometa sua integridade, garantindo que seus imensos e ainda inexplorados recursos sejam mantidos. Entretanto, para compreender a enorme importância que o Chandless possui, é preciso antes traduzir a relevância de uma floresta tropical úmida, levando em conta seus aspectos ambientais, econômicos e humanos.
A importância das áreas florestais preservadas
A importância do habitat florestal para a humanidade não é pequena. Onde há vida proliferam recursos. Uma entre quatro compras feitas em nossas farmácias, contém substâncias derivadas de plantas da floresta tropical. Nesse ambiente também foram descobertos e depois cultivados alimentos que atualmente fazem parte do cardápio de milhões de pessoas ao redor do mundo, como cacau, banana, abacate, coco, café, milho, manga, mamão, amendoim, abacaxi, castanha-do-brasil, mandioca e, mais recentemente, o açaí. Na verdade, das 3.000 espécies frutíferas presentes na floresta, apenas uma média de 200 delas são atualmente comercializadas.
A própria atividade agropecuária depende das informações contidas em diferentes espécies de micro-organismos, plantas e animais ali existentes. A transferência de genes de espécies silvestres resistentes a doenças para espécies domesticadas, que servem de alimento para o homem, é hoje uma necessidade, uma vez que monoculturas e criação ostensiva de animais tornam os mesmos mais frágeis às pragas e epidemias.
Como se não bastasse, as florestas também são fundamentais para o equilíbrio climático e a manutenção das fontes de água potável no planeta. Graças à associação adequada entre umidade e calor, as florestas recebem, em sua totalidade, o equivalente a dois metros de água ao ano, processando sua reciclagem de forma ininterrupta.
Ignorar a importância ecológica e o potencial econômico da floresta tropical equivale, na prática, a desconsiderar os desequilíbrios climáticos globais em andamento ou mesmo os interesses das indústrias mundiais farmacêutica, alimentar e cosmética, pelos produtos que possam ser obtidos com pesquisas direcionadas. A biopirataria é um fato concreto que tem o poder de transformar a matéria-prima existente em seu quintal em produtos que você paga caro para retirar das prateleiras dos supermercados e farmácias.
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Biopirataria
A biopirataria envolve o comércio e a utilização ilegais de plantas e animais. Segundo farta documentação (http://www.amazonlink.org/
Tem havido significativo esforço da comunidade científica brasileira em patentear os produtos da biodiversidade derivados de pesquisa para proteger seus resultados na aplicação para medicamentos e outros usos.
Fonte: Cleber J. R. Alho, Ph.D em Ecologia em Chapel Hill, nos Estados Unidos, professor titular aposentado do Departamento de Ecologia da Universidade de Brasília e atualmente orientador do programa de Pós-Graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento Regional da Universidade Anhanguera/Uniderp, em Campo Grande (MS).
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Os desafios para uma gestão eficiente
Jesus Rodrigues Domingos de Souza é o gestor do Parque Estadual Chandless. Jovem, idealista, mas extremamente objetivo, ele aprendeu a sonhar com os pés no chão, não medindo esforços para que o parque possa cumprir integralmente com as suas finalidades. Os desafios para que as Unidades de Conservação cumpram com seus objetivos são, contudo, consideráveis.
Entre os principais problemas encontram-se a indefinição fundiária de várias unidades, caça e queimadas predatórias, invasões e presença de populações humanas em unidades de proteção integral (parques, reservas biológicas e estações ecológicas), falta de pessoal técnico e de recursos financeiros, além da instabilidade política dos órgãos de meio ambiente. Caso essas situações não sejam revertidas e sanadas, corre-se o risco de, com o tempo, possuirmos áreas preservadas apenas em documentos e papéis.
Jesus avalia que um dos maiores aliados para que Chandless possa se tornar modelar chama-se Programa ARPA (Áreas Protegidas da Amazônia). Elaborado pelo governo federal, tem como objetivo consolidar e manter as unidades de conservação da Amazônia, uma média de 60 milhões de hectares, promovendo o desenvolvimento sustentável dessas áreas. A maior parte dos recursos é captada no exterior, sob o gerenciamento do governo brasileiro. As instituições financiadoras são o BID (Banco Mundial), WWF, KFW, GIZ (Cooperação Alemã) e GEF (Global Enviroment Facility), sendo que mais recentemente o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento) também está investindo consideravelmente.
Para Jesus, o programa é fundamental. “Sem o ARPA e os recursos que capta e destina, administrar esse parque seria uma missão impossível.” Ele explica o porquê.
“O arranjo do programa é muito inteligente por permitir que os recursos cheguem de fato aqui na ponta: a executora do programa é uma ONG chamada Fundo Brasileiro para Biodiversidade (FUNBIO), que libera e fiscaliza os recursos aplicados em etapas, conforme cumprimos as metas e objetivos necessários para a consolidação do parque. A realidade que estamos vivendo agora em atividades e equipamentos disponíveis está minuciosamente planejada e justificada há pelo menos dois anos. Só posso gastar o que planejo e só posso planejar o que é possível executar, dentro dos patamares estabelecidos, até a Unidade de Conservação poder atuar de forma plena.”