Festival dos povos Pano reforça a busca pelo resgate das tradições milenares

Encontro reuniu 12 povos indígenas e representantes de dez países

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Festival Cultural Indígena Corredor Pano reuniu 12 povos indígenas do Acre e sul do Amazonas, além de representantes de dez países (Fotos: Acervo Kuntanawa)

O Povo Kuntanawa, não faz muito tempo, entrou na luta para recuperar sua identidade indígena. Seus membros estavam espalhados pela Reserva Extrativista do Alto Juruá, onde se misturavam à população local descendente de imigrantes nordestinos. Durante muitos anos se conformaram nessa posição, até que, insatisfeitos com os rumos que estava tomando a exploração da Resex, acabaram entrando na luta para serem reconhecidos como povo.  

Agora, a luta pelo resgate de suas tradições começa a se tornar referência para os demais grupos do tronco linguístico Pano. Nos dias 26 a 31 de julho, os Kuntanawa realizaram em sua terra indígena o ‘Festival Cultural Indígena Corredor Pano’, que reuniu 12 povos indígenas do Acre e Sul do Amazonas, além de representantes de dez países: Filipinas, EUA, Escócia, Canadá, Dinamarca, Alemanha, Suíça, Inglaterra, Irlanda e Groenlândia. O líder do povo esquimó, An Gangaak, que tambem é embaixador da Paz da ONU, participou do festival como representante do governo da Groenlândia.

Para conseguir recursos e realizar o festival, o povo Kuntanawa teve o apoio da Organização dos Povos Indígenas do Vale do Juruá (Opirj) que fez a proposta e aprovou projeto ao Ministério da Cultura no valor de R$ 186 mil. Segundo o líder indígena, Haru Kuntanawa, o objetivo do festival foi reunir os povos nativos do tronco linguístico Pano visando o fortalecimento cultural, integração e união dos diversos povos, fazendo com que juntem seus pensamentos e transformem sua história em realidade. "Muitos povos estão com a situação cultural muito delicada e com este encontro a gente pôde obter resultados muito positivos sobre a capacidade de cada povo de trazer à tona seus conhecimentos tradicionais", disse.

No período do festival, os indígenas reunidos avaliaram suas próprias culturas, a educação, saúde, meio ambiente e essa troca de vivências deu o tom da importância do encontro. Segundo Haru, o objetivo principal é estruturar as comunidades, nas áreas indígenas para que cada um dos povos Pano possa desenvolver seu potencial próprio, com a reafirmação de sua identidade própria. "Pudemos ver que somos uma só família. O isolamento entre nós ficou bem claro e surgiu o sentimento de que precisamos acabar com esse sistema em que cada povo pensa por si só. Precisamos de união."

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Festival reúne os povos nativos do tronco linguístico Pano visando o fortalecimento cultural e integração das etnias (Fotos: Acervo Kuntanawa)

Novos encontros

Daqui para frente ficou decidida realização de vários encontros. O objetivo é circular todas as áreas indígenas dos povos Pano visando o fortalecimento cultural e tradicional dos povos nativos e com isso desenvolver a própria sustentabilidade dos povos, através do potencial de cada terra indígena, visando trazer dias melhores para cada povo, de posse de seus conhecimentos tradicionais. "Esse patrimônio cultural não é só dos indígenas, é um patrimônio cultural brasileiro e mais ainda um patrimônio planetário", assevera Haru. Para a realização do festival ele conta que primeiro houve uma discussão entre as lideranças indígenas, sendo posteriormente o assunto levado aos parceiros nacionais e internacionais. Ele destaca, além do apoio do Ministério da Cultura, o apoio internacional de líderes espirituais. Além disso, houve apoio de parceiros internacionais – líderes espirituais em seus países – que foram fundamentais, além do apoio da sociedade civil.

Projeto contínuo – Como resultado do festival, a aldeia Kuntamanã, a principal da terra indígena Kuntanawa, recebeu uma estrutura permanente, que vai servir de estímulo durante muitos anos. Trata-se de um Centro Cultural, segundo Haru. Ele se destina aos estudos espirituais, para formação no estudo tradicional, para os intercâmbios, oficinas, projetos de capacitação, como o agrofloresta, meio-ambiente, saúde educação. O objetivo é contemplar todas as terras indígenas dos povos Pano, com esse projeto de afirmação cultural. E para a pergunta: "Quando vamos ter um povo capaz de tocar sua própria história?", ele responde: "Quando começarmos a desenvolver, levar para esses povos um espaço adequado, para que possam criar um estímulo, se reunir, onde posam fazer seus rituais, suas festas tradicionais, possam ter sua prática educacional desenvolvida dentro de seu próprio ser, dentro das terras indígenas e ter uma estrutura correspondente à necessidade de cada povo".

Haru explica que procurando gerar o mínimo de impacto na aldeia, o centro cultural não foi construído dentro da comunidade, mas ao lado dela. "Para não compartilhar nossas intimidades com os visitantes de fora", disse.

E Haru conta o que o move: "A gente vai muito pelo coração, não pelo que está anotado. Práticas de mais de mil anos que não eram mais realizadas a gente realizou. Foi fantástico, estava na nossa história e eu tenho certeza que vai ficar no coração da humanidade. Nós queremos colocar essa história para o mundo conhecer; a importância de permanecer esta identidade cultural dos povos antigos que é um bem planetário. Não vejo só como um bem brasileiro. O potencial que o Brasil tem, é uma coisa muito forte  e tem que ser usufruída".

Conta Haru que durante os dias do festival foram feitas várias descobertas da história dos povos Pano: "Lembranças milenares, que a gente tinha que descobrir novamente. É importante mostrar no mosaico brasileiro a força que tem nossa cultura dentro da tradição brasileira e o que isto pode trazer para o mundo, através de uma cura planetária e pode vir através dos nossos conhecimentos tradicionais e isto é importante. O mundo deve olhar para os povos indígenas, os povos nativos, os povos da floresta. Esse conhecimento ancestral deve ser levado, não deve ficar apenas nas terras indígenas, eles tem que ser distribuídos para a sociedade", concluiu.

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