Um trabalho que beneficia todo o planeta
Começou no dia 12 de julho e se estende até o dia 10 de agosto, o XVI Curso de Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre – AAFIs, promovido pela Comissão Pró-índio do Acre, no Centro de Formação Povos da Floresta em Rio Branco. Dos 126 AAFIs que participam da formação, 30 estão concluindo, com este curso, o ensino médio profissionalizante. Ele é, para estes indígenas, a última etapa de formação nesta área que faz parte da trajetória de apoio às nações indígenas acreanas que a CPI/AC vem desenvolvendo ao longo da sua história.
Com uma linha de formação que tem como princípio a autoria e participação indígena, a CPI/AC organizou seus cursos com a especificidade própria do seu público: uma formação continuada para a vida indígena que prima pela organização e coordenação da Gestão Territorial e Ambiental da Terra Indígena, pelo planejamento participativo do uso dos recursos naturais com repovoamento de espécies aquáticas e florestais, pela implementação de sistemas agroflorestais e agroecologia, recuperando sementes e fortalecendo o plantio de árvores frutíferas, pelo aproveitamento de madeira caída dos roçados para produção de artefatos e esculturas focalizadas na mitologia indígena, entre outras ações de sustentabilidade socioambiental. Esses e outros aprendizados são construídos a partir da realidade da comunidade indígena e com o olhar que o próprio índio tem do seu contexto, das suas necessidades e da sua história.
Nesta perspectiva, o ensino Médio Profissionalizante dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre, que tem uma carga horária de 2.680 horas/aula, prevê em seu currículo disciplinas de conhecimentos básicos como língua indígena, língua portuguesa, matemática e geografia com ênfase em cartografia; e disciplinas profissionalizantes como os Sistemas Agroflorestais, geologia indígena e artes e ofícios, entre outras. Ele está organizado com aulas teóricas presenciais no Centro de Formação Povos da Floresta da CPI/AC, aulas teóricas e práticas presencias nas Terras Indígenas com assessores da CPI/AC e aulas práticas, chamadas de formação à distância, que se traduzem na aplicação do aprendizado em sua comunidade. Estas aulas práticas são mensuradas e avaliadas através de produtos como Diário de Trabalho e relatórios dos Sistemas Agroflorestais implementados e da vigilância e fiscalização realizadas em conjunto com a comunidade.
Para o Agente Agroflorestal Indígena Antonio Ferreira, o Tuin Kaxinawá, da Aldeia Novo Futuro, Terra Indígena Humaitá, em Tarauacá, esse aprendizado vem resgatar o jeito de plantar e cultivar sem destruir e, também, o jeito coletivo de se trabalhar. "Cada um fazia o seu trabalho sozinho, sem se preocupar com a comunidade, mas os sistemas agroflorestais que aprendemos no curso da CPI estão ajudando a reaprender o conhecimento de fazer manejo com preservação dos recursos naturais e a trabalhar no coletivo". Para Tuin, só o trabalho coletivo vai dar sustentabilidade para as aldeias e garantir o sucesso da Gestão Territorial e Ambiental das Terras Indígenas.
O primeiro módulo do curso esteve voltado para o conhecimento de Cartografia Indígena, onde os AAFIs construíram mapas de suas aldeias e comunidades, o que possibilitou para cada um, uma visão geral da área em que a comunidade transita e se utiliza dos recursos. Com ela, o AAFI consegue planejar o seu trabalho e contribuir mais e melhor com o Plano de Gestão Territorial e Ambiental da sua Terra Indígena.
O segundo módulo, que vai até o início do mês de agosto, está destinado à produção da monografia, onde cada AAFI escolhe um tema para desenvolver cientificamente. Patrimônio Cultural Imaterial, como artesanato, histórias, religiosidade, simbologia de imagens, conhecimentos medicinais da floresta, e, também, políticas territoriais são os temas escolhidos para reflexão e afirmação da sua cultura. Com os TCCs – Trabalho de Conclusão de Curso – os AAFIs do Acre estarão aptos para receber o diploma do ensino médio profissionalizante.
Em dezembro de 2009, a Comissão Pró-Índio do Acre obteve a aprovação da sua proposta curricular para a Formação Profissional e Técnica de Agentes Agroflorestais Indígenas, pelo MEC e pelo Conselho de Educação do Estado do Acre. "Essa aprovação reforça o trabalho dos AAFIs, que é muito importante porque eles são responsáveis pela proteção da floresta, das águas, pelo manejo dos recursos naturais e da biodiversidade. Com o trabalho deles, todos nós somos beneficiados, porque afinal, é dessa proteção que depende a preservação do planeta". Afirma Vera Olinda, diretora do Centro de Formação Povos da Floresta, da CPI/AC.
Para o Coordenador do programa de Gestão da CPI/AC, Renato Antônio Gavazzi, a importância do curso está no diferencial que a proposta traz. Além da diversificação de produtos que os Sistemas Agroflorestais proporcionam para a segurança alimentar das aldeias, dos estudos de agroecologia que são aprendidos e do fortalecimento dos conhecimentos tradicionais dentro das aldeias, o trabalho dos Agentes Agroflorestais Indígenas é um contraponto às formas de utilização das terras e dos recursos naturais impostos por um sistema degradante. Gavazzi diz, ainda, que a grande riqueza do curso está no fortalecimento dos conhecimentos tradicionais, na aliança que faz com os conhecimentos científicos e, especialmente, com a trovas de informações entre os povos. "O curso trabalha além do plantio e da criação de pequenos animais, ele fornece e aperfeiçoa os olhares do indígena para toda uma cultura que lhe é peculiar, própria dos povos da floresta. A troca de informações entre os diferentes povos é um dos pontos mais fortes do curso, pois resgata conhecimentos tradicionais de uns que podem ser assimilados por outros, como por exemplo, o manejo de palheiras dos Manchineri. Esta técnica, que dá certo porque garante a palha que é um recurso necessário para as pessoas que moram na floresta, foi incorporada ao programa do curso e implementada nas aldeias de outros povos".
Trabalhar a partir do próprio conhecimento indígena, valorizando sua língua, tradições e cultura é a missão da Comissão Pró-Índio do Acre, que se vê cumprindo parte dela com a formação da 1ª turma de Agentes Agroflorestais Indígenas do Estado do Acre.