O que grande parte das mulheres sente ao passar em frente a uma bela vitrine de joias ou bijuterias? Uma atração irresistível. O desejo de olhar todas as peças, dedicando atenção especial a cada uma. E imaginar-se usando uma ou algumas delas. Eis um passatempo delicioso.
E por quê? Porque isso faz parte da brincadeira de se sentir mais bonita. E pra que ter beleza? Pra ser mais olhada, mais desejada, mais valorizada, gostar mais de si e – oh, glória! – ser mais amada. Quem não gosta? Quem não quer?
Logo, enfeitar-se é uma atitude perfeitamente legítima de busca de autoestima. Para garantir esse direito às mulheres, a artesã Rodney Paiva Ramos dedica todas as horas do seu trabalho, todos os dias da semana: “Quando crio uma peça, penso em quem vai usar. Como será ela? Alta, baixa, morena, loura…”, imagina.
A floresta também é fonte de inspiração permanente. Tucum, jarina, morototó, açaí, paxiúba, paxiubão, jupati e tucumã são elementos da mata que frequentam o cotidiano de Rodney. E, com ajuda de suas mãos ágeis, transformam em realidade os adornos que povoam seus sonhos.
Mas a artesã, com equilíbrio, sabe também como manter os pés no chão. Há algumas semanas, com vistas a uma premiação da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) lançada no Brasil pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) e articulada no Acre pela Secretaria de Turismo (Setul), Rodney promoveu, entre os fregueses, uma votação informal para a escolha de uma peça sua para participar do concurso.
Baseada no resultado da pesquisa, concorreu ao “Reconhecimento de Excelência Para os Produtos Artesanais do Mercosul+ (Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai)” com o colar “Cores da Mata”. Competiu, inicialmente, com 62 artesãos de todo o país. Depois, ficou entre os 13 finalistas. E, por fim, vitória! Resultado anunciado no início deste mês, Rodney conseguiu manter-se entre os seis indicados para representar o artesanato brasileiro perante a organização global. Além da certificação internacional, sua peça vai figurar num catálogo da Unesco junto a obras de artesanato do mundo todo, o que gerará grande visibilidade para a sua produção e a possibilidade de exportação.
De modo que nossa artesã está radiante! E muito merecidamente. Pra quem começou a trabalhar aos dez anos de idade em casas de família, já vendeu roupa, bolsa, perfume, fez unha e cortou cabelo e nunca antes havia imaginado que trabalharia com artesanato, a conquista é grande.
Afinal, só faz oito anos que a amazonense Rodney chegou a Rio Branco acompanhando o marido, que vinha a serviço, não conhecia nada na cidade e não tinha ideia do que fazer.
Somente meses depois foi que alguém lhe falou de um curso de confecção de biojóias que a Fundação Bradesco oferecia. Ela se inscreveu. “O primeiro colar que fiz era feinho que só”, conta rindo, ao relembrar dos primeiros tempos como artesã. Foi se especializando no ramo, fazendo outras capacitações e aprimorando seu trabalho: melhoramento de produto, design, marchetaria… Também cuida de reciclar o estilo acompanhando os grandes desfiles de moda do país e buscando informações em sites especializados.
Hoje, o marido e uma amiga trabalham em sua pequena equipe e ela é instrutora na instituição onde aprendeu o beabá do ofício. Por meio do Projeto Comprador, do Sebrae, vende a maior parte de sua produção para São Paulo. Outra parte comercializa em feiras, na Casa do Artesão, em Rio Branco, e em sua própria casa. Para um recente evento da comunidade maçônica realizado na cidade, recebeu uma encomenda de centenas de brindes e teve direito a um estande no local, onde também teve oportunidade de fazer boas vendas. Algo que, sem a referência positiva que seu produto já desfruta no mercado, dificilmente alcançaria.
Não bastasse, para além do evidente espírito empreendedor, a artesã também tem a generosidade de compartilhar gratuitamente seu conhecimento com quem precisa. Periodicamente, dá oficinas na Casa Rosa Mulher, que recebe e orienta vítimas de violência doméstica. São mulheres para quem aprender um ofício que gere renda pode significar a libertação de uma relação de dependência financeira do seu opressor e o fim do tormento de ser agredida. Assim, mais uma vez e de um modo diverso, Rodney defende a autoestima da mulher.
O segredo do seu sucesso? “Sou apaixonada pelo que faço”, revela. Pois quem ama o seu trabalho constrói histórias de uma beleza capaz de surpreender a si próprio.
Você é “moralmente” tão antiquada a ponto de considerar vaidade feminina uma frivolidade? Você já deveria saber que as mulheres querem se sentir bonitas para se sentirem amadas. E querer sentir-se amada não é frivolidade.
Se você pensa que “nasceu” assim, e não tem jeito, fique certa de que está é desistindo de uma coisa muito importante: de sua própria capacidade de atrair. Quer saber de uma coisa? Obesidade tem jeito. Cabelos sem vida têm jeito. Rosto sem graça tem jeito. Tudo tem jeito.
O remédio? O remédio é não ser uma desanimada triste. E o outro remédio é ter como objetivo ser um “você mesma” mais atraente – e não o de atingir um tipo de beleza que nunca poderia ser seu.
(Texto do livro “Só para mulheres”, de Clarice Lispector. Publicado originalmente no Diário da Noite, com o pseudônimo de Ilka Soares, no dia 10 de fevereiro de 1961){/xtypo_rounded2}
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