Batalhas de confete, desfile de escolas de samba… Confira o que fazia parte dos carnavais de antigamente. Muita coisa mudou, mas a alegria é a mesma até os dias de hoje
Fantasias elaboradas, blocos formados por pares de homens e mulheres, batalhas de confete em frente ao Palácio do Governo, assaltos carnavalescos, folia nos barcos ancorados no Rio Acre, ingresso para o desfile das escolas de samba. Tudo isso fez parte dos carnavais de Rio Branco, uma festa que sofreu mudanças ao longo do anos mas não perdeu o mais importante: a cor e o tom.
Segundo o historiador Marcos Vinícius Neves, nos anos 20 e 30 do século passado os carnavais eram marcados pelas batalhas de confete e serpentina e pelos bailes nos clubes. Os anos 40 são marcados pela rivalidade entre o carnaval dos clubes Rio Branco e da Tentamen, que refletia a disputa entre os dois lados da cidade. Os blocos de rua ganham força e evoluem para escolas de samba na década de 1960, e havia inclusive cobrança de ingresso para ver as escolas na avenida Getúlio Vargas. A partir de 1980 as escolas e blocos entram em decadência. "O trabalho de resgate do carnaval de rua é um trabalho recente das administrações do Estado e Prefeitura, promovendo a festa popular. Nos últimos anos esse incentivo tem sido ainda mais forte, com os bailes da Tentamen e o carnaval da Gameleira com o tema de Carnaval como Antigamente", explicou Vinícius.
Sua majestade, o Luizão
O primeiro Rei Momo não será esquecido. Luiz Lima dos Santos, sua majestade, o Luizão, iniciou seu reinado na década de 1950 e deteve o cetro, o manto e a coroa por mais de quinze anos. Luizão não foi eleito, foi escolhido. E todos os anos os clubes o procuravam para que, junto às suas escuderias e mais tarde à rainha, comandasse a festa nos salões onde a folia também reinava.
Luizão faleceu em 1985. Ao contrário do marido, a viúva Naila José dos Santos conta que nunca gostou de carnaval e esperava que o marido terminasse de se arrumar para fazer o que fez durante todas as noites de carnaval: dormir. "O pessoal vinha trazer a roupa dele, maquiavam, ajudavam ele a se arrumar e levavam para os clubes. Eu nunca impedi que ele fosse porque eu não queria ir, se ele gostava tinha que brincar. Ele era a animação em pessoa, adorava o carnaval", contou.
Luizão já foi tema de enredo de escola de samba, homenageado após sua morte pela Escola Unidos do Bairro 15. A primeira majestade do carnaval acriano era um homem como tantos outros que vivem no Acre: paraibano, veio para o Estado fugindo das dificuldades do Nordeste. Chegando ao Estado a majestade do carnaval conheceu a cabrita e a poronga e foi cortar seringa. Quando migrou para a cidade se tornou comerciante e rei, majestade de uma festa regada a confetes, serpentinas e lança-perfume, onde a alegria dava as ordens.
"O mais antigo rei Momo do Acre, o Luizão, apesar de considerar-se velho, outra vez terá o cetro, a coroa e o manto de rei da folia. Espalhando bom-humor, alegria e agilidade, o gordo quer ver todo mundo de cara risonha, cantando marchas, sambas, frevos e tudo que o carnaval manda".
Matéria do Jornal O Rio Branco do dia 15 de fevereiro de 1973
Os assaltos carnavalescos
Não, os foliões não aproveitavam o momento de festa para assaltar comércios e residências. Mas, embalados ao som de orquestras, tomavam as ruas e invadiam as casas de presidentes de clubes ou outros membros da alta sociedade da época para festejar. Quando as marchinhas de carnaval tocavam em frente ao portão não adiantava fazer mais nada: restava ao proprietário abrir a casa, afastar as cadeiras e providenciar os comes e bebes.
"Os assaltos começavam em janeiro, logo após as festas de final de ano. Todos os sábados tinham assaltos, a orquestra ia sempre à frente e nós entrávamos afastando os móveis, por volta das 20h. Ficávamos até 1h da madrugada", lembra Yolanda Costa e Silva, que hoje é a presidente do grupo Anos Dourados.
Zelita Rodrigues, a primeira Rainha do Carnaval
Nada de esplendor ou pouca roupa para a Rainha do Carnaval. Ela vestia a mesma fantasia do bloco que fazia parte e se diferenciava apenas pela faixa e coroa. As primeiras rainhas eram eleitas nos clubes através do voto dos rapazes. "Era mais ou menos com as rainhas de festas juninas hoje, os votos eram pagos. Eu sempre era muito animada, organiza os blocos e me destacava por isso", conta Zelita Rodrigues, eleita a primeira Rainha do Carnaval em Rio Branco, em 1955, na Tentamen.
Na época, as eleições eram organizadas pelos presidentes dos clubes para arrecadar dinheiro. As candidatas não sabiam que estavam sendo votadas.
Eram sempre três ou quatro candidatas e, ao contrário de hoje, elas não se candidatavam, eram lançadas pelos rapazes do clube. "A rainha só sabia que havia sido eleita quando recebia a coroa e desfilava pelo salão", lembra.
"Quanta gente, ah! Quanta alegria"
Os carnavais de antigamente eram embalados pelas marchinhas de carnaval, tocadas pela banda da Guarda Territorial do Estado. "Eles tocavam dia e noite, em todos os cantos. Acompanhavam os blocos, os sujos", relembra Zelita.
Outra marca do carnaval de antigamente era a batalha de confete e serpentina que acontecia durante a tarde na praça do Palácio Rio Branco. O carnaval de rua não era muito forte, mas não faltavam os blocos de sujos, que saiam aos domingos e terças-feiras de carnaval. O carnaval dos clubes era apenas para a alta sociedade rio-branquense e se dividia entre a Tentamen, no Segundo Distrito, e o Rio Branco, no Primeiro Distrito. A rivalidade entre os blocos e clubes dos dois lados da cidade era grande e havia sempre a disputa pelas fantasias mais bonitas, blocos mais animados.
Cada distrito tinha o seu bloco. E havia também o Bloco dos Casados, organizado pela Diná Barros, esposa do Augusto Idalgo de Lima.
Turma do Sereno – Ninguém brincava carnaval sem fantasia antigamente. E as fantasias eram elaboradas em sigilo para que os blocos rivais não tivessem conhecimento do tema e dos detalhes. "As nossas fantasias eram tão bonitas que as pessoas iam para a porta do clube olhar os foliões. Era a chamada Turma do Sereno, que ia apenas para nos ver passar, já que não podiam entrar no clube", lembrou Yolanda, que pula carnaval até hoje no bloco dos Anos Dourados.
Yolanda foi uma das fundadoras do Juventos, que abriga o baile de carnaval mais famoso da cidade, o Vermelho e Preto, que nasceu quando os bailes da Tentamen já não existiam.
Carnaval no navio – Na última noite de Carnaval a banda que tocava na Tentamen ganhava as ruas em direção ao rio Acre. Era em dois navios ancorados que a festa terminava. A despedida da folia acontecia nos navios João Gonçalves e Benjamim.
Antigamente – O carnaval de hoje, por mais que tente resgatar as tradições do passado, continua com o diferencial de existir em um novo tempo, com novas tecnologias, novos ritmos musicais. A batatalha de confete nas tardes de carnaval já não existe mais. As marchinhas não são mais as únicas a comandarem a festa, afinal hoje existem os famosos axés que também animam os foliões. Mudanças que acompanham o tempo. Mas uma coisa é certa: a festa e a alegria continuam sendo a marca do carnaval de Rio Branco para todos os foliões.