“Nunca vi nada igual em toda minha vida. Tenho 80 anos e nunca vi o rio chegar aqui no quintal da minha casa. Moro em Assis Brasil e sou ribeirinho desde que me entendo por gente”, conta o aposentado Raimundo Nonato de Souza, 80 anos, morador da rua Valério Magalhães.
A aposentada Bebé Feitosa, 76 anos, confessa que também não havia presenciado enchente de proporções tão assustadoras. “Em toda minha vida não tinha visto a água chegar aqui nessa rua. Tenho medo que chegue até a minha casa. Não para de chover e as notícias que temos da parte mais de cima do rio é que está chovendo muito. Mas, Deus sabe o que faz. Só resta a gente esperar que pare de chover”, comenta a moradora.
A subida repentina e histórica do nível das águas do Rio Acre não surpreende apenas os moradores, surpreende também a Defesa Civil e a Prefeitura. A régua utilizada para medição do nível das águas está submersa há pelo menos três dias, em virtude disso, a subida no nível das águas é monitorada com base em pontos de referências como, por exemplo, orelhões que ficam em vias públicas, ou casas que aos poucos são invadidas pelas águas.
Prefeitura em estado de alerta
Até a tarde desta sexta-feira, 17, a prefeitura estimava que mais de 130 famílias estavam desabrigadas devido a enchente. Mas, a prefeita Eliane Gadelha alerta que o número muda a cada instante. “Toda hora a água deixa mais uma família desabrigada”.
Eliane Gadelha passou toda a madrugada auxiliando moradores que tinham suas casas atingidas pelas águas. Logo pela manhã a prefeita levou alimento para famílias que estão abrigadas em escolas públicas do município.
“Não estamos prestando assistência apenas aos brasileiros, mas também aos haitianos e peruanos que estão isolados pela cheia do rio. Em Iñapari, no Peru, a situação é muito triste. Eles estão isolados e nem água potável para beber tinham. Nós, da prefeitura de Assis Brasil que enviamos água mineral para eles”, diz a prefeita.
Equipes da Seds (Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social) estão na cidade para prestar apoio às famílias que estão sendo desabrigadas. O Governo do Estado também disponibilizou servidores de outras secretarias para auxiliar o trabalho de remoção de famílias que a prefeitura esta executando.
Iñapari debaixo d’água
Logo que a equipe da Agência de Notícias chegou a Ponte da Integração a imagem chocava. A cidade de Iñapari, no Peru, estava tomada pelas águas. Em muitos locais é possível ver apenas a cumeeira das casas
De acordo com o sargento do Exército, R. Costa que trabalha há 20 anos na tríplice fronteira, a água invadiu a cidade muito rápido, não dando tempo para os moradores retirarem seus pertences de dentro das casas.
“Em três dias a cidade foi toda tomada pela água. Hoje 80% de Iñapari está debaixo d’água. Nas cheias que vimos aqui antes a água não chegava nem na panturrilha e hoje a situação ficou desse jeito. Até os mais antigos da cidade estão assustados”, revela o sargento.
Para verificar a situação das famílias que vivem na área de fronteira a equipe da Agência de Notícias acompanhou o sargento R. Costa numa vistoria a área atingida. As águas não permitiam saber o que eram ruas, calçadas ou praças. Somente com a experiência do oficial era possível navegar na cidade. Bancos, órgão públicos, escolas, hotéis, restaurantes e casas foram invadidos pelo rio. O cenário ficava cada vez mais triste a medida que a equipe aproximava-se da área central.
Na área externa de uma casa era possível ver pertences das famílias flutuando nas águas, próximo à prefeitura da cidade computadores eram carregados pela força da correnteza. Nem sequer os carros os peruanos tiveram tempo de evitar que fossem atingidos pela água. Um caminhão ficou quase que totalmente submerso, sendo possível ver apenas seu espelho retrovisor interno.
A travessia entre a Ponte da Integração e a outra margem está sendo feita por pescadores brasileiros, Corpo de Bombeiros, Exército e moradores da região que possuem barcos. Turistas que pretendiam passar o feriado de carnaval nas cidades peruanas foram surpreendidos pela fúria com que o rio tomou a cidade. Grupos de São Paulo, Acre e de outros estados decidiram adiar a viagem porque a passagem em veículos está suspensa.
A Polícia Federal esta com plantão 24 horas na área brasileira da ponte, monitorando a entrada e saída de haitianos. Os haitianos que entraram no Peru esta semana também estão isolados em Iñapari e têm ajudado os peruanos a enfrentar este momento de crise.
A prefeitura de Assis Brasil permanece enviando alimentação aos haitianos, mesmo os que estão na área do Peru. Aos peruanos a prefeita conta que ofereceu abrigo para mulheres e crianças numa escola do município brasileiro. “Precisamos ser solidários neste momento. Toda ajuda é importante. Estamos sempre pedindo auxílio aos moradores que têm barcos, caminhonetes e caminhões para ajudar as pessoas que estão passando por esse momento triste”, diz Eliane Gadelha.
Nível das águas apresenta vazante na cabeceira
Indígenas que moram em duas aldeias que ficam acima da cidade de Assis Brasil e que também foram atingidos pela cheia do rio Acre relataram na tarde desta sexta-feira que a chuva diminuiu na região e o rio apresenta vazante no nível das águas.
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